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    Em referendo, bolivianos decidem hoje o futuro político de Evo Morales

    SYLVIA COLOMBO
    DE SÃO PAULO

    21/02/2016 02h00

    Um homem acorda após passar dez anos em coma. Confuso, pergunta: "Como está meu filho?". O médico responde: "Está bem. Hoje trabalha na Agência Espacial Boliviana". O paciente se espanta: "A Bolívia tem agência espacial?", enquanto vê o telejornal informando sobre a construção de estradas de duas vias em todo o país.

    Esse é um dos criativos "spots" publicitários criados para a campanha do "sim" para o referendo deste domingo (21) na Bolívia.

    Com a defesa da manutenção de políticas sociais e dos investimentos em infraestrutura permitidos pelas nacionalizações e pela boa performance econômica na última década, o governo espera apoio popular nas urnas para mudar a Constituição.

    A intenção é fazer com que o atual presidente, Evo Morales, 56, possa concorrer a um quarto mandato, em 2019.

    Hoje, a Carta permite apenas uma reeleição.

    17.fev.2016/Xinhua/ABI
     El presidente de Bolivia, Evo Morales (d), participa en el cierre de su campaña por el "sí" en el referendo constitucional, en La Paz, Bolivia, el 17 de febrero de 2016. Evo Morales y el gobernante Movimiento Al Socialismo (MAS) cerraron el miércoles la campaña por el "sí" a la modificación parcial de la Constitución, de cara al referendo, con una concentración masiva en el sur de La Paz. Los bolivianos acudirán a las urnas para definir si se permite o no una nueva repostulación del presidente Morales y el vicepresidente Alvaro García Linera, una vez que finalice su actual periodo presidencial. (Xinhua/ABI) (ab) (fnc) (ah)
    Evo Morales em La Paz no último dia de sua campanha pelo "Sim" no referendo

    Em 2014, o mandatário obteve permissão da Corte Suprema para concorrer ao terceiro período porque a primeira gestão não contaria, sendo anterior à Constituição promulgada em 2009.

    MUDANÇA NO JOGO

    Quando lançou a ideia, em 2015, as pesquisas indicavam que o "sim" ganharia fácil.

    O jogo, porém, mudou nos últimos meses.

    A pesquisa mais recente, do instituto Mori, indica empate técnico entre as duas opções. Como há muitos indecisos (11%) ou que não declaram voto (7%), o resultado é incerto.

    "A popularidade de Morales é grande [cerca de 60%], mas o governo vem se desgastando", diz à Folha o analista político Fernando Molina.

    O primeiro alerta veio nas eleições regionais de 2015, em que o MAS (Movimento ao Socialismo, partido do governo) teve derrotas em bastiões tradicionais como El Alto, na região metropolitana de La Paz.

    "Ainda não sentimos o impacto da desaceleração mundial, mas os economistas vêm dizendo que os efeitos logo serão concretos, e isso assusta as pessoas", diz Molina, citando a queda internacional dos preços da energia e de produtos como a soja, principais exportações da Bolívia.

    Em dez anos, o país cresceu a uma média de 5%. Para 2016, a previsão do FMI é que a Bolívia cresça 3,5%.

    Não é tenebroso se comparado a alguns de seus sócios tradicionais, como Brasil e Argentina, mas pode levar à restrição do gasto com os programas sociais que têm reduzido a pobreza –em dez anos, o índice caiu de 59,9% para 29%.

    Diferentemente de eleições passadas, que Morales ganhou com boa margem (53% em 2005, 65% em 2009 e 61% em 2014), nesta campanha o presidente tem precisado explicar um elemento antes quase ausente, a corrupção.

    Primeiro, foram denúncias de desvios no Fundo Indígena, causando deserções na principal base original de apoio de Morales –os movimentos indígenas do país.

    Líderes dissidentes, como Rafael Quispe, acusam Morales de, por exemplo, abandonar a luta ambiental e ceder espaços das comunidades para mineradoras estrangeiras.

    NOVELA

    O caso mais recente de corrupção, porém, é mais picante e tem dominado o noticiário nas últimas semanas.

    O jornalista de oposição Carlos Valverde mostrou que Morales havia favorecido uma ex-namorada, colocando-a num cargo de chefia no escritório boliviano de uma empresa chinesa que, nos últimos anos, ganhou licitações para obras do governo que superam US$ 500 milhões.

    Morales admitiu a relação com Gabriela Zapata quando esta tinha 18 anos (hoje ela tem 29), mas disse que o namoro já havia acabado.

    Dias depois, porém, surgiu nos jornais uma foto em que os dois apareciam juntos em uma festividade recente.

    Noah Friedman - 19.fev.2016/ABI/Xinhua
     febrero 19, 2016 (Xinhua) -- El presidente de Bolivia, Evo Morales (c) y ejecutivos de la petrolera española Repsol y de la estatal Yacimientos Petrolíferos Fiscales Bolivianos (YPFB), se reúnen en el departamento de Santa Cruz, Bolivia, el 19 de febrero de 2016. Bolivia incrementó al menos 40 por ciento sus reservas probadas de gas con el descubrimiento de tres reservorios en el bloque Caipipendi, en el sur del país, informó el viernes Evo Morales. En una conferencia de prensa en el departamento de Santa Cruz, Morales y el director de Repsol, Diego Díaz, explicaron por separado que las nuevas estructuras Boicobo, Itahuazu y Boyuy tienen un potencial de 3,977 trillones de pies cúbicos (TCF). (Xinhua/Noah Friedman/ABI) (ab) (jp) (sp)
    Evo Morales com executivos da petroleira espanhola Repsol e da estatal YPFB

    Morales admitiu, ainda, ter tido um filho com a mulher –a criança teria morrido aos dois anos de idade. Ele acrescentou que abriria uma sindicância para investigar se o Estado teria privilegiado a tal empresa.

    "É a primeira vez que uma denúncia de corrupção com provas tocou o presidente, é preciso ver como isso vai impactar o resultado", diz o analista Carlos Cordero.

    A denúncia de tráfico de influência, porém, é amplificada pelos organizadores da campanha do "não".

    O fato de o mandatário ter mantido relações com uma mulher jovem quando era presidente causa furor nas redes sociais e revolta entre feministas.

    Morales, que é solteiro e discreto, tem outros filhos de outras relações e é conhecido pelo perfil conquistador.

    Alguns analistas consideram que as vitórias recentes de Mauricio Macri, na Argentina, e da oposição ao chavismo, na Venezuela, também "animaram" a direita local.

    "Além disso, o que ocorre com Dilma Rousseff vira contraexemplo aqui, pois a direita usa o mau momento do Brasil para demonstrar o que pode ocorrer com um governo que fica tanto tempo no poder", diz Molina.

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