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    Nas festas de Elizabeth 2ª, os chatos sempre são colocados na mesma mesa

    COURTNEY RUBIN
    DO "NEW YORK TIMES", EM LONDRES

    26/04/2016 17h34

    Lady Elizabeth Anson, prima da rainha Elizabeth 2ª e organizadora de festas da monarca há mais de 50 anos, foi criada numa casa semelhante a Downton Abbey, onde empregados passavam os jornais a ferro, e se casou na abadia de Westminster.

    Mas, numa sexta-feira recente, lady Elizabeth, responsável pela organização de algumas das festas mais aristocráticas do Reino Unido, estava em sua sala de estar, cheia de azaleias brancas. Usando um casaco cinza Tomasz Starzewski comprado há mais de 40 anos numa liquidação, ela tomava chá em uma caneca com flores roxas (comprada no eBay) e falava de como superou seu vício semanal de comprar bilhetes de loteria.

    "Ainda arrisco a sorte quando o prêmio é muito alto", disse lady Elizabeth, que também já organizou eventos para Tom Cruise e outras celebridades interessadas em discrição.

    Amelia Troubridge/The New York Times
    -- PHOTO MOVED IN ADVANCE AND NOT FOR USE - ONLINE OR IN PRINT - BEFORE APRIL 24, 2016. -- Lady Elizabeth Anson, a cousin of Queen Elizabeth II and for more than 50 years, her party planner, in London, March 14, 2016. Anson may have married at Westminster Abbey, but still thinks of herself as a hard-working entrepreneur. “I do not know how to be a lady who lunches,†Anson said. “I love my work, and my work pays for my home.†(Amelia Troubridge/The New York Times) ORG XMIT: XNYT83 ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Lady Elizabeth Anson, prima da rainha Elizabeth 2ª e responsável por organizar as festas da monarca

    Ela usava o que pareciam ser sapatilhas Roger Vivier, mas quando uma jornalista sugeriu que ela talvez quisesse tirar algo que parecia estar colado à sola deles antes de ser fotografada, lady Elizabeth, 75, entregou os calçados ao seu mordomo uniformizado. "Com certeza, milady", disse ele, antes de tirar a etiqueta de preço que revelava que as sapatilhas tinham custado £25 (cerca de R$ 129).

    "Da Marks & Spencer", disse lady Elizabeth, parecendo feliz com essa evidência de sua própria frugalidade.

    E por que não? Em sua "família mais chique", como ela a chama, a frugalidade é uma qualidade apreciada. Sabe-se de ocasiões em que a rainha andou de trem público. Kate Middleton, a duquesa de Cambridge (lady Elizabeth a chama de "Catherine"), é aplaudida por usar vestidos mais de uma vez.

    Que outra pessoa seja a parente embaraçosamente perdulária que deixa a monarquia mal na fita. Lady Elizabeth –filha da princesa Anne da Dinamarca e afilhada do rei George 6º– é simplesmente uma profissional que trabalha duro, apesar de a palavra "lady" constar de seu endereço de e-mail.

    Ela pediu ao mordomo suas balas de nicotina. Lady Elizabeth parou de fumar nos anos 1960, voltou novamente após 17 anos e parou mais uma vez, com dificuldade, 11 anos atrás.

    Se ela recomeçasse, a sala de estar a repreenderia. Todas as superfícies estão cheias de ovos decorativos –536 deles, segundo a última contagem feita por seus netos– que ela começou a colecionar depois de seu padrasto lhe presentear com um ovo de alabastro para manusear quando estivesse estressada, da primeira vez que ela parou de fumar.

    Seu negócio é altamente estressante. Um de seus projetos é a festa dos 90 anos da rainha, este mês. A data está sendo comemorada com festas de rua, desfiles e cerimônias, mas lady Elizabeth cuidou da festa íntima da família, que, como todos os outros eventos que organiza, ela não se dispôs a comentar.

