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    Trump ofende Constituição, diz pai de militar muçulmano morto no Iraque

    MARCELO NINIO
    DE WASHINGTON

    18/09/2016 02h16

    O advogado Khizr Khan, 66, tem o hábito de sempre andar com uma cópia da Constituição dos EUA no bolso. Ao ser convidado para falar na convenção do Partido Democrata, em julho, ele não teve dúvidas de que a Constituição faria parte do seu discurso.

    Só não esperava que o gesto de puxar a cópia do bolso e questionar se o candidato republicano, Donald Trump, já tinha lido a Carta, tornaria-se um dos momentos mais marcantes da convenção. A repercussão cresceu com a reação de desdém de Trump.

    Robyn Beck/AFP
    Khizr Khan, whose son Humayun S. M. Khan was one of 14 US Muslims who died serving the United States in the ten years after 9/11 speaks during the final day of the 2016 Democratic National Convention on July 28, 2016, at the Wells Fargo Center in Philadelphia, Pennsylvania. / AFP PHOTO / Robyn BECK
    Os pais de Humayun Khan, morto no Iraque, discursam em convenção com foto do filho ao fundo

    Pai do soldado Humayun Khan, morto no Iraque em 2014, o advogado disse que sentiu a obrigação de usar seus três minutos de exposição nacional para mostrar que Trump não serve para ser presidente e ofende a Constituição com propostas como barrar muçulmanos no país.

    Muçulmano paquistanês, Khan emigrou para os EUA em 1980 e vive perto da capital americana. Leia trechos de sua entrevista à Folha.

    *

    Folha - Por que o sr. decidiu falar na convenção democrata?

    Khizr Khan - Eu poderia só ter agradecido a homenagem e falado do meu filho. Mas conversei com minha mulher e chegamos à conclusão de que era o momento de falar.

    O sr. já tinha ligações com o Partido Democrata?

    Não! Somos pessoas apolíticas. Já votamos nos dois partidos. Mas os ataques de Trump não pouparam ninguém. Crianças e adolescentes nascidos aqui vinham a mim, porque sabem que sou advogado, para perguntar: é verdade que seremos expulsos?

    Podemos terminar a escola? Durante meses, eu as consolei, dizendo que nada disso aconteceria, que há garantias na Constituição. Vinham crianças com lágrimas nos olhos. Essa foi minha motivação para falar sobre a Constituição.

    As pessoas me perguntam se eu faria de novo. Se uma única criança puder dormir sossegada e ir à escola sem se preocupar em ser expulsa do país, o esforço já valeu a pena.

    Trump recentemente suavizou o discurso sobre imigrantes e passou a cortejar as minorias. O que o sr. acha disso?

    É só discurso. Quando ele viu a reação dos muçulmanos e de outras minorias a suas palavras, ele suavizou o tom, mas isso não tem significado algum, porque ele não leva o assunto a sério.

    Como surgiu a ideia de mostrar a Constituição na convenção democrata? Que trecho específico tinha em mente?

    Normalmente tenho uma cópia da Constituição no meu bolso. Comecei a pensar em dizer a frase "o senhor leu a Constituição dos EUA?". No táxi, fiquei treinando como tiraria a cópia do bolso na hora do discurso.

    Quando cheguei, perguntei aos produtores se podia sacar a Constituição e dizer a frase. Eles se olharam e entenderam que seria um momento poderoso. Um deles tinha lágrimas nos olhos.

    Minha cópia está marcada em vários trechos. Um deles é a emenda 14, sessão 1: "proteção igualitária da lei", que cidadãos deste país não serão discriminados ou privados de liberdade e propriedade por causa de sua religião, sua raça, sua fé. Era isso que eu queria ressaltar, o quanto a retórica de Trump é totalmente contra a Constituição. Uma pessoa que não tem empatia nem consideração com as pessoas não pode ser líder.

    Trump diz que seria melhor presidente porque evitaria guerras como as que tiraram a vida do seu filho. Qual sua posição sobre a condução dos conflitos militares no governo de Barack Obama?

    Como um cidadão, meu entendimento é que o longo envolvimento militar no Oriente Médio não fez bem aos EUA. Temos total confiança no governo atual e em seu poder de decisão. Mas, como cidadão, acho que o quanto antes terminarmos nosso envolvimento, melhor.

    *Um dos comentários de Trump sobre o seu discurso foi que o foco deveria ser na luta contra o terrorismo islâmico. Como reage?*

    Nós rejeitamos toda violência, o terrorismo e qualquer ameaça aos EUA. Esta é a minha casa. Há gente cuidando da segurança deste país que não está falando em construir um muro ou banir pessoas. Esse é o mantra de um pequeno grupo de racistas.

    Segundo Trump, quem se alia à candidata democrata, Hillary Clinton, faz um "pacto com o diabo". O sr. esteve com ela?

    Não a encontrei, mas é fato que Hillary esteve sob o olhar público a vida inteira, como primeira-dama, depois senadora e secretária de Estado. Nós temos total confiança nela. Não hesito em dizer que a apoio. Ela é a mais qualificada. É uma eleição histórica, primeira mulher presidente.

    Acho que ela tem a solução para esse terrorismo que cresce entre nós, que é dar as mãos a todas as comunidades. Ela fala a todas, em vez de falar em muros e criar um ambiente de divisões raciais.

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