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    Perseverante, Hillary enfrentou dura batalha para se tornar candidata

    AMY CHOZICK
    DO "NEW YORK TIMES"

    08/06/2016 17h00

    Timothy A.Clary/AFP
    Democratic presidential candidate Hillary Clinton acknowledges cheers from the crowd during her primary night event at the Duggal Greenhouse, Brooklyn Navy Yard, June 7, 2016 in New York. Americans from New Jersey to California cast ballots June 7th in the final major primaries of the 2016 White House race, after delegate counts showed Hillary Clinton winning the Democratic nomination. Sanders has thus far ignored media reports that she has clinched the magic number of delegates. / AFP PHOTO / TIMOTHY A. CLARY ORG XMIT: TC005
    A virtual candidata democrata à Presidência dos EUA, Hillary Clinton, em evento em Nova York

    Se houve um instante único que captou o que vai levar Hillary Clinton a ser nomeada a candidata presidencial democrata em 2016, esse instante aconteceu não no lançamento de sua campanha, em Nova York, em junho passado, nem em qualquer um dos discursos em que ela festejou as vitórias arduamente conquistadas sobre o senador Bernie Sanders nas primárias.

    Foi um instante não programado quando Clinton, em um gesto blasé, limpou um fiapo de tecido ou um pouco de poeira —ou talvez nada— de seu ombro, enquanto um comitê da Câmara, liderado por republicanos, a sujeitava a mais de oito horas de interrogatório, em outubro passado, sobre o tratamento que ela deu ao ataque terrorista de 2012 em Benghazi, na Líbia.

    Hillary pode não ser a oradora que é o presidente Barack Obama, pode não ser uma política que mantém tanto contato com as bases quanto foi seu marido.

    Mas sua determinação e força nesta campanha são uma inspiração evidente para mulheres mais velhas, eleitores negros e muitos outros que enxergam em sua perseverança uma espécie de espelho que reflete as dificuldades deles.

    E a própria durabilidade de Hillary —sua garra, tenacidade e capacidade de suportar e ultrapassar adversidades— talvez seja exatamente o que é preciso para derrotar Donald Trump.

    Como mulher de político, primeira-dama, senadora e secretária de Estado, além de candidata à Presidência em duas ocasiões, Clinton, 68, redefiniu o papel das mulheres na política americana cada vez que se reinventou. Ela deixou a nação mesmerizada várias vezes, tanto em episódios lancinantes de escândalo ou reveses quanto em vitórias.

    "Hillary chegou ao palco público como uma pessoa um pouco diferente", comentou uma assessora de longa data, Ann Lewis. "Ela atraiu fascínio, devoção e ataques, e os ataques partidários nunca pararam."

    "Mesmo quando ela era primeira-dama, as pessoas reagiam com 'quem ela pensa que é?'", comentou Melanne Verveer, amiga íntima de Hillary e sua chefe de gabinete na Casa Branca.

    Os confidentes dela dizem que é previsível que agora, tendo superado tantos obstáculos anteriores, incluindo alguns que ela própria criou, Hillary enfrente um adversário tão ansioso para travar um embate negativo e reproduzir as brigas intransigentes que definiram sua carreira.

    INFLUÊNCIA DA MÃE

    Em seu discurso de vitória na noite de terça-feira (7), Hillary disse que a maior influência que teve na vida foi sua mãe, "que me ensinou a nunca recuar diante de um brigão —um conselho que revelou ser ótimo".

    Foi com essa mesma garra que ela deu a volta por cima depois da derrota acabrunhante para Obama em 2008, quando ela garantiu a uma multidão de partidárias chorosas que elas tinham rachado "a barreira invisível ao avanço das mulheres" em 18 milhões de pontos.

    Durante 14 anos consecutivos, e 20 anos ao todo, Hillary Clinton é saudada como a mulher que os americanos mais admiram, segundo uma pesquisa Gallup anual.

    Joyce Naltchayan/AFP
    Presidente dos E.U.A e a primeira-dama acenam ao desembarcar em Nova York: President Bill Clinton and First Lady Hillary board Air Force One to New York, NY, 20 September at Andrews Air Force Base, MD. President Clinton is scheduled to attend the United Nations 53rd session of the General Assembly [ELECTRONIC IMAGE] AFP PHOTO Joyce NALTCHAYAN-AFP PHOTO AFP/JOYCE NALTCHAYAN/jn/eh-AFP PHOTO AFP/JOYCE NALTCHAYAN/jn/eh*** NÃO UTILIZAR SEM ANTES CHECAR CRÉDITO E LEGENDA***
    Hillary em set.1998, à época primeira-dama, acompanhada do marido e então presidente, Bill Clinton

    Mas sua campanha e a polêmica em torno do uso de um servidor particular de e-mail em sua época de secretária de Estado cobraram um preço: seus índices de aprovação popular caíram, e hoje menos pessoas a consideram confiável. E ela está novamente sendo retratada de modo caricato, como uma política calculista e pouco autêntica: uma lady Macbeth, agora protagonista de sua própria peça de teatro.

