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    eleições nos eua

    Saiba qual o plano da equipe de Hillary para derrotar Donald Trump

    AMY CHOZICK
    PATRICK HEALY
    DO "THE NEW YORK TIMES"

    02/03/2016 11h00

    Nos dias depois de Donald Trump derrotar seus rivais republicanos na Carolina do Sul e em Nevada, democratas destacados que apoiam Hillary Clinton organizaram uma série de reuniões e teleconferências para discutir uma pergunta que muitos nunca tinham imaginado que algum dia teriam que fazer: como derrotar Trump numa eleição geral?

    Vários democratas argumentaram que, se Hillary for a candidata escolhida por seu partido, poderá derrotar Trump facilmente.

    Acreditavam plenamente que as declarações incendiárias de Trump sobre imigrantes, mulheres e muçulmanos o tornariam inaceitável para muitos americanos.

    Tinham confiança no poder eleitoral crescente de eleitores negros, hispânicos e mulheres e em suas possibilidades de dar uma vitória arrasadora a Hillary no caso de Trump ser o candidato republicano.

    Outros, porém, entre eles o ex-presidente Bill Clinton, enxergaram essas conclusões como negação da realidade.

    Disseram que era evidente que Trump tem uma percepção aguda do ânimo do eleitorado e que apenas uma campanha coordenada para retratá-lo como perigoso e preconceituoso pode dar a Hillary a vitória na eleição de novembro, que tanto ela quanto Bill Clinton preveem que será uma disputa apertada.

    Essa estratégia está começando a tomar forma. Grupos que apoiam Hillary se preparam para escrever e testar anúncios que mostrarão Trump como misógino e inimigo da classe trabalhadora, alguém cujo temperamento explosivo colocará o país e o mundo em perigo grave.

    O plano é que esses temas sejam reforçados e ampliados mais tarde por duas vozes destacadas em favor de Hillary: para combater a capacidade que Trump possui de comandar a atenção da mídia, Bill Clinton não vai economizar sua participação no comício, e o presidente Barack Obama já disse a aliados que terá prazer em retratar Trump como sendo incapaz de dar conta dos deveres do ocupante do Salão Oval.

    Democratas dizem que, como fizeram os republicanos na campanha das primárias, correrão o risco de perder a Presidência se não levarem Trump a sério.

    Prévia da Eleição nos EUA

    "Ele é um perigo, ele entende as ansiedades dos eleitores e será implacável contra Hillary Clinton", falou o governador do Connecticut, Dannel P. Malloy.

    "Eu já passei da negação -de dizer 'não acredito que alguém possa dar ouvidos a esse sujeito'– à admiração, porque ele descobriu como captar a angústia de todo o mundo, e agora estou realmente preocupado."

    Durante o primeiro debate republicano, no ano passado, o diretor da campanha de Hillary, Robby Mook, pediu silêncio a uma sala cheia de pessoas na sede da campanha no Brooklyn quando Trump começou a discursar.

    Ele estava cativado pelo caráter absurdo das falas do candidato republicano. "Silêncio, pessoal, preciso captar uma dose de Trump", disse.

    Hoje Mook e seus colegas veem Trump como um adversário astuto, resoluto e incansável, que parece estar respondendo às ansiedades econômicas maiores que afetam os americanos e à ideia prevalente de que os políticos tradicionais são incapazes de resolver esses problemas.

    Publicamente, a campanha de Clinton está deixando os pré-candidatos republicanos se digladiarem.

    Rhona Wise - 1º.mar.2016/AFP
    Democratic presidential candidate Hillary Clinton addresses her supporters at a rally during a campaign event on Super Tuesday in Miami on March 1, 2016. / AFP / RHONA WISE ORG XMIT: MIA13
    Hillary Clinton durante ato de campanha na Superterça em Miami

    Reservadamente, porém, a campanha e outros democratas estudam as pesquisas de opinião para entender as razões da atração populista exercida por Trump. Estão acumulando grande volume de pesquisas adversárias sobre a carreira empresarial do candidato republicano.

    "A campanha contra Trump será travada em dois níveis", disse o pesquisador democrata Geoff Garin, estrategista chefe de Hillary em 2008.

    "O primeiro é o nível do temperamento", saber se Trump é a pessoa indicada para ser comandante em chefe, disse Garin, ecoando discussões que vêm dominando os círculos democratas recentemente.

    O segundo nível "será baseado em se é ou não possível confiar que Trump vai defender qualquer coisa que não seja ele próprio".

    Mas as táticas que os Clinton empregam há anos para derrubar adversários podem não estar à altura da disputa entre o curto, grosso e imprevisível Trump e a cautelosa Hillary, que costuma seguir os roteiros previamente acordados.

