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    Catalunha une Natal e política em tradição de bonecos defecando

    DIOGO BERCITO
    DE MADRI

    25/12/2016 02h00

    Josep Lago - 4.nov.2016/AFP
    Caganers' de Donald Trump e de Hillary Clinton são expostos em fábrica na Catalunha
    'Caganers' de Donald Trump e de Hillary Clinton são expostos em fábrica na Catalunha

    Natal e política são comemorados, no nordeste da Espanha, de cócoras. Fazendo cocô. A versão catalã do presépio inclui um personagem adicional: o "caganer".

    A estátua agachada, em posição fecal, é uma tradição centenária nessa região. Mas, nas últimas décadas, tem se tornado também um termômetro da política.

    Há versões do personagem com os traços do premiê espanhol, Mariano Rajoy, por exemplo, ou do americano Barack Obama. Lula e Dilma também já foram homenageados pela tradição catalã quando estavam no poder.

    Todos os anos novas variações são incluídas ao catálogo. Este Natal trouxe os caganers dos americanos Hillary Clinton e Donald Trump. Marine Le Pen, da extrema-direita francesa, também agacha agora no presépio.

    A tradição começou no final do século 18, conta à Folha Xavier Borrell, presidente da Associação dos Amigos do Caganer, cujos 75 sócios entregam anualmente o prêmio "caganer do ano" a personalidades culturais.

    O personagem defecando não é um desrespeito ao presépio. A figura é interpretada como fertilizadora da terra e portadora de sorte ao lar.

    Mas, em todo o caso, Borrell alerta: é preciso colocar o caganer onde não possa ser visto pelo menino Jesus em sua manjedoura. "É uma celebração religiosa", explica.

    O caganer não surgiu ligado à política. Mas, nos anos 1960, uma corrente feminista incluiu mulheres entre os agachados. Nos anos 2000, vieram os jogadores de futebol e os políticos. "Há um esforço para vender mais", diz.

    "Normalmente os políticos catalãos se orgulham de dizer que têm seus próprios caganers", afirma. É sinal de que são tão importantes a ponto de participar do Natal.

    CHEIO DE GRAÇA
    Há uma década, a pesquisadora alemã Linda Wormsbecher passou um ano estudando em Barcelona. "O caganer não saía da minha cabeça, então decidi dedicar minha tese a ele", diz. "Ele tem graça e franqueza."

    Uma das teorias de Wormsbecher é que a estatueta serve de reforço à identidade cultural da Catalunha –a região, fronteiriça com a França, tenta separar-se do restante do país.

    "Para estabelecer uma identidade cultural é preciso encontrar símbolos próprios e distintos. O caganer serve muito bem como demarcador para estabelecer o que é tipicamente catalão."

    A tradição está relacionada à terra e aos camponeses, razão pela qual aficionados do caganer criticam as variações com rostos de políticos.

    Mas a versão contemporânea já está enraizada. Uma das principais lojas tem um extenso catálogo disponível pela internet, de Che Guevara a membros do partido espanhol de esquerda Podemos, recentemente surgido.
    "O caganer serve hoje como maneira de comentário humorístico da atualidade política e social", afirma.

    TRONCO
    O caganer não é a única figura natalina ligada às fezes na Catalunha. Celebra-se também o "caga tió", um tronco de madeira "alimentado" a partir de 8 de dezembro e coberto com uma mantinha. Crianças o espancam durante o Natal até que ele "defeque" guloseimas.

    Para além da óbvia escatologia, o caganer e o caga tió são queridos entre crianças.

    "Esse caráter lúdico une os dois elementos e pode ser uma das causas de seu surgimento e popularidade", diz Wormsbecher. "Todas as crianças se encantam em ver os outros seres defecando."

    Raymond Roig /AFP
    Caganer' de Marine Le Pen, da extrema direita francesa
    'Caganer' de Marine Le Pen, da extrema direita francesa
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