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    Espanha inicia debates para acordo em torno da composição do novo governo

    FERNANDA GODOY
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM MADRI

    01/03/2016 02h40

    Após mais de dois meses de negociações, o último "não" do Podemos, partido de esquerda liderado por Pablo Iglesias, ao PSOE, do social democrata Pedro Sánchez, veio pelo Twitter com o fecho: "Isso não é sério".

    Sánchez abre nesta terça (1º), na câmara dos deputados, o debate para a formação do novo governo espanhol. O pleito que aprovará ou rejeitará a proposta de composição deve ocorrer no dia seguinte.

    O líder do PSOE, que foi nomeado pelo rei Felipe 6º para formar o governo após o primeiro-ministro, Mariano Rajoy, não ter reunido apoios suficientes, já fechou acordo com o partido de centro-direita Cidadãos, o que lhe garante 130 votos, ainda longe da maioria absoluta (176).

    Caso não chegue ao número, nova votação será realizada na sexta (4), bastando maioria simples –o que também parece fora de alcance. Faltariam os votos (ou ao menos a abstenção) dos 69 deputados deputados do Podemos e de suas plataformas regionais aliadas: En Marea (Galícia), Compromis (Valência) e En Comú Podem (Catalunha), além da Esquerda Unida (que tem dois deputados).

    Andrea Comas/Reuters
    Spain's Socialist Party (PSOE) leader Pedro Sanchez presides over the party's federal committee meeting at its headquarters in Madrid, Spain, February 29, 2016. REUTERS/Andrea Comas ORG XMIT: ACO04
    O líder do PSOE, Pedro Sánchez, preside reunião do partido em Madri, na Espanha

    "O PSOE nos envia vários documentos que são um 'copie e cole' de seu pacto com o Cidadãos, escondendo as medidas mais vergonhosas. Isso não é sério", tuitou Iglesias.

    "Depende de vocês que essas medidas deem início ao #GovernodaMudança. Não é sério que siga Rajoy", respondeu Sánchez, também pelo Twitter. O líder do PSOE se referia ao fato de que Mariano Rajoy, do partido conservador PP, continuará no poder enquanto a novela se arrastar.

    Desde 20 de dezembro, quando o bipartidarismo implodiu nas urnas, devido aos resultados obtidos por partidos novos como Podemos e Cidadãos, a Espanha está tendo que reinventar sua forma de fazer política. A alternância no poder entre PSOE e PP deu lugar a uma complexo xadrez político que demanda uma composição entre dois ou três dos quatro grandes partidos.

    O Podemos, que começou reivindicando cinco dos 12 ministérios e Iglesias como vice-presidente de governo, apresentou seu próprio projeto de acordo com propostas que o PSOE considerou inaceitáveis.

    Entre os pontos rejeitados pelos socialistas estão um referendo para independência da Catalunha e o aumento do gasto social em 96 bilhões de euros ao longo de quatro anos.

    Sánchez preferiu uma aproximação com o Cidadãos em torno de medidas de combate à corrupção, como o fim do foro privilegiado para políticos, e sociais, como um plano de emergência que garanta renda mínima para famílias atingidas pela crise.

    O acordo firmado entre PSOE e Albert Rivera, líder do Cidadãos, prevê também a recuperação do poder de compra do salário mínimo e a redução da contribuição dos autônomos à Previdência Social.

    Pelo "Acordo para um governo reformista e de progresso", também seria modificada a legislação trabalhista para restringir o uso dos contratos temporários de trabalho. Em 2015, 66% dos cerca de 505 mil postos de trabalho criados no país foram para contratos temporários.

    Os dois partidos também se puseram de acordo para mudar os termos da licença-maternidade. Das atuais 18 semanas, a licença subiria para 26 semanas, sendo oito semanas para a mãe, oito para o pai (intransferíveis) e as demais dez semanas a serem divididas livremente entre os dois.

    O desfecho das negociações pode vir só em setembro, caso novas eleições sejam convocadas para 26 de junho. Sánchez, rivais e aliados têm um prazo de dois meses a partir da abertura oficial dos debates nesta terça para chegar a um acordo que evite um novo pleito.

    "A dificuldade para um acordo é que Podemos e PSOE concorrem pela hegemonia da esquerda", diz o cientista político Ángel Valencia, da Universidade de Málaga. "E as concepções de esquerda de ambos são distintas."

    Ao longo das negociações, Rajoy ficou isolado. O premiê declinou o convite do rei Felipe para tentar formar o governo, prerrogativa natural do candidato mais votado, caso do atual chefe de governo. O PP elegeu 123 deputados.

    Desgastado por novos escândalos de financiamento ilegal do PP em Madri e em Valência que vieram à tona depois das eleições, o premiê teve dois encontros com Sánchez. Tentou, sem sucesso, convencê-lo a fazer uma "grande coalizão", no estilo da presidida pela alemã Angela Merkel.

    "Rajoy está esperando que Sánchez se choque com o muro", diz o cientista político Jorge Galindo, do site "Politikon". "Se isso ocorrer, e o PSOE temer perder espaço em novas eleições, Rajoy espera que os socialistas acabem se abstendo." Nesse cenário, o PSOE cederia, ainda que contrariado, à vontade de Rajoy de permanecer no governo, tentando evitar uma sangria em uma volta às urnas.

    O certo, para Galindo, é que todos os movimentos nesse xadrez serão feitos com um olho nas pesquisas de opinião. "A volatilidade é altíssima, os partidos novos ainda estão por se consolidar. É impossível não pensar na possibilidade de novas eleições", diz o cientista político.

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