    Amelia Troubridge/The New York Times
    -- PHOTO MOVED IN ADVANCE AND NOT FOR USE - ONLINE OR IN PRINT - BEFORE APRIL 24, 2016. -- Lady Elizabeth Anson, a cousin of Queen Elizabeth II and for more than 50 years, her party planner, in London, March 14, 2016. Anson may have married at Westminster Abbey, but still thinks of herself as a hard-working entrepreneur. “I do not know how to be a lady who lunches,†Anson said. “I love my work, and my work pays for my home.†(Amelia Troubridge/The New York Times) ORG XMIT: XNYT84 ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
    Lady Elizabeth Anson, prima da rainha Elizabeth 2ª e responsável por organizar as festas da monarca

    Mas ela se mostra tão indiscreta quanto é possível para quem precisa respeitar acordos de confidencialidade, dizendo que um dos maridos de Ivana Trump pós-Donald "parece um sapo". (Ivana Trump é ex-cliente dela. As coisas não terminaram bem entre elas.)

    Falando do rei de Tonga, que estava acima do peso e de quem ela estava cuidando, ao lado de todos os outros chefes de Estado estrangeiros, no casamento real de 2011, lady Elizabeth comentou: "Ele achou que quebraria os móveis do Palácio de Buckingham". As cadeiras do palácio são muito baixas, ela disse –"maravilhosas, Luís 14. Dão a impressão de que vão quebrar quando você se senta nelas. Mas não quebram."

    Enquanto falávamos da arte da conversa, que se perdeu devido aos celulares, ela tirou do gancho seu telefone fixo, que não parava de tocar, deixando o aparelho pendurado aos seus pés. Debruçando-se para frente, disse: "Acho que posso lhe contar o seguinte. É sobre a família real."

    Ela disse que a rainha tinha convidado seus netos para jantar. "E ela me disse que achou realmente difícil", contou lady Elizabeth, "porque eles não sabem conversar realmente entre eles. Ela falou: 'Imagino que seja porque eles vivem levantando, sentando-se, ajudando alguém, colocando alguma coisa no lava-louças ou fazendo sei lá o quê, porque não têm empregados suficientes'."

    Sobre Sua Majestade: a rainha é "uma anfitriã extremamente cuidadosa", embora não faça questão de servir apenas água mineral Malvern ou ter apenas junquilhos amarelos nos vasos de flores, conforme foi noticiado. "As pessoas adoram criar mitos", disse lady Elizabeth. "Isso as faz se sentir muito importantes." Na realidade, foi um jardineiro do castelo de Windsor quem impôs as flores amarelas.

    Para o casamento de William e Kate, no qual lady Elizabeth prestou assessoria (além de organizar o jantar familiar da véspera), o casal tinha ideias muito firmes "que a rainha, maravilhosa, ouviu", disse ela. Os casamentos reais tradicionais não são seguidos de recepção –depois da cerimônia religiosa, os convidados simplesmente vão embora. Mas, depois de ver que era isso o que seus amigos faziam, William e Kate quiseram uma recepção.

    "Então o palácio precisou aprender muita coisa sobre canapés diferentes, porque não estava acostumado a fazê-los", disse lady Elizabeth.

    No gabinete da rainha, ela é conhecida pelo pseudônimo de Shirley Temple (ou era até este artigo ser publicado), embora não se recorde por quê. Falando de sua equipe de cinco profissionais, ela disse: "Tínhamos literalmente os nomes mais engraçados possíveis para designar todo o mundo. E as pessoas que tinham mais consciência de sua importância como celebridades recebiam nomes realmente extraordinários."

    Enquanto procurava locais de casamento com a atriz Isla Fisher, que ia se casar com Sacha Baron Cohen, lady Elizabeth se divertiu ao ver que Fisher (pseudônimo: Sally Dangletrot) andava com três perucas diferentes no carro, para se disfarçar. "Eu não a teria reconhecido se a visse passando na rua. Eu não devia dizer isso, porque é falta de educação."

