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    Relação de Cristina Kirchner e juízes mina Justiça da Argentina

    LUCIANA DYNIEWICZ
    DE BUENOS AIRES

    04/07/2016 02h00

    As últimas decisões da Justiça argentina que atingiram a ex-presidente Cristina Kirchner envolvem dois magistrados controversos —Sebastián Casanello e Claudio Bonadio— e resumem a relação turbulenta entre o Executivo e o Judiciário.

    Na quinta (30), dois juízes de segunda instância determinaram que Casanello avance "sem demora" nas investigações da relação de Cristina com o empresário Lázaro Báez, preso sob suspeita de lavagem de dinheiro e acusado de ter enviado ilegalmente US$ 25 milhões (R$ 80,7 milhões) à Suíça.

    Emiliano Lasalvia - 2.jul.2016/AFP
    A ex-presidente da Argentina Cristina Kirchner chega ao Aeroparque Jorge Newbery, em Buenos Aires
    A ex-presidente da Argentina Cristina Kirchner chega ao Aeroparque Jorge Newbery, em Buenos Aires

    Báez era um dos melhores amigos do marido de Cristina, o ex-presidente Néstor Kirchner, que morreu em 2010, e sua empresa foi uma das grandes vencedoras de licitações sob o kirchnerismo (2003-2015).

    Rompido com Cristina, o empresário afirma que Casanello protege a ex-mandatária e que, no ano passado, viu o juiz saindo de uma reunião com ela na Quinta de Olivos (residência oficial da Presidência). Há ainda rumores de que Casanello tenha ligação com o movimento político kirchnerista La Cámpora.

    No outro extremo, Bonadio é visto como um magistrado parcial, que estaria se vingando do kirchnerismo. Foi ele quem emitiu, também na quinta (30), um mandado de busca e apreensão em escritórios da empresa imobiliária de Cristina, a Los Sauces.

    Há suspeitas de que Báez e o empresário Cristóbal López (também grande vencedor de licitações nos últimos anos) tenham alugado apartamentos da Los Sauces como forma de pagamento de propina.

    Bonadio chegou à Justiça federal apoiado pelo ex-presidente Carlos Menem (1989-1999) e teve seu nome citado no escândalo dos "juízes do guardanapo", uma lista feita com nomes dos magistrados que supostamente decidiam a favor do governo.

    Enquanto Cristina estava no poder, Bonadio comandou o caso Hotesur, que apura o pagamento de diárias fictícias feito por Báez à empresa hoteleira da ex-presidente. Contrariada, a então mandatária articulou para afastá-lo do caso e para o salário dele ser reduzido em 30%. Agora, com ela longe, Bonadio impulsiona dezenas de investigações contra kirchneristas.

    A relação dos juízes com Cristina levou a Ordem dos Advogados local a pedir uma auditoria no trabalho dos magistrados federais criminais, medida que foi aprovada na última semana pelo Conselho de Magistratura.

    Para Carlos María Carcova, professor de direito da Universidade de Buenos Aires, a origem da falta de autonomia do Judiciário está no Conselho, responsável pela seleção dos juízes federais.

    Após os candidatos ao posto fazerem uma prova, são entrevistados por uma comissão formada por três juízes, três deputados, um representante do Executivo e outro da academia. Essa junta monta uma lista com três nomes e a submete ao presidente e ao Congresso, que decidem qual candidato assumirá. "Magistrados sempre devem favores a políticos", diz Carcova.

    Casanello, Bonadio e todos os colegas deverão passar pela auditoria. Questiona-se, no entanto, quão eficiente será esse trabalho, a ser executado pelo próprio Conselho.

    Questionado sobre os processos contra kirchneristas desde a saída de Cristina, o presidente da Corte Suprema, Ricardo Lorenzetti, afirmou à imprensa local que os juízes não devem decidir "em função de mudanças de governo, mas de valores morais".

    Segundo ele, o Judiciário já trabalhava em casos que envolviam Cristina e seus aliados mesmo quando ela estava no poder. "Tomamos muitas decisões que provocaram situações rígidas ao governo anterior."

    Casanello nega ter qualquer relação com Cristina. Bonadio diz que o escândalo dos juízes do guardanapo foi uma intriga política.

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