Um mês após a tentativa de golpe de Estado, a Turquia deu continuidade nesta segunda-feira (15) a suas repetidas críticas e ameaças a líderes ocidentais.
Em entrevista publicada nesta segunda pelo jornal alemão "Bild", o ministro turco das Relações Exteriores afirmou que a União Europeia precisa garantir a isenção de visto a turcos em outubro. Caso contrário, o trato em relação ao fluxo de refugiados será deixado de lado, disse Mevlut Cavusoglu.
A cooperação da Turquia (membro da Otan, aliança militar ocidental) é fundamental à Europa em seus esforços para conter o fluxo de refugiados. Centenas de milhares têm buscado a entrada no bloco, fugindo de guerra ou pobreza em países como Síria e Afeganistão.
Havia sido acordado que, por sua ajuda, a Turquia receberia uma série de benefícios, incluindo financeiros. Há, no entanto, atrito em torno dessa ideia, com constante troca de acusações entre as partes envolvidas.
A Turquia tem repetidamente criticado líderes ocidentais, em especial europeus, pelo que entende como falta de apoio ao país após a crise política de julho.
O chanceler turco afirmou ao "Bild" que europeus "humilharam" o país, em vez de ajudá-lo. Anteriormente, o governo se havia dito "abandonado", e que faltava "empatia" à sua grave situação.
EXPURGO
A tentativa de golpe na Turquia em 15 de julho deixou mais de 240 mortos e deu largada ao extenso expurgo de milhares de suspeitos de relação com o ato.
O governo tem, no último mês, detido ou demitido militares, funcionários públicos e jornalistas. Na semana passada, o Ministério da Justiça afirmou que 16 mil haviam sido formalmente presos, enquanto outras 6.000 detenções eram processadas.
A polícia cumpria nesta segunda-feira 173 mandados de prisão a funcionários do Judiciário, incluindo juízes, pela suspeita de ligação com o clérigo opositor Fetullah Gülen, segundo agências de notícias.
Gülen é acusado por Erdogan, seu rival político, de ter organizado a tentativa frustrada de golpe. O clérigo, que nega a sua participação, vive hoje em exílio nos EUA.
O expurgo turco e sua legislação de combate ao terrorismo têm sido criticados pela liderança europeia, e são apontados como empecilhos para a isenção de vistos. A União Europeia já sinalizou que a medida não deve ser tomada neste ano.
Um dos temas mais delicados é a possibilidade de que o governo de Erdogan aprove o retorno da pena de morte. O presidente turco avalia a proposta, e afirmou que dependeria de voto no Parlamento. A pena de morte provavelmente impediria também o plano turco de ingressar na União Europeia.
Segundo Numan Kurtulmus, assessor do primeiro-ministro turco, o governo vai anunciar um novo decreto tendo em vista mais demissões nos ministérios do Interior e das Relações Exteriores. As medidas também vão atingir o Exército e a Guarda Costeira.
Hospitais militares, também de acordo com Kurtulmus, serão colocados sob o controle do Ministério da Saúde.
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O clérigo turco Fetullah Gülen em sua casa nos Estados Unidos, onde se autoexilou |
JORNALISMO
Afirmando não ter mais confiança no Judiciário do país, o editor-chefe de um dos principais jornais de oposição na Turquia anunciou sua renúncia nesta segunda. Can Dündar, do "Cumhuriyet", é acusado de ter revelado segredos de Estado.
Ele foi condenado em maio passado a quase seis anos de prisão, e esperava a conclusão do processo em liberdade. Acredita-se que ele esteja hoje na Alemanha.
Em uma coluna publicada no jornal, Dündar —que deve continuar a escrever artigos— denunciou um período "sem lei" no país na sequência da tentativa de golpe.
Editoria de Arte/Folhapress | ||