    Lady Elizabeth abriu sua empresa em 1960, aos 18 anos de idade. A ideia lhe veio depois do estresse de organizar sua própria festa de debutante, em 1959, que a impediu de curtir a noite.

    Uma dor de cabeça especial era localizar R.S.V.P.s (iniciais de "responda por favor" em francês: comunicações enviadas por pessoas convidadas a festas ou eventos, agradecendo o convite e confirmando se o aceitam ou não), e lady Elizabeth diz que foi ela quem inventou "essa coisa horrível chamada cartão de resposta" para resolver o problema. A primeira vez em que ela criou um desses cartões, ela se esqueceu de deixar um espaço para os convidados escreverem seus nomes, acabando por receber muitos "sins" e "nãos", sem saber de quem eram.

    O primeiro evento que ela organizou para a rainha foi uma festa estilo discoteca no Palácio de Windsor para o príncipe Charles, então com 15 anos, e a princesa Anne, então com 13. "Minha empresa começou antes da invenção da discoteca. Então quando um homem me disse que me cobraria £25 (cerca de R$ 129) para colocar discos para tocar na festa, pensei: 'Esse homem enlouqueceu? Qualquer pessoa pode colocar discos para tocar na vitrola.'" Mas não demorou a perceber que era "um gênero artístico".

    Uma festa organizada para os Rolling Stones acabou com a polícia aparecendo quando os convidados bêbados estavam jogando garrafas ainda fechadas de Don Pérignon no Tâmisa. Mas os eventos de lady Elizabeth geralmente são conhecidos por sua elegância calma e toques de sensibilidade.

    Num jantar de temática branca para 40 pessoas oferecido no mês passado por membros da família real no cavernoso museu Victoria & Albert, onde o vento penetra no recinto, lady Elizabeth contou que procurou "meu homenzinho indiano que vende caftans na Portobello Road" e comprou um carregamento de pashminas brancas para colocar sobre cada cadeira. Ela escondeu garrafas de água quente sob almofadas (e sugeriu aos convidados que usassem "artigos de tecnologia de aquecimento da Uniqlo").

    "É aquela coisa maçante que dizem: 'O diabo está nos detalhes'. O diabo está no detalhe, e o detalhe não precisa custar muito."

    Lady Elizabeth sabe organizar eventos que precisam respeitar protocolos rígidos de etiqueta –descobrindo em que anos vários convidados foram convertidos em condes ou marqueses, para determinar sua senioridade–, mas não tem medo de romper com o protocolo e as convenções.

    Veja o vídeo

    Glynn Woodin, que trabalha com ela há 30 anos como diretor gerente da Mustard Catering, uma das empresas de catering favoritos da alta sociedade, recorda que lady Elizabeth decidiu recentemente que a toalha de mesa de damasco (cuja cor ele descreveu como "conhaque com um pouco de oliva") ficaria melhor usada do avesso, com o lado áspero para cima. "Estávamos organizando uma festa absolutamente cheia de membros da família real. Você e eu ficaríamos horrorizados com a ideia de usar a toalha de mesa do avesso, mas foi totalmente acertado."

    Lady Elizabeth nunca divulgou seus serviços. Ela atribui seu sucesso em parte ao fato de ser "terrivelmente tímida" –ela ainda lamenta uma festa à qual acabou não indo, muitos anos atrás, quando, de terninho de veludo vermelho e com os cabelos arrumados especialmente, ela ficou ao lado do elevador, vendo as pessoas entrar, sem coragem de fazer o mesmo.

    Assim, ela organiza os espaços de festas levando os tímidos em conta. "Qualquer festa numa casa de campo vai fracassar se as pessoas entram no recinto e se veem numa pista de dança", ela disse. "E um rapaz qualquer trouxe você de carro, então ele está com uma garota em cada braço, e o que você vai fazer sozinha?" A solução que ela encontrou: um bar bem iluminado, que ela descreve como "área para encontrar e deixar pessoas".

