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    Terror na Europa

    depoimento

    'Nas calçadas quase vazias, pessoas se grudavam a seus telefones'

    ZECA CAMARGO
    COLUNISTA DA FOLHA, EM BRUXELAS

    22/03/2016 14h17

    No lugar das boas-vindas, que geralmente nos recebe quando nos aproximamos de uma estação de trem na Europa, a voz anunciou: "Lamentamos informar que acabou de acontecer uma explosão no aeroporto de Bruxelas e por enquanto temos notícia de nove vítimas".

    Eram 9h15 da manhã desta terça-feira (22), e eu tinha acabado de chegar no último trem de Paris antes que a polícia belga fechasse a estação para entradas e saídas.

    A caminho do centro da cidade, veio pela internet a notícia do segundo atentado, na estação Maelbeek, que une as principais instituições europeias: a Comissão Europeia e o Parlamento Europeu. As ruas imediatamente começaram a esvaziar.

    As poucas pessoas que ainda circulavam pela calçada estavam grudadas nos seus telefones revendo as imagens duras das explosões gravadas por outros celulares —os das pessoas que estavam próximas às explosões.

    Cheguei à casa dos amigos que vim visitar e todos estavam com aquela expressão de surpresa silenciosa, inspirada do próprio silêncio que vinha das ruas, cortado só de vez em quando por um barulho de helicóptero.

    O conselho, quase uma ordem, era para que ninguém saísse de casa. Contrariamos a recomendação e fomos até o restaurante onde um deles trabalha para comer algo. Ao contrário de praticamente todas as lojas pelas quais passamos, ele estava aberto.

    Fizemos metade do trajeto de táxi. Eles circulavam timidamente, alguns até sem cobrar nada pela corrida, como uma maneira de ajudar as pessoas a voltarem mais rápido (e com segurança) para suas casas. A certa altura, o tráfego tornou-se inviável. Algumas ruas, ao que parecia, foram fechadas repentinamente.

    Ataque em Bruxelas

    Seguimos a pé, passando por mais de uma escola onde um punhado de pais aguardavam ansiosos a saída dos seus filhos. A recomendação era para que eles ficassem por lá pelo menos até o início da tarde.

    No restaurante, o movimento era fraco. Mas só de ter uma dúzia de clientes com vontade de comer fora neste dia já era de se surpreender. Na cozinha, comandada por um chef brasileiro, Demian Zimmer, o clima era tenso —o que felizmente nada interferiu na sua reputação de preparar alguns do melhores pratos da cidade.

    As janelas atrás das mesas esboçava uma possibilidade de que o movimento lá fora voltasse ao normal. Mas, caminhando de volta para casa, o único vestígio de normalidade era a imagem dos pais buscando seus filhos no colégio. Que história eles ouviriam em casa?

    Nos últimos meses, desde os ataques de 13 de novembro do ano passado em Paris, os belgas, sobretudo os habitantes de Bruxelas, se acostumaram a viver no que ficou conhecido como alerta vermelho: o nível quatro de atenção para o perigo de um ataque terrorista.

    Uma relativa maré de tranquilidade fez com que nas últimas semana o alerta passasse para amarelo, nível dois. Mas, nesta manhã, depois do que já é o maior ataque na Bélgica desde a Segunda Guerra Mundial (1939-45), vermelho volta a ser a cor da primavera em Bruxelas.

    Na cidade sitiada, onde inesperadamente passo então a noite graças à generosidade desses amigos que me acolheram (solidariedade, felizmente, anda em alta em momentos como esse), aeroportos e estações de trem seguem fechados, e as estradas, bem controladas. Não será uma noite tranquila.

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