    É um enfrentamento que assessores dos dois lados preveem que será um choque épico e brutal entre dois políticos que não poderiam ser mais diferentes.

    "Hillary construiu um grande navio petroleiro e está prestes a enfrentar piratas somalis", disse o hoje independente Matthew Dowd, que em 2004 foi estrategista chefe da campanha do ex-presidente George W. Bush.

    Este artigo se baseia em entrevistas com mais de duas dúzias de assessores, estrategistas e aliados estreitos dos Clinton, vários dos quais conversaram diretamente com Bill Clinton.

    Alguns pediram anonimato, porque não estão autorizados a se manifestar publicamente sobre estratégia.

    Spencer Platt - 1º.mar.2016/Getty Images/AFP
    ESSEX JUNCTION, VT - MARCH 01: People cheer as Democratic presidential candidate, Sen. Bernie Sanders (D-VT) speaks after winning the Vermont primary on Super Tuesday on March 1, 2016 in Essex Junction, Vermont. Thirteen states and one territory are participating in today's Super Tuesday: Alabama, Alaska, Arkansas, Colorado, Georgia, Massachusetts, Minnesota, Oklahoma, Tennessee, Texas, Vermont, Virginia, Wyoming and American Samoa. Spencer Platt/Getty Images/AFP == FOR NEWSPAPERS, INTERNET, TELCOS & TELEVISION USE ONLY ==
    Eleitores de Bernie Sanders ouvem o senador após sua vitória em Vermont

    CONTRA A INTOLERÂNCIA E O FANATISMO

    Os Clinton consideram que a maior arma contra Trump é a tendência deste a fazer declarações ultrajantes, até carregadas de ódio, que podem parecer impróprias para um presidente.

    No debate republicano mais recente, na quinta-feira ((25), Trump trocou insultos de um modo adolescente com seus rivais e ameaçou erguer um muro ainda maior na fronteira mexicana, porque não gostou da crítica feita por um ex-presidente mexicano ao muro proposto inicialmente.

    Na Carolina do Sul e no Tennessee, Hillary começou a montar as bases para o que seus assessores descrevem como "uma campanha contra a intolerância e o fanatismo", em que ela se apresentará como tolerante, imparcial e justa, em contraste com Trump.

    Ela declarou que os americanos precisam de mais "amor e gentileza."

    "Em vez de erguer muros", ela está começando a dizer "precisamos derrubar barreiras."

    Durante o debate republicano da quinta-feira, a campanha de Hillary postou uma imagem no Instagram dizendo: "Racismo, sexismo, intolerância, discriminação, desigualdade: estes não são valores americanos".

    Enquanto Hillary irradia energia positiva na campanha, grupos democratas estão começando a formar um consenso em torno de uma estratégia para desferir ataques brutais e contínuos contra Trump.

    O plano tem três eixos principais: retratar Trump como empresário frio e calculista, que trabalhou contra os interesses dos eleitores da classe trabalhadora cujo apoio agora está pedindo; difundir as declarações degradantes que ele fez contra mulheres, com o intuito de mudar a posição das eleitoras dos subúrbios, que vêm relutando em apoiar Hillary; dar destaque a seu temperamento agressivo e explosivo, para mostrar que ele é uma pessoa não apropriada para ser comandante em chefe do país.

    O American Bridge, um "supercomitê de ação política" pró-Hillary, criou uma "unidade de diligência prévia", formada por especialistas fiscais e de negócios, que estão estudando documentos da Comissão de Valores Mobiliários e registros de tribunais relacionados à carreira empresarial de Trump.

    Um membro de um grupo filiado ao American Bridge, o Correct the Record, que trabalha em coordenação com a campanha de Clinton, vem colecionando imagens de declarações que não prejudicaram a posição de Trump entre os eleitores das primárias republicanas, mas que podem ser juntadas para formar o que o fundador do grupo, David Brock, descreveu como "uma montagem de discursos de ódio que vai deixar o eleitorado geral horrorizado".

    "A ideia de que até agora nenhuma reação negativa afetou Trump não deixa de ter alguma base", disse Brock. Mas ele argumentou que isso acontece porque os republicanos vêm sendo comedidos demais, para evitar a possibilidade de causar ofensa aos partidários de Trump.