    Organizando vários eventos por semana, ela disse que tem pouco tempo para hobbies, mas não perdia a série de TV "Downton Abbey" (apesar de ficar consternada com a toalha de mesa da sala de jantar, porque "uma mesa bem polida era o orgulho e a alegria de um mordomo"). Ela gosta de buscar alimentos na natureza, especialmente cogumelos. "Existe um livro maravilhoso chamado 'Food for Free' (comida de graça). É incrível quanta coisa se pode comer que se encontra na beira dos caminhos", ela disse.

    Lady Elizabeth parou para refletir sobre o que faria se se aposentasse, mas então voltou rapidamente ao trabalho.

    DICAS DE LADY ELIZABETH PARA FESTAS

    Com ou sem membros da família real presentes, a organizadora das festas da rainha Elizabeth obedece a sete regras rígidas.

    Quando lady Elizabeth Anson recebe convidados em casa, sempre fica aliviada por ter uma mesa de jantar redonda, para poder dispensar com o protocolo. Não é preciso preocupar-se em determinar quem é o convidado mais importante, que teria que ficar sentado no meio.

    "Isso facilita a vida", diz lady Elizabeth. "Se há um duque presente, ele pode se sentar em algum lugar à minha frente, se eu achar que há alguém mais interessante que quero colocar do meu lado."

    Ela segue às seguintes regras:

    - O convite dá o tom. Se o convite parecer barato, diz ela, "as pessoas imaginam que o vinho será ácido e a comida, horrível". Simplicidade e elegância são preferíveis à originalidade em matéria de convites: "Havia alguém que queria que eu mandasse convites dizendo 'reservem tal data' com cristais Swarovski ao custo de não menos de 2.500 libras (cerca de R$ 12.900) por cartão, e isso seria simples vulgaridade", ela disse. No caso de eventos para americanos, lady Elizabeth admite ocasionalmente usar convites da empresa Paperless Post.

    - Festas boas não precisam ser extravagantes. "Uma festa com bom vinho de mesa, boa massa ou boa linguiça com purê de batatas pode ser um sucesso tão grande quanto um evento com champanhe Krug, caviar, ostras e lagosta", diz Elizabeth. "O importante não são os ingredientes caros, são as pessoas."

    - Uma iluminação boa é essencial. Depois dos convidados, o elemento mais importante de uma festa é a iluminação apropriada. "A iluminação garante o sucesso ou fracasso de um evento", ela diz. "Você pode usar iluminação para deixar as pessoas bonitas e para dividir um ambiente muito grande."

    - Use o telefone. É a maneira mais rápida de se organizar e dá lugar a menos mal-entendidos. "É antiquado, mas instantâneo", diz lady Elizabeth. "Não quero ficar trocando e-mail intermináveis e outras coisas."

    - Faça todo mundo se sentar. Se estiver tentando chamar seus convidados para a mesa, diga que será servido um suflê. "Nunca houve ninguém que tivesse me procurado mais tarde para reclamar porque não havia esse prato."

    - Coloque todas as pessoas entediantes sentadas juntas. "Elas não percebem que são um tédio e ficam felizes assim", ela diz. "Essa é minha maior dica."

    - Encerre uma festa quando ainda há pelo menos 20 pessoas na pista de dança. "Se você deixar a festa ir minguando aos poucos, será a morte. Cometi um erro em toda minha carreira, que foi me deixar convencer a fazer a banda recomeçar a tocar. Não deu certo." Anuncie (ou mande a banda anunciar) que essa será a penúltima dança e então faça o bar parar de servir os convidados. "As pessoas vão embora rapidinho quando os drinques param de ser servidos", diz lady Elizabeth.

    Tradução de CLARA ALLAIN

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