    Do mesmo modo, sua longevidade e fama não contam apenas a seu favor: a bagagem que ela carrega por ser uma "insider" democrata hábil, algo citado de modo mais prejudicial na questão dos valores enormes que comandava como oradora paga para bancos de Wall Street, pesam contra ela num ciclo eleitoral em que os ventos têm soprado em favor dos "outsiders".

    Se a antipatia com que ela sempre foi recebida entre alguns setores pode ser atribuída em parte à dificuldade dos americanos em ajustar-se às mudanças dos papéis de homens e mulheres em casa, no trabalho e na política, sua história de combate político também lhe deixou cicatrizes que a definem como candidata: muito consciente das realidades de Washington, mas cautelosa ao extremo.

    DISPUTA COM SANDERS

    Sua disputa prolongada com Bernie Sanders, cuja campanha poucos imaginavam que pudesse sobreviver às primárias iniciais, trouxe à tona o custo dessa contenção de estilo e de conteúdo.

    Enquanto os eleitores se rendem à impulsividade irrestrita de Trump e ao idealismo declarado de Sanders, Hillary vem dando mostras de pouco de uma coisa ou de outra.

    "Esta não é uma eleição cautelosa, incremental, e ser cautelosa não está ajudando Hillary", disse a pesquisadora democrata Anna Greenberg. "As duas primárias trouxeram à tona a profundidade da insatisfação, frustração e revolta dos eleitores. Hillary vem tendo que ajustar-se a isso e terá que ajustar-se ainda mais."

    Há 14 meses a campanha de Hillary está fora de sintonia com os eleitores mais jovens e com setores de um eleitorado indignado que exige mais do que a competência e o trabalho árduo que ela promete.

    A dificuldade que ela vem tendo com esses eleitores pode ser um sinal de aviso.

    Uma coisa que não ajuda é que a campanha de Hillary já teve meia dúzia de slogans, desde a defesa dos "americanos comuns" até "lutar por nós", "romper barreiras" e, mais recentemente, "mais fortes juntos" —fazendo uma alusão indireta às declarações divisivas de Trump em relação a mexicanos, muçulmanos e outros grupos.

    Enquanto Bernie Sanders demoniza Wall Street e Trump despreza os imigrantes, e enquanto ambos prometeram reverter o mal-estar econômico, Clinton vem fazendo campanha baseada na praticidade a todo custo.

    A promessa mais decisiva que ela fez até agora é de não prometer mais do que pode cumprir. "Não precisamos de mais disso", disse aos eleitores.

    Mas ela compensa por suas deficiências em oratória, ouvindo os problemas das pessoas e propondo soluções. Hillary chorou quando conversou com um homem cuja mãe tem mal de Alzheimer e com uma mulher que perdeu o filho num acidente com arma de fogo.

    E ela demonstra uma vulnerabilidade que não mostrou em 2008, quando se apresentou como futura comandante em chefe forte, procurando neutralizar quaisquer dúvidas quanto a se era forte o suficiente para ocupar o Salão Oval.

    "Caso vocês não tenham percebido, não sou política nata, como meu marido ou o presidente Obama", disse Hillary em um de seus debates com Sanders. Foi uma declaração animadoramente franca.

    "As pessoas estão indecisas sobre o que pensam da liderança feminina. Isso é algo que elas realmente têm dificuldade em encarar", comentou a senadora democrata Kirsten Gillibrand, de Nova York. "A ambiguidade em torno de Hillary está fora dela. Vem do ponto de vista das outras pessoas."

    É claro que as atitudes em relação à liderança feminina podem mudar. E, falando com repórteres na segunda-feira (6), horas antes de ser noticiado que ela tinha garantido sua nomeação como candidata, Clinton olhou para o futuro, para depois de novembro, um tempo em que candidatas presidenciais mulheres talvez não precisem ter estado presentes por tanto tempo quanto ela para terem a chance de candidatar-se à Casa Branca.

    "São principalmente mulheres e meninas, mas não apenas elas: alguns homens também trazem suas filhas para me encontrar e me dizem que vão votar em mim por causa de suas filhas", disse Hillary.

    "Acho que fará uma grande diferença para um pai ou uma mãe poderem olhar para sua filha, como olhariam para um filho, e dizer: 'Você poderá ser qualquer coisa que quiser neste país, incluindo presidente dos Estados Unidos'."

    Tradução de CLARA ALLAIN

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