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    'Venezuela nunca entrou no Mercosul', diz ex-embaixador do Brasil

    ISABEL FLECK
    DE SÃO PAULO

    15/09/2016 07h30

    Um dia depois de os países fundadores do Mercosul anunciarem a criação de uma presidência colegiada do bloco sem a Venezuela, o ex-embaixador do Brasil na Argentina (2002-2004) José Botafogo Gonçalves disse nesta quarta (14) que Caracas nunca chegou a entrar de fato no Mercosul.

    "Não estamos isolando a Venezuela. A Venezuela se isolou", disse Gonçalves, durante um debate na Fundação Fernando Henrique Cardoso. "A Venezuela nunca se tornou parte do Mercosul, nunca entrou no Mercosul."

    Boris Vergara - 5.ago.2016/Xinhua
    Militares venezuelanos hasteiam bandeira do Mercosul em Caracas para marcar presidência do bloco
    Militares venezuelanos hasteiam bandeira do Mercosul em Caracas para marcar presidência do bloco

    O diplomata, que foi designado em 2000 embaixador especial para assuntos do Mercosul por FHC, então presidente, lembrou que quando foi falar, à época, com o venezuelano Hugo Chávez, ouviu dele que sua intenção era integrar um bloco político –e não um mercado comum.

    "Chávez me puxou pelo braço e disse que gostaria de entrar para o 'Mercosul político'. Eu disse que isso não existia e ele ficou desapontado, porque acreditava que o Mercosul era uma instituição política e queria fazer parte dessa instituição. Muitos anos depois ele conseguiu entrar no bloco", lembrou Gonçalves.

    Para o embaixador, "foi um grande erro do Brasil, da Argentina e do Uruguai" (o Paraguai estava suspenso) aprovar a entrada de Caracas no bloco em 2012.

    "Estavam claros que os objetivos da Alba e dos bolivarianos são incompatíveis com o Tratado de Assunção [que criou o bloco]. O que está acontecendo agora é que essa contradição está clara para todos", afirmou.

    Como integrante do Mercosul, a Venezuela deveria ter assumido –pela ordem alfabética– a presidência rotativa do bloco em julho, depois do Uruguai. Brasil, Paraguai e Argentina, no entanto, se opuseram.

    O argumento do governo brasileiro, já sob Michel Temer, era de que Caracas precisaria cumprir com todas as suas obrigações tarifárias, comerciais e legais do Mercosul até agosto, prazo que fora definido em 2012, quando o país foi oficialmente aceito no bloco.

    Caracas está em falta com mais da metade de suas obrigações, mas isso não havia impedido o país de presidir o bloco em 2013.

    Agora, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai decidiram criar uma presidência colegiada até 1º de dezembro de 2016, que é quando vence o novo prazo para que a Venezuela cumpra todos os compromissos. Se não o fizer, será suspensa.

    DIÁLOGO INTERNO

    O sociólogo argentino Juan Gabriel Tokatlian, professor da Universidad Di Tella, disse, no mesmo evento, ter a impressão de que o Brasil e outros países da região "chegaram um pouco tarde na Venezuela".

    "Em um determinado momento, a oposição esperava do Brasil uma atitude mais proativa, e não a teve. Agora, o drama interno é tão grande e complexo que se o Brasil tirou ou não seu embaixador, não muda nada", disse.

    No último dia 31, o governo brasileiro convocou de volta a Brasília seu embaixador em Caracas, Ruy Pereira. A medida foi uma retaliação à dura reação venezuelana ao impeachment de Dilma Rousseff.

    No início deste ano, o Brasil vinha fazendo contatos com o governo e a oposição do país para tentar ajudar no diálogo interno e na solução da crise política. O processo, contudo, avançava a passos lentos. Agora, a situação se complica.

    "Agora é muito tarde para a diplomacia brasileira ter uma participação ativa nessa transição [venezuelana]", afirma Gonçalves.

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