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    Após tentativa de golpe, governo turco fecha 131 meios de comunicação

    PATRÍCIA CAMPOS MELLO
    DE SÃO PAULO

    27/07/2016 18h10 - Atualizado às 21h56

    Ozan Kose/AFP
    Pro-Erdogan supporters hold Turkish national flags and a portrait of Turkish President Recep Tayyip Erdogan during a rally against the military coup on Taksim square in Istanbul on July 23, 2016. Turkey pushed on with a sweeping crackdown against suspected plotters of its failed coup, defiantly telling EU critics it had no choice but to root out hidden enemies. Using new emergency powers, President Recep Tayyip Erdogan's cabinet decreed that police could now hold suspects for one month without charge, and also announced it would shut down over 1,000 private schools it deems subversive. / AFP PHOTO / OZAN KOSE ORG XMIT: 7875
    Manifestantes pró-Erdogan seguram bandeiras e uma foto do presidente em ato contra o golpe

    O governo da Turquia anunciou nesta quarta (27) o fechamento de 131 veículos de comunicação —entre eles 45 jornais, 23 rádios e 16 TVs, segundo a agência estatal Anadolu— e emitiu ordem de prisão contra 47 jornalistas.

    O país declarou estado de emergência após uma tentativa fracassada de golpe em 15 de julho, à qual o governo do presidente Recep Tayyip Erdogan reagiu com a detenção de mais de 15 mil pessoas (veja quadro abaixo) e um amplo expurgo nas Forças Armadas, no serviço público e no sistema de educação.

    Entre os alvos de ordem de prisão nesta quarta, está o respeitado colunista e cientista político Sahin Alpay, detido em sua casa pela manhã.

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    Líderes ocidentais e grupos de direitos humanos condenaram a tentativa de golpe que deixou 246 mortos e mais de 2.200 feridos, mas expressam temor com a reação, sugerindo que Erdogan esteja usando o ocorrido para reprimir oposição e ampliar poder.

    Na segunda (25), autoridades turcas haviam anunciado a prisão de 42 jornalistas.

    Erdogan acusa o clérigo Fethullah Gülen, em autoexílio nos EUA desde os anos 90, de criar um Estado paralelo e instigar o golpe de Estado, do qual Ancara alega terem participado setores militares. Gülen nega ter envolvimento.

    Nesta quarta, mais 1.684 militares foram exonerados. Desde a tentativa de golpe, o governo turco suspendeu ou deteve mais de 60 mil militares, juízes, policiais, professores e jornalistas acusados de ligação com Gülen.

    Sahin Alpay era colunista do "Zaman",maior jornal turco até ser interditado em março, ligado a Gülen. Mas Alpay era um conhecido ativista de esquerda, ex-integrante do CHP (principal partido de oposição secular turco) e sem relação clara com o clérigo.

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    CAÇA ÀS BRUXAS

    "Essas prisões são uma caça às bruxas, uma tentativa de criminalizar opiniões críticas ao governo", disse à Folha o turco Timur Kuran, professor de economia, ciência política e estudos islâmicos da Universidade Duke (EUA).

    "Alpay apenas trabalhava em um jornal ligado ao movimento de Gülen e simpatizava com as atividades de caridade do movimento [Hizmet, organização com atuação global inspirada pelo clérigo], não tem nenhuma ligação com terrorismo nem com tentativa de derrubar o governo."

    Alpay e os outros jornalistas foram presos pela divisão antiterrorismo do governo, acusados de "participação em organização terrorista" e "tentativa de dissolver o governo da republica turca".

    Segundo Kuran, há indícios de que o Hizmet, aliado a outros grupos, estaria envolvido na tentativa de golpe.

    "Mas a repressão que veio com o contragolpe, com a prisão de milhares de dissidentes, muitos dos quais não têm nada a ver com Gülen e são apenas opositores de direita ou esquerda, mostra que o governo buscava pretexto para prender pessoas."

    A organização Repórteres sem Fronteiras condenou as prisões. "Criticar o governo ou trabalhar para veículos de mídia que apoiam o movimento de Gülen não são prova de envolvimento no golpe fracassado", disse Johann Bihr, chefe do RSF para Europa do Leste e Ásia Central.

    "Se as autoridades não conseguirem apresentar indícios mais concretos, serão culpadas de perseguir as pessoas por causa das opiniões delas, e isso é inaceitável."

    A Turquia é o 151º dos 180 países no ranking de liberdade de imprensa no mundo.

    O jornalista Yavuz Baydar, que também está na mira do governo, saiu da Turquia e não pretende voltar enquanto vigorar o estado de emergência, a princípio em vigor por três meses. Com o decreto, os dias de prisão preventiva legal no país passaram de 4 para 30, e mais de 2.000 instituições foram dissolvidas, inclusive escolas.

    Baydar conversou com Alpay quatro dias atrás e disse estar preocupado, pois o colega tem 72 anos e problemas respiratórios. "Disse que ele deveria ir para a Grécia ou outro lugar esperar a situação acalmar. Ele me disse: estou muito velho para isso, vou esperar meu destino aqui."

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