• Mundo

    Sunday, 05-May-2024 10:17:22 -03

    Trump orienta política externa pelo medo do eleitor, afirmam acadêmicos

    MAX FISHER
    AMANDA TAUB
    DO "NEW YORK TIMES"

    20/10/2016 02h00

    As propostas de política externa de Donald Trump, como forçar o México a pagar por um muro na fronteira ou sair da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte), atraíram condenações sem precedentes, como incoerentes, contraditórias e pouco realistas.

    No entanto, apesar das vaias que provocam por parte de especialistas, elas conquistam aplausos frequentes em seus comícios.

    Estudiosos de política norte-americana dizem que isso acontece porque Trump, o candidato presidencial republicano, está usando questões internacionais como um meio para se conectar com os medos e desejos mais profundos dos eleitores, uma abordagem que funciona precisamente porque sua agenda externa é bastante distante do tradicional.

    Uma olhada no reajuste geral que fez de um conjunto de questões revela muito sobre a ascensão improvável de Trump.

    Estudos mostram que a maioria dos eleitores colocam temas estrangeiros no final de sua lista de preocupações, mas ouvem e usam essas questões como uma janela através da qual julgam os valores e a ideologia dos candidatos.

    "Temos provas irrefutáveis de que os eleitores não sabem muito sobre detalhes de política externa", explicou Elizabeth N. Saunders, cientista política da Universidade George Washington.

    "As pessoas tendem a escolher o candidato de que elas gostam, em primeiro lugar", e depois adotam as opiniões daquele candidato como se fossem suas, acrescentou. "Assim é como as pessoas compreendem um mundo complicado."

    Todos os candidatos apresentam suas agendas políticas ao redor de valores mais simples, como força ou inclusão, ou com histórias de heróis e vilões, Saunders disse, "como uma forma de elaborar uma narrativa que possa ser seguida por eleitores que não acompanham detalhes".

    Isso é especialmente verdadeiro no caso de política externa, afirmou ela, por ser tão complexa.

    Trump parece ter revertido esse processo, ao começar com a narrativa e os valores que ele deseja transmitir, e depois conceber políticas para maximizar o efeito da sua mensagem.

    O resultado: a política exterior de Trump não tem nada de política exterior, senão que se trata de um veículo para alcançar os eleitores em nível puramente ideológico.

    Isso explica como Trump ganhou apoio, por exemplo, com as ameaças de sair da Otan, embora os eleitores tenham manifestado pouco interesse na renegociação da aliança e profissionais de política externa tenham avisado que a manobra correria o risco de um desastre.

    Paul Musgrave, professor de ciência política da Universidade de Massachusetts, resumiu a mensagem de Trump: "A Otan exige cooperação. A cooperação é algo que você faz se for fraco. Se você for forte, as pessoas te apoiam".

    Como política, isso é duvidoso. Mas é uma maneira poderosa de Trump se apresentar como alguém que vai tratar estrangeiros com suspeita e que vai perseguir ganhos econômicos de forma impiedosa. É uma mensagem embalada em política externa, mas que se destina a tocar preocupações mais domésticas.

    Colin Dueck, professor da Universidade George Mason, escreveu em um artigo recente que as visões de mundo de Trump requerem e oferecem "uma espécie de Fortress America (fortaleza Estados Unidos, um jogo de tabuleiro) ou talvez um gigantesco condomínio fechado, separado de perigos transnacionais de todos os tipos por uma série de muros".

    E quando Trump promete forçar o México a pagar por um muro gigante na fronteira ou adverte que os barcos iranianos serão "retirados da água a tiros" se seus marinheiros "fizerem gestos" a marinheiros norte-americanos, ele está comunicando que entende que aqueles que o apoiam se sentem com medo e humilhados, e que ele vai punir os responsáveis.

    Essa mensagem acabou por encontrar ressonância em um público surpreendentemente grande —mas de onde vem esse aparentemente novo eleitorado?

    Uma pesquisa publicada no final do primeiro semestre por um grupo de cientistas sociais, liderada por Brian C. Rathbun, da Universidade do Sul da Califórnia, sugere uma resposta: Trump aproveitou o que os estudiosos chamam de valores de conservação.

    Pessoas que detêm esses valores priorizam a segurança e a tradição. Também tendem a temer ameaças físicas e pessoas que veem como estranhos, quer estrangeiros ou pessoas de diferentes raças ou religiões.

    E elas muitas vezes expressam esses valores como um conjunto específico de pontos de vista "linha-dura" em política externa.

    Tradução de DENISE MOTA

    Edição impressa
    [an error occurred while processing this directive]

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024