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    Sob protesto, filha do ex-ditador Fujimori é favorita na eleição no Peru

    SYLVIA COLOMBO
    ENVIADA ESPECIAL A LIMA

    07/04/2016 02h00

    Juan Carlos Guzmán Negrini/Xinhua
    Manifestantes fazem ato que lembra o autogolpe de Alberto Fujimori de 1992, às vésperas da eleição
    Manifestantes fazem ato que lembra o autogolpe de Alberto Fujimori de 1992, às vésperas da eleição

    Mais de 50 mil pessoas foram às ruas na noite da última terça (5) protestar contra a candidata Keiko Fujimori, filha do ex-ditador peruano Alberto Fujimori (1990-2000), que lidera as pesquisas de intenção de voto para o primeiro turno das eleições presidenciais deste domingo (10).

    As manifestações tiveram lugar em Lima e em outras 20 cidades do país.

    "Foi uma demonstração contundente e muito representativa pela quantidade e pelos atores sociais que estiveram presentes", disse à Folha o escritor e jornalista Gustavo Gorriti (autor de "Sendero"), sequestrado pelo Exército logo após o golpe.

    A marcha, que percorreu bairros de classe média e do centro de Lima, reuniu familiares de desaparecidos, associações de direitos humanos, diretores de meios de comunicação e jornalistas que foram censurados ou presos no período, atores, intelectuais e líderes da oposição.

    Os manifestantes levavam cartazes dizendo "fujimorismo nunca mais" e "não a Keiko". A data escolhida não foi ao acaso. Em 5 de abril de 1992, há 24 anos, Alberto Fujimori fechou o Congresso e declarou o "autogolpe" que transformou sua gestão numa ditadura.

    Guadalupe Pardo - 3.abr.2016/Reuters
    Keiko Fujimori, filha do ex-ditador Alberto, chega ao debate presidencial em Lima no último domingo (3)
    Keiko Fujimori, filha do ex-ditador Alberto, chega ao debate presidencial em Lima no último domingo (3)

    KEIKO CANDIDATA

    Esta é a segunda vez que Keiko Fujimori, 40, tenta concorrer à presidência. Tendo estudado nos EUA e casado com um norte-americano, ela voltou a Lima quando os pais se separaram, e passou a atuar como primeira-dama durante a gestão do pai.

    Em 2011, lançou-se candidata e perdeu por uma apertada margem o segundo turno contra o atual mandatário, Ollanta Humala.

    No atual pleito, a candidata fujimorista tem 33% das intenções de voto, contra 16% do economista conservador Pedro Pablo Kuczynski (conhecido como PPK) e 15% da esquerdista Veronika Mendoza (segundo pesquisa do instituto Ipsos de domingo).

    Analistas ouvidos pela Folha afirmam que o candidato que ficar em segundo lugar no domingo, mesmo com uma grande diferença de votos, pode vencer Keiko no segundo turno, em 5 de junho, devido ao alto índice de rejeição, da candidata, 52%.

    Enquanto Kuczynski está estacionado, Mendoza vem crescendo.

    "A tendência agora é de uma polarização da disputa, se isso se confirma, Mendoza se beneficia", diz Gorriti.

    A candidata esquerdista, de 35 anos, é dos poucos candidatos presidenciais (ao todo são 16) não atingidos diretamente pelo escândalo dos "Panama Papers", ao contrário de Keiko e PPK.

    NOVA ESTRATÉGIA

    Nos últimos quatro anos, Keiko mudou a estratégia.

    "Como percebeu que se continuasse atada às bandeiras do pai, as da eficiência contra a inflação e contra a violência, não sairia dos 30%, ela tem adotado um discurso mais flexível, mirando eleitores de centro e de esquerda", diz o biógrafo da candidata José Carlos Paredes.

    De fato, Keiko afastou de seu núcleo de campanha velhas lideranças fujimoristas e passou a criticar aspectos negativos da gestão do pai, como a corrupção, e admitir que houve "certos tipos de abusos de direitos humanos".

    A candidata chegou a se dizer favorável a debater a legalidade da união civil entre homossexuais (não há casamento gay no Peru) e do aborto em algumas situações.

    Também afirmou, em mais de uma ocasião, que o fechamento do Congresso, em 1992, pelo pai, foi um "erro" e que isso jamais aconteceria em sua gestão.

    "A força do fujimorismo está numa recordação, numa lembrança de um estado de ânimo. E é difícil manter esse mito vivo e ao mesmo tempo ampliar suas bandeiras", disse à Folha o analista político Alberto Vergara.

    Já para Paredes, a força do fujimorismo está nos dois extremos na escala social.

    "São as populações dos Andes, sempre esquecidas, que se lembram de Fujimori como o único que foi até lá e construiu uma ponte, uma escola. Por outro lado, está o alto empresariado do país, que se beneficiou de suas políticas de abertura econômica. O desafio de Keiko é conquistar quem está no meio."

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