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    Taiwan está feliz e nervosa com os comentários de Trump sobre a China

    JAVIER C. HERNÁNDEZ
    AMY QIN
    DO "NEW YORK TIMES, DE TAIPEI, EM TAIWAN

    16/12/2016 09h29

    Lin Fei-fan liderou o ataque três anos atrás quando centenas de estudantes ocuparam o órgão legislativo de Taiwan em protesto contra um acordo comercial com a China. Com a economia da ilha cada vez mais ligada à do continente, e a influência global de Pequim em ascensão, ele temia que a independência de Taiwan estivesse em jogo –e talvez fosse uma causa perdida.

    Agora, graças a algumas frases proferidas por Donald Trump em um programa de entrevistas, Lin tem novas esperanças.

    O presidente-eleito dos EUA surpreendeu o mundo no domingo (11) ao sugerir que poderia abandonar o princípio de "Uma China", o acordo básico pelo qual os EUA estabeleceram relações com Pequim e cortaram os laços oficiais com Taiwan, há quase 40 anos. Sua aparente disposição a repensar uma antiga política americana que dá prioridade à China sobre Taiwan entusiasmou Lin, 28, e muitos como ele.

    Divulgação - 3.dez.2016/Reuters
    A presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, fala com Trump pelo telefone
    A presidente de Taiwan, Tsai Ing-wen, fala com Trump pelo telefone

    Mas também os deixou ansiosos, perguntando-se o que significa ter seu país colocado sobre a mesa por Trump, um negociante inveterado, em tratativas com os líderes comunistas da China, que não são conhecidos por fazer concessões facilmente?

    "Muitas pessoas em Taiwan temem que quando Trump assumir o cargo ele dê meia volta", disse Lin. "Desconfiamos de suas motivações."

    Embora tenha valorizado a posição de Taiwan ao falar pelo telefone com sua presidente, Trump deixou a impressão de que vê a ilha basicamente como uma alavanca para extrair compromissos da China sobre outras questões.

    "Não sei por que temos de ser limitados pela política de 'Uma China', a menos que façamos um acordo com a China relativo a outras coisas, incluindo comércio", disse ele antes de citar a escalada militar de Pequim no disputado mar do Sul da China e seu apoio à Coreia do Norte.

    Desde que Richard Nixon viajou a Pequim em 1972 para apresentar a perspectiva de abandonar Taiwan, um líder americano não tentava de modo tão explícito usá-la como moeda de troca com a China, que considera a ilha autogovernada de 23 milhões de habitantes uma parte do território chinês.

    A manobra ao mesmo tempo entusiasmou e irritou a população de Taiwan, que deseja maior reconhecimento internacional, mas há muito teme ser sacrificada como um peão no tabuleiro político.

    Muitos aplaudiram a posição de Trump, descrevendo sua decisão de romper o protocolo e falar por telefone com Tsai Ing-wen, a líder de Taiwan, como um gesto atrasado em direção a um dos amigos mais confiáveis de Washington na Ásia e uma jovem democracia. Taiwan é o nono parceiro comercial dos EUA e comprou mais de US$ 46 bilhões em armas americanas desde 1990.

    Mas a população também está enfrentando a realidade de que seu mais firme defensor no palco mundial hoje é um empresário conhecido por seu amor pelos negócios e sua abordagem errática da política.

    "Ele é uma força incontrolável", disse Hsu Tse-mei, 57, um gerente de banco aposentado em Taipei. "Fomos apanhados entre dois países poderosos, a China e os EUA, e estamos à mercê de Trump."

    As apostas são altas e ajudam a explicar por que os antecessores de Trump geralmente deixaram intocada a política de Uma China.

    Desde que o governo nacionalista de Chiang Kai-shek fugiu para Taiwan em 1949, depois da revolução comunista, gerações de líderes chineses prometeram reunificar a ilha com o continente e ameaçaram guerra para evitar que ela declarasse independência. Em meados dos anos 1990, a China disparou mísseis em águas ao largo de Taiwan em uma tentativa de intimidar apoiadores de uma separação formal.

    Quando os EUA estabeleceram relações com a China em 1979, abandonando seu reconhecimento oficial do Kuomintang, o governo nacionalista de Taiwan, eles garantiram uma promessa de Pequim de que sua "política fundamental" seria perseguir a reunificação por meios pacíficos.

    Muitos em Taiwan hoje temem que a China possa reconsiderar esse compromisso se Trump desprezar a política de Uma China.

    "Estou preocupado que a China possa tomar medidas militares contra Taiwan", disse Li Meng-chieh, 33, um designer gráfico de Taipei. "Se isso acontecer, vai atrapalhar nosso atual modo de vida."

    Tais preocupações se estendem aos apoiadores de Tsai, cujo Partido Democrático Progressista há muito favorece uma maior independência do continente e tradicionalmente se dispõe a aceitar maiores riscos para conseguir isso.

    O governo de Tsai afirmou repetidamente à China seu desejo de manter a situação atual, e Lo Chih-cheng, um legislador de seu partido, disse que as autoridades de Taiwan evitaram dar muita importância ao telefonema com Trump para não criar antagonismo com Pequim.

    "Nós tentamos nos comportar", disse Lo. "Mas obviamente a China não estava contente, por isso escolheu Taiwan para culpar. Eles usaram Taiwan como bode-expiatório para desviar a atenção do descontentamento interno."

    Jason Hu, um vice-presidente do Partido Nacionalista, de oposição, disse que o entusiasmo inicial sobre o telefonema se transformou em arrependimento. "É um jogo de grandes potências no qual Taiwan não deve se envolver", disse.

    Tradução de Luiz Roberto Gonçalves

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