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    'Só falam para esperar', lamenta mãe de brasileira desaparecida em Nice

    FERNANDA GODOY
    ENVIADA ESPECIAL A NICE

    17/07/2016 15h49

    Fernanda Godoy/Folhapress
    Inês Gyger, 55, mãe da brasileira desaparecida no atentado em Nice, na saída do Hospital Pasteur
    Inês Gyger, 55, mãe da brasileira desaparecida no atentado em Nice, na saída do Hospital Pasteur

    Neste domingo (17), terceiro dia após o atentado que deixou 84 mortos em Nice, a angústia persiste para parentes e amigos de pessoas desaparecidas. A brasileira Inês Gyger, viajou da Suíça em busca da filha Elizabeth Cristina de Assis Ribeiro, 30, e está inconformada com a falta de informação.

    "Está complicado. Eles só falam para a gente esperar. Que vão fazer teste de DNA e darão uma resposta em dois ou três dias", diz Inês, 55, que é auxiliar de enfermagem.

    O presidente interino, Michel Temer, determinou neste domingo (17) que o Ministério das Relações Exteriores redobre os "esforços para dar total assistência aos brasileiros atingidos pelo atentado na cidade francesa de Nice".

    O Consulado do Brasil em Paris, entretanto, tampouco consegue obter das autoridades francesas informação sobre a situação de Elizabeth.

    Segundo o Ministério da Saúde da França, os corpos de 14 das 84 vítimas ainda não foram identificados. As famílias só são chamadas para fazer o reconhecimento do corpo quando a identificação já foi comprovada por fotos ou DNA. A falta de documentos de identificação pessoal é um dos motivos alegados pelo governo para a demora.

    Dos 202 feridos, 85 continuavam internados neste domingo, 28 deles em estado grave.

    Arquivo Pessoal
    Kayla Assis Ribeiro (vestido estampado), 6, sua mãe, Elizabeth Cristina de Assis Ribeiro, 30, Kimea, de sete meses, e Djulia, 4. Kayla morreu em atendado em Nice
    Kayla Assis Ribeiro (vestido estampado), 6, sua mãe, Elizabeth Cristina de Assis Ribeiro, 30, Kimea, de sete meses, e Djulia, 4. Kayla morreu em atendado em Nice

    BUSCA POR INFORMAÇÕES

    Na saída dos hospitais, a imagem do desespero está estampada no rosto de pessoas que prosseguem na busca frustrada de informações.

    Uma família marroquina procura uma mãe com seu bebê. Um grupo de estudantes de várias nacionalidades cola cartazes em postes da cidade com as fotos de três jovens desaparecidos.

    "As autoridades francesas prometeram um minuto de silêncio amanhã [segunda]. Em lugar de um minuto de silêncio, quero dois minutos de informação. Não quero água, nem café, nem croissant. Quero informação. Estão faltando com o respeito", disse Inês, que usa no Facebook o nome Inês na Fé.

    Via Facebook, ela já recebeu mensagens de solidariedade até da China.

    "Não vou sair daqui até saber o que aconteceu com a minha filha", afirma a mãe, que está de plantão na porta do Hospital Pasteur, onde se encontra a maioria das vítimas.

    É na capela desse hospital que se encontra o corpo de Kayla, 6, neta de Inês. O marido de Elizabeth, o suíço Sylvan Solioz, viu quando sua mulher foi levada desacordada em um carro do Corpo de Bombeiros.

    "Ninguém sabe se ela estava desmaiada ou morta", diz Inês.

    ATAQUE

    Elizabeth e Kayla foram atropeladas pelo caminhão dirigido pelo tunisiano Mohamed Lahouaiej Bouhlel.

    Sylvan conseguiu salvar as duas filhas menores, Djulia, 4, e Kymea, 6 meses.

    O pai e as filhas estão internados na Fundação Lenval. O marido de Elizabeth, que trabalha como carpinteiro na Suíça, ainda não teve condições psicológicas de obter alta.

    "Ele fala o mínimo possível. Fica só com as filhas, dá mamadeira, troca fralda. A pequena, Kymea, está grudada a ele, não vai com ninguém", diz Inês.

    Ela chegou a Nice no sábado acompanhada de uma filha e de um genro, além dos sogros e da cunhada de Elizabeth.

    A família percorreu três hospitais, sem sucesso. Inês descreveu fisicamente Elizabeth ("grande, negra, com cicatriz no braço direito"), mostrou fotos, mas ficou sem resposta.

    "Ou ela está em coma, ou não está mais", diz Inês. "Minha filha estava amamentando. Ela é uma supermãe. Se estivesse consciente, teria feito contato."

    AÇÃO JUDICIAL

    Segundo Inês, nos corredores do hospital, aos quais os jornalistas não têm acesso, as famílias discutem ações judiciais que moverão contra o Estado. As autoridades francesas já prometeram arcar com todas as despesas hospitalares e acelerar a concessão de indenização às famílias das vítimas.

    A família suíço-brasileira tem contado com o apoio do Consulado da Suíça, já que Elizabeth tem dupla nacionalidade. A cônsul-geral do Brasil na França, Maria Edileuza Fonteneli Reis, falou por telefone com Sylvan e tentou contato com Inês.

    Elizabeth, o marido e as três crianças haviam chegado a Nice no sábado anterior à tragédia. Alugaram um apartamento perto da praia para passar um mês de férias de verão.

    "Ela sempre fez questão de organizar as férias com as filhas, dizia que depois elas cresceriam e iriam embora, que era preciso aproveitar", conta a avó.
    Inês se mudou de Olaria, na zona norte do Rio, para a Suíça há 26 anos, para trabalhar como babá.

    "Mãe de cinco filhos, sozinha, desempregada, eu aceitei", conta.

    Deixou as crianças com a avó. Com o tempo, se casou com um suíço, fez formação de auxiliar de enfermagem na Cruz Vermelha, e levou as filhas para morar com ela. Três continuam na Suíça, e as duas outras filhas voltaram para o Rio.

    Em tantos anos na Europa, nunca havia temido um atentado terrorista.

    "Mas, quando ouvi a notícia, tive a certeza de que minha filha estava lá, eu sabia. É como se fosse o réveillon de Copacabana, ela não ia perder", disse Inês.

    Editoria de arte/Folhapress
    Atentado em Nice - arte

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