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    a morte de fidel

    Preso, Dirceu envia carta em homenagem a Fidel Castro

    BELA MEGALE
    DE BRASÍLIA

    04/12/2016 02h00

    Alan Marques - 27.set.03/Folhapress
    O então presidente Lula (à esq.), Fidel Castro (centro) e José Dirceu (à dir.) durante visita oficial a Havana (Cuba), em 2003
    O então presidente Lula (à esq.), Fidel Castro (centro) e José Dirceu (à dir.) durante visita oficial a Havana (Cuba), em 2003

    "Acabo de saber da morte de Fidel. São 9h15 de sábado. Ontem, dia de visitas aqui no Complexo Médico Penal, eu pedia para que transmitissem a amigos meus cumprimentos pelos seus 90 anos celebrados em 13 de agosto, o que não pude fazê-lo pessoalmente por estar preso."

    É assim que ex-ministro José Dirceu, preso pela Lava Jato há um ano e quatro meses, inicia a carta que deve ser entregue neste final de semana a Raúl Castro, irmão de Fidel e presidente de Cuba, pelo escritor Fernando Morais.

    Morais integra a comitiva formada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pela ex-presidente Dilma Rousseff que viajou ao país para participar do funeral do cubano, morto no sábado (26).

    A amizade dos dois começou há mais de 40 anos, quando Dirceu chegou a Cuba como um do presos políticos trocados pelo embaixador americano Charles Burke Elbrick, sequestrado em 1969.

    Lá, Dirceu fez plástica no rosto para despistar a polícia e voltou pela primeira vez ao Brasil dois anos depois. O plano fracassou, e ele retornou à ilha até voltar definitivamente ao Brasil em 1975.

    "Tive, já em 1969, ao chegar a Cuba, a surpresa de encontrá-lo pela primeira vez", escreveu o ex-ministro.

    "Jovial, alegre e emocionado, foi nos dar as boas-vindas e nos prestar solidariedade. Chegávamos a Cuba vindos do México, para onde fomos ao sair das prisões da ditadura brasileira trocados pelo embaixador norte-americano. Foi o primeiro de muitos encontros durante minha vida em Cuba e, depois, como petista, deputado, ministro e, por fim, ex-ministro e de novo perseguido e exilado dentro do meu próprio país."

    Dirceu exaltou "a solidariedade e apoio" de Fidel, que "se manifestou em sua plenitude", não quando estava no governo, mas quando mais necessitava.

    "De novo banido e caluniado nos anos do mensalão e também depois da minha condenação e prisão em 2013. Anos de infâmia, quando Fidel e Cuba continuaram solidários".

    Na carta, ele não poupa elogios a Fidel, descrito como "um líder revolucionário e estadista, que colocou Cuba e seu povo na história do século 20". Classificou-o como herdeiro dos grandes heróis da América Latina José Martí e Simón Bolívar.

    Dirceu se despediu como "Daniel", nome pelo qual Fidel o chamava até seus últimos dias e que foi usado pelo petista em Cuba na época em que foi perseguido pela ditadura militar.

    LEIA A ÍNTEGRA DA CARTA DE JOSÉ DIRCEU

    José Dirceu se despede de Fidel

    Acabo de saber da morte de Fidel. São 9h15 da manhã de sábado. Ontem, dia de visitas aqui no Complexo Médico Penal, eu pedia para que transmitissem a amigos meus cumprimentos pelos seus 90 anos celebrados em 13 de agosto, o que não pude fazê-lo pessoalmente por estar preso.

    Coincidentemente, hoje, recebo a triste e infelizmente esperada notícia, já que Fidel vivera e sobrevivera a uma longa enfermidade. Não só lutou contra ela e resistiu, mas passou por essa longa jornada sempre trabalhando e lutando, escrevendo e estudando, pesquisando e recebendo os companheiros de luta de todo o mundo.

    Fidel era um sobrevivente de inúmeros atentados e tentativas de assassinato, hoje comprovadas pelos próprios documentos oficiais do governo dos Estados Unidos - da luta estudantil, do ataque a Moncada, do desembarque do "Granma", da guerrilha e, depois, vencendo a batalha de Girón e enfrentando a longa luta para consolidar a revolução nos anos 60/70.

    Um líder revolucionário e estadista, colocou Cuba e seu povo na história do século 20. Participou e foi protagonista, mesmo governando uma ilha de 100 mil km² e 10 milhões de habitantes, de todos os grandes acontecimentos mundiais e esteve presente em todas as grandes lutas de independência e contra as ditaduras nas décadas de 60, 70 e 80, na América Latina e na África.

    Enfrentou e não se rendeu à maior potência do mundo, os Estados Unidos da América.

    Como ninguém, encarou a aspiração do povo cubano e latino-americano à independência e à soberania, seguindo a herança do pai de Cuba, José Martí, e dos grandes da América Latina, como Bolívar. Foi um símbolo de esperança e fonte de inspiração para os pobres, deserdados, explorados e oprimidos de todo o mundo.

    Tive, já em 1969, ao chegar a Cuba, a surpresa de encontrá-lo pela primeira vez. Jovial, alegre e emocionado, foi nos dar as boas-vindas e nos prestar solidariedade. Chegávamos a Cuba vindos do México, para onde fomos ao sair das prisões da ditadura brasileira trocados pelo embaixador norte-americano. Foi o primeiro de muitos encontros durante minha vida em Cuba e, depois, como petista, deputado, ministro e, por fim, ex-ministro e de novo perseguido e exilado dentro do meu próprio país.

    Nunca me faltou com a solidariedade e apoio - ele e Cuba - e se manifestou em sua plenitude, não quando eu estava no governo, e sim sempre quando eu mais necessitava - de novo banido e caluniado nos anos do mensalão e também depois da minha condenação e prisão em 2013. Anos de infâmia, quando Fidel e Cuba continuaram solidários.

    Ao tomar posse como ministro, em 2003, agradeci em meu discurso a solidariedade do povo cubano e seu líder Fidel Castro durante a ditadura. Hoje rendo minha humilde homenagem ao comandante e ao herói do povo de Cuba. Presto minhas condolências ao povo e ao governo de Cuba e me despeço de Fidel sem poder estar em Havana para fazê-lo pessoalmente, assinando com o nome que recebi quando os perigos e as ameaças da ditadura e seu tutor, os Estados Unidos, nos obrigavam a usar pseudônimos.

    Daniel

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