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    Sem contato entre motoristas, posto simboliza tensão na fronteira de Gaza

    DANIELA KRESCH
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM KEREM SHALOM

    05/09/2016 02h00

    O calor do verão não ajuda a aliviar o cotidiano do lugar mais quente na divisa entre Israel e a faixa de Gaza. Principal posto de passagem de produtos entre os dois lados, Kerem Shalom (sul de Israel) vive uma tensão diária .

    Passam por lá quase todas as importações do 1,8 milhão de moradores de Gaza após dez anos de restrições de Israel e do Egito às fronteiras devido à tomada de controle da região pelo grupo radical islâmico Hamas, em 2007.

    Daniela Kresch/Folhapress
    Caminhões palestinos buscam mercadoria no posto de controle de Kerem Shalom, na fronteira entre Israel e a faixa de Gaza.
    Caminhões palestinos buscam mercadoria no posto de controle de Kerem Shalom, na fronteira entre Israel e a faixa de Gaza.

    Kerem Shalom quer dizer, em hebraico, "jardim da paz", nome do kibutz (vilarejo comunitário) adjacente. Mas tranquilidade é a última sensação no local, rodeado de paredes de concreto, soldados armados, cães farejadores e abrigos antiaéreos.

    Uma média de 750 caminhões com 35 mil toneladas de produtos transita diariamente pelos portões, 85% deles levando mercadorias para Gaza e o restante fazendo o caminho inverso. Tudo é feito de modo que os motoristas israelenses e palestinos não entrem em contato entre si.

    Quando um caminhão israelense entra numa das 12 câmaras (rodeadas de muros de concreto), não há palestinos. Assim que o veículo descarrega e deixa a câmara, outro portão se abre para que uma carreta palestina entre e busque a carga.

    Ela só poderá viajar, no entanto, 400 metros por uma zona tampão entre os dois lados. Lá, descarregará novamente os produtos para que outro caminhão palestino leve a carga para dentro de Gaza.

    SEM VOLTA

    Diariamente, cerca de 75 caminhoneiros palestinos fazem esse monótono e curto percurso. Moram, na prática, no posto, já que não podem voltar para Gaza —o que os transformaria em perigoso aos olhos dos israelenses— nem entrar em Israel.

    "Os procedimentos limitam o risco para funcionários. Não se trata de um local agradável", diz Ami Shaked, diretor do posto de fronteira há oito anos. "Não tentamos construir relacionamentos. Quando você foi atacado centenas de vezes, confiança não é a primeira coisa em que você pensa."

    Editoria de ARte/Folhapress
    Onde fica posto de fronteira Kerem Shalom (Israel/ Gaza)
    Onde fica posto de fronteira Kerem Shalom (Israel/ Gaza)

    Kerem Shalom foi quase destruído duas vezes. A primeira em 2008, pelo Hamas. A segunda, em 2012, por terroristas egípcios da facção Estado Islâmico. Fora isso, milhares de projéteis de Gaza caíram nos 650 mil m² da passagem, na última década.

    Até 2007, Israel e Gaza dividiam cinco postos de fronteira. Depois que o Hamas tomou o poder, Israel deixou abertos apenas dois: Kerem Shalom para mercadorias e Erez para pessoas.

    Mas o entra e sai mais pesado de mercadorias para Gaza sempre foi feito através do posto de Rafah, entre Gaza e Egito. Em outubro de 2013, porém, o presidente egípcio, Abdel al-Sissi, inimigo do Hamas, fechou Rafah e destruiu os milhares de túneis subterrâneos para contrabando.

    Em consequência, a movimentação em Kerem Shalom explodiu. Em 2015, passaram por lá 140 mil caminhões com mercadorias para Gaza, o dobro de 2014. Só na primeira metade de 2016, transitaram 89 mil caminhões, o que aponta para novo aumento.

    As mercadorias vão de frutas, legumes e roupas a carros e vacas. As mais complicadas são as de "duplo uso": servem, segundo Israel, tanto para uso civil quanto para as bombas e túneis do Hamas, como químicos, cimento e ferragens. Cães farejaram recentemente quatro toneladas de cloreto de amônio (usado na produção de foguetes) disfarçados de sal de cozinha.

    Os moradores do lado israelense reclamam da passagem intensa de veículos numa região antes bucólica. O governo anunciou, em maio, a reabertura do cruzamento de Erez também para produtos.

    "Os materiais que entram por Kerem Shalom cobrem de 15% a 20% das necessidades. Mesmo com a reabertura de Erez, a situação econômica de Gaza continuará a mesma", disse Nazmi Muhanna, diretor-geral da administração de fronteiras da Autoridade Palestina, ao site Al Monitor.

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