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    Argentina cria centro de detenção para imigrantes ilegais

    LUCIANA DYNIEWICZ
    DE BUENOS AIRES

    15/09/2016 02h00

    Enquanto desenvolve um programa para receber refugiados sírios, o governo do presidente Mauricio Macri cria um centro de detenção para imigrantes em situação irregular na Argentina, adotando política considerada contraditória por entidades que recebem estrangeiros.

    O projeto revoltou membros dessas associações, pois a lei migratória argentina, aprovada no governo de Néstor Kirchner (2003-2007), é bastante flexível e prioriza a regularização do estrangeiro.

    Reprodução/Google Street View
    Prédio em Buenos Aires onde o governo argentino instalará prisão para imigrantes ilegais
    Prédio em Buenos Aires onde o governo argentino instalará prisão para imigrantes ilegais

    "Por um lado, o governo abre um canal para recepcionar os sírios, o que nos parece saudável, mas, por outro, cria uma prisão para combater a imigração ilegal. É um contrassenso", diz Diego Morales, diretor do Centro de Estudos Legais e Sociais.

    O governo cedeu no início deste mês um prédio em Buenos Aires, que antes era usado para detenção de menores infratores, para o Departamento de Imigração adaptar e receber estrangeiros.

    Até então, um imigrante detido ficava em uma delegacia, separado dos acusados de crimes. Ele só podia ser preso após o juiz expedir uma ordem de expulsão e não haver mais possibilidade de se recorrer.

    XENOFOBIA

    A lei não foi alterada, mas entidades de direitos humanos se dizem preocupadas com a possibilidade de a detenção acabar se tornando uma prática comum.

    "No decorrer deste ano, menos de 20 pessoas receberam ordem de expulsão. Em 2015, foram 50. Por que, então, ter uma prisão para isso?", questiona Morales.

    O colombiano Mauricio Viloria, do coletivo Mecopa, que recepciona seus compatriotas, avalia que há uma regressão na política migratória. "Antes, a expulsão era uma exceção. Agora, a criação do centro nos faz pensar que é a prioridade."

    A dominicana Patricia, que pediu para não ter o sobrenome revelado, vive há um ano em Buenos Aires sem documentação e diz estar "assustada" com o projeto de Macri.

    Ela deixou dois filhos em seu país e agora acha improvável conseguir trazê-los. "Se a mãe vai presa, o que acontecerá com as crianças?"

    Para Gabriela Liguori, coordenadora-geral da Comissão Argentina para Refugiados e Migrantes, a criação de um centro de detenção põe o imigrante como um criminoso e estimula a xenofobia.

    "Isso nos aproxima de modelos restritivos, como o americano e o europeu, que acabam violando direitos humanos", afirma.

    Liguori conta que, no governo antecessor, de Cristina Kirchner (2007-15), uma pessoa com ordem de expulsão dificilmente seria procurada pela polícia para que se cumprisse a determinação, permanecendo no país irregularmente. "Àquela época, também havia problemas graves. Quando um imigrante acabava detido, acontecia de ficar mais de 45 dias preso, o que é proibido."

    Para ela, o novo modelo não resolverá o problema e só concentrará os imigrantes em um local onde direitos humanos poderão ser violados.

    A Anistia Internacional publicou um comunicado em que desestimula a detenção de estrangeiros como forma de controle migratório. "Toda pessoa, incluindo migrantes e solicitantes de asilo, tem direito à liberdade, livre circulação e proteção antes de prisão e reclusão arbitrária."

    Procurado, o Ministério de Segurança não se pronunciou até a conclusão desta edição.

    Antes, a pasta havia publicado uma nota em que afirma que a polêmica em torno do assunto é "falsa" e que o centro para imigrantes dará "proteção e comodidade ao estrangeiro durante o período que anteceda sua partida ao seu lugar de origem."

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