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    Governo Trump

    Sistema de imigração por mérito de Trump esbarra em perfil migratório

    ISABEL FLECK
    DE WASHINGTON

    05/03/2017 02h00

    Um sistema de imigração baseado no mérito, que beneficia quem tem melhor qualificação profissional, parece ter se tornado a nova obsessão de Donald Trump.

    Em seu discurso ao Congresso na terça (28), ele defendeu uma reforma migratória que leve o país a uma política como as adotadas no Canadá e na Austrália. Na sexta (3), voltou a dizer que o sistema baseado no mérito "é o caminho a ser seguido".

    Jim Watson - 15.fev.2017/AFP
    Mexicanos entram para trabalhar em lavouras; eles não seriam permitidos pela nova regra migratória
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    No entanto, a aplicação nos EUA de um modelo que considera itens como nível educacional, habilidade com o idioma, experiência de trabalho, idade e laços com o país na hora de conceder a residência permanente é vista com cautela por especialistas e entidades do setor.

    Ainda mais num cenário de endurecimento das regras do Departamento de Segurança Doméstica, que colocou como prioridade para deportação imigrantes ilegais que tenham cometido qualquer tipo de crime e que permite a expulsão rápida de quem está nos EUA há menos de dois anos.

    Total de residentes permanentes admitidos nos EUA -

    Motivo do pedido de residência - Em %

    Perfil do imigrante que obtém residência nos EUA (2015) - Em %

    Perfil do imigrante que obtém residência nos EUA (2015) - Por idade, em %

    Perfil do imigrante que obtém residência nos EUA (2015) - Por ocupação, em %

    DENTRO DA CATEGORIA NÃO TRABALHAM - Em %

    Estima-se que 11 milhões de estrangeiros irregulares vivam nos EUA hoje. Em 2015, 1 milhão de pessoas receberam o green card. Destes, 64,6% obtiveram residência permanente por já terem parentes no país, e apenas 13,7% por razões profissionais.

    No Canadá e na Austrália, a lógica é inversa —e a demanda muito menor. No primeiro, 272 mil pessoas receberam a residência permanente, dos quais 62,7% por motivos profissionais. Na Austrália, 67,7% dos 190 mil beneficiados também conseguiram o status com base nas habilidades de trabalho.

    Dos que obtiveram o green card nos EUA, 43% não tinham um emprego em seu país de origem. Segundo um levantamento do Pew Research Center, apenas 41% dos imigrantes que chegaram entre 2010 e 2015 ao país tinham um diploma de graduação.

    "O meu medo é que eles mantenham o foco sobre uma parcela relativamente pequena de imigrantes e cortem o número maior", diz Tamar Jacoby, presidente da organização ImmigrationWorks USA, que assessora republicanos em temas de imigração. "Acho que a intenção, quando o governo fala desse sistema, é trazer menos gente."

    Para democratas e críticos, a proposta de Trump serviria justamente para camuflar uma tentativa de barrar a chegada de imigrantes de países mais pobres —em geral, latinos. O sistema do Canadá, em parte copiado pela Austrália, se baseia numa pontuação, atribuída a partir da análise de currículo e provas, como de fluência no idioma.

    Na sexta, Trump recomendou o livro "Green Card Warrior" (guerreiro do green card), de Nick Adams, um australiano que imigrou para os EUA em 2016, e que diz, em sua biografia, ter sido aceito no país por sua "habilidade extraordinária".

    Em entrevista à Fox News na sexta, o imigrante defendeu que é preciso assegurar que "só os melhores" possam entrar no país.

    Para Julia Gelatt, do Instituto de Política Migratória, usar esse tipo de sistema para excluir imigrantes com pouca formação seria prejudicial ao próprio país, que precisa dessa mão de obra.

    "Sem o imigrante com menor nível de educação, é possível que alguns tipos de indústria não consigam competir com concorrentes estrangeiros e acabem levando suas fábricas para fora do país."

    Gelatt destaca, inclusive, que o Canadá também teve de rever seu sistema quando houve inchaço de trabalhadores com boa qualificação e não havia mão de obra para subempregos.

    Em 2002, o país criou uma categoria temporária de visto para trabalhadores menos qualificados. "Os EUA vão ter de achar algo similar se forem mudar para um sistema puramente baseado no mérito", diz.

    Para Howard Chang, da Universidade da Pensilvânia, um modelo baseado no mérito poderia ser aplicado nos EUA, como o que passou pelo Senado em 2013, que previa também visto aos menos qualificados.

    "E esse visto não previa acesso a benefícios oferecidos a imigrantes ou americanos", diz, rebatendo o argumento de Trump de que os imigrantes sobrecarregam o sistema público.

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