    Justin Sullivan - 1º.mar.2016/AFP
    MINNEAPOLIS, MN - MARCH 01: Democratic presidential candidate former Secretary of State Hillary Clinton greets patrons at Mapps Coffee on March 1, 2016 in Minneapolis, Minnesota. Hillary Clinton is campaigning in Minnesota as Super Tuesday voting takes place in 12 states. Justin Sullivan/Getty Images/AFP == FOR NEWSPAPERS, INTERNET, TELCOS & TELEVISION USE ONLY ==
    Hillary Clinton em campanha em Minneapolis, Minnesota, na terça-feira

    Nas próximas semanas, o Priorities USA Action, supercomitê de ação política que apoia Hillary Clinton e que na campanha de 2012 retratou Mitt Romney como um magnata corporativo indiferente, vai começar a redigir e testar anúncios usando uma abordagem semelhante contra Trump.

    Enquanto Hillary procura manter-se acima da disputa, Bill Clinton entrará em ação para responder quando Trump lançar alguma tirada ofensiva.

    Obama já argumentou que Trump não estaria à altura do cargo de presidente e disse a aliados que vai levar o ataque adiante.

    Em fevereiro, questionado sobre Trump, Obama lembrou que o presidente "carrega os códigos nucleares com ele e tem o poder de mandar jovens de 21 anos para tiroteios".

    UM MAPA EM MUTAÇÃO

    Se esses ataques não surtirem efeito, os assessores de Hillary temem que Trump possa ameaçá-la em alguns Estados conquistados por Obama em 2008 e 2012, incluindo Estados onde o Partido Democrata antes sentia certeza de sua preponderância.

    O desempenho irregular que Hillary vem tendo com eleitores homens, especialmente os brancos, pode gerar uma abertura para Trump atrair democratas e independentes que sejam social e culturalmente moderados e estejam abertos ao seu chamado pelo fortalecimento das Forças Armadas, por uma política externa destemida e por um enfoque empresarial sobre a economia.

    Esses eleitores poderiam dar-lhe uma vantagem em lugares como a Carolina do Norte, onde Obama venceu em 2008.

    Mas os assessores de Hillary também se preocupam com Ohio, Flórida e Estados de viés democrata em eleições presidenciais que Trump jurou contestar, como Michigan, Pensilvânia e Wisconsin.

    O ex-governador da Carolina do Sul Jim Hodges, que na quinta-feira fez campanha no Estado ao lado de Bill Clinton, disse que o ex-presidente se prepara para uma eleição fortemente disputada se Trump for o candidato republicano.

    "O presidente [Bill Clinton] vê Trump como adversário temível, sem sombra de dúvida", disse Hodges. "Ele leva Trump a sério. A campanha o leva a sério."

    CHOQUE DE ESTILOS

    "Elas perdem a cabeça e arrancam as calcinhas", dizia a linha de assunto de um release recente do grupo Emily's List, que trabalha para eleger mulheres democratas que apoiam o direito ao aborto.

    A frase vem de comentários que Trump fez a respeito de mulheres no programa "The Howard Stern Show" na década de 1990, encontradas no mês passado pelo BuzzFeed.

    Declarações desse tipo, feitas por Trump ao longo dos anos, quando ele era presença regular nos tabloides e astro de reality shows, podem ajudar Hillary a conseguir a adesão de mulheres suburbanas e mulheres jovens que se têm mostrado ambivalentes ou antagônicas à candidatura da democrata.

    Mas, enquanto os democratas aguardam ansiosos pela próxima declaração sexista de Trump, eles também admitem um problema que as pesquisas não podem resolver: Trump e Hillary são extremos opostos como políticos, e o estilo direto e visceral de Trump pode ser difícil para Hillary, cuja tendência é falar detalhadamente de políticas e apresentar planos subdivididos em 12 pontos.

    "Você pode imaginar o que ele pode fazer?", perguntou Matthew Dowd, ex-estrategista de Bush. Para ele, Hillary vai falar de salários iguais para mulheres e do direito ao aborto, e Trump vai se voltar a ela e dizer: "Você nem consegue cuidar de seus próprios problemas em casa".

    Bill Clinton descreve Trump como ideal para a era da "eleição no Instagram", quando os eleitores buscam soluções fáceis e imediatas para problemas complexos ("erguer um muro!", "barrar os muçulmanos!").

    Já Hillary pode parecer estática e dar a impressão de estar seguindo um roteiro definido quando tenta dar respostas planejadas em debates.

    Será difícil para Hillary continuar focada sobre as questões políticas e manter-se acima do nível da briga quando seu adversário e sua própria campanha se digladiarem numa disputa brutal.

    "Não será tanto esperança e mudanças", comentou David Plouffe, que dirigiu a campanha de Obama em 2008, aludindo ao slogan que definiu essa campanha. "Será mais algo como ódio e castração."

    Com reportagem de GARDINER HARRIS

    Tradução de CLARA ALLAIN

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