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    ANÁLISE

    O epitáfio para a tese de dois Estados na questão palestina

    CLÓVIS ROSSI
    COLUNISTA DA FOLHA

    15/02/2017 16h41

    Pablo Martinez Monsivais/Associated Press
    O premiê israelense, Binyamin Netanyahu, e o presidente americano, Donald Trump, na Casa Branca
    O premiê israelense, Binyamin Netanyahu, e o presidente americano, Donald Trump, na Casa Branca

    A visita de Binyamin Netanyahu a Washington nesta quarta-feira (15) serviu basicamente como epitáfio para a tese, universalmente aceita até agora, de que a solução para o eterno conflito Israel/palestinos é a criação de dois Estados, um para cada lado.

    Primeiro, o presidente Donald Trump fugiu de uma defesa dessa tese que há 20 anos é um dogma da diplomacia americana. Disse que, para ele, tanto faz um ou dois Estados, desde que os dois lados estejam de acordo com a solução encontrada.

    Na véspera, fonte não identificada do governo dissera ao "New York Times" que o novo governo americano mudaria a linha histórica e não incluiria o termo "dois Estados" em seus esforços pela paz, ainda por começarem.

    A entrevista coletiva que os dois governantes deram, em conjunto, seria, portanto, a oportunidade de ouro para desmentir essa hipótese.

    Ao não haver o desmentido, prevalece a informação do "Times".

    Segundo, Netanyahu também fugiu a uma defesa dos "dois Estados", que ainda é oficialmente a posição do próprio governo israelense.

    Preferiu dizer que essa é uma questão "de rótulo" e não de conteúdo. Ao definir o conteúdo, cravou duas condições que claramente inviabilizam um Estado palestino.

    Primeiro, ao dizer que, assim como chinês é quem é da China, judeu é quem é da "Judeia", a designação que os judeus aplicam, juntamente como Samaria, para o que os palestinos —e a comunidade internacional— chamam de Cisjordânia.

    A Cisjordânia seria o fulcro de qualquer Estado palestino, de preferência conectada com a faixa de Gaza.

    Depois, o premiê israelense disse que qualquer acordo de paz só é aceitável se garantir a Israel o controle total da segurança na margem ocidental do rio Jordão, de maioria palestina.

    É improvável que um Estado abdique do controle de sua segurança em favor de outro, ainda mais com a carga de ódio acumulada de parte a parte há séculos.

    O crescente avanço da tese de um só Estado é tamanho que até o principal negociador palestino, Saeb Erekat, tocou no assunto na terça-feira (14). Disse que o plano de um só Estado de Netanyahu significa apartheid (para os palestinos).

    Acrescentou: "A única alternativa a dois Estados soberanos e democráticos é um Estado secular e democrático, com direitos iguais para todos, cristãos, muçulmanos e judeus".

    É uma alternativa que não passa pela cabeça de nenhuma liderança judaica. Direitos iguais para todos significaria, a médio prazo, que os palestinos acabariam governando porque têm maior taxa de natalidade e, portanto, logo seriam a maioria.

    Ou seja, Israel teria que abdicar ou de seu caráter judeu ou de sua democracia.

    É essa discussão que vai ganhar fôlego a partir do epitáfio dos dois Estados assinado na quarta-feira.

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