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    Irlanda faz ofensiva diplomática junto à UE para ser lembrada no 'brexit'

    DO "FINANCIAL TIMES"

    06/04/2017 11h00

    O primeiro-ministro da Irlanda, Enda Kenny, vai se reunir com a chanceler alemã Angela Merkel nesta quinta-feira (6). Será o ponto culminante de uma campanha diplomática, talvez a mais intensa já empreendida pelos irlandeses, com o objetivo de informar os parceiros europeus do país sobre o impacto do "brexit" sobre a Irlanda.

    E a campanha parece ter encontrado sucesso, pelo menos até agora. Os irlandeses talvez jamais venham a gostar do "brexit", mas podem estar começando a desgostar dele um pouquinho menos.

    Darrin Zammit Lupi - 30.mar.2017/Reuters
    O premiê irlandês, Enda Kenny, fala em cúpula da União Europeia na ilha de Malta, em março
    O premiê irlandês, Enda Kenny, fala em cúpula da União Europeia na ilha de Malta, em março

    Theresa May, a primeira-ministra do Reino Unido, se referiu ao "relacionamento único" entre seu país e a Irlanda na carta que enviou a Donald Tusk para invocar o Artigo 50 do Tratado de Lisboa da União Europeia.

    Ao delinear os princípios de negociação da UE, Tusk afirmou que a união buscaria "soluções flexíveis e criativas com o objetivo de evitar a criação de uma fronteira rígida" na ilha da Irlanda.

    Michel Barnier, o principal negociador da União Europeia, disse que ficaria "especialmente atento" ao impacto sobre a Irlanda do Norte da saída britânica da união alfandegária europeia.

    E o Parlamento Europeu aprovou nesta quarta-feira (5) uma resolução que, entre outras coisas, "reconhece a posição única e as circunstâncias especiais enfrentadas pela ilha da Irlanda". Nenhum outro Estado europeu recebeu qualquer consideração especial.

    E ao contrário da concessão da União Europeia à Espanha com relação a Gibraltar, a realização irlandesa até agora não despertou rumores de guerra. "Nossas principais preocupações foram reconhecidas e compreendidas", disse Kenny na quarta-feira.

    Charlie Flanagan, o ministro do Exterior irlandês, disse: "Estou encorajado com o nível de compreensão encontrado até agora [na União Europeia] quanto ao nosso relacionamento único com o Reino Unido".

    A situação melhorou, se comparada ao desânimo generalizado das autoridades irlandesas quando o "brexit" foi votado.

    Kenny se reuniu com Merkel dias depois da votação, mas seu apelo pelo tratamento da Irlanda como "caso especial" parecia ter passado sem resposta.

    Agora, depois de uma campanha de lobby de escopo inédito envolvendo um reforço da representação diplomática irlandesa em algumas importantes capitais europeias e uma busca de laços bilaterais mais estreitos, a voz irlandesa na União Europeia, quase sempre inaudível, parece estar sendo ouvida com mais clareza.

    "Houve lobby bastante intenso, aconteceram muitas viagens e muitas conversas oficiais e extraoficiais com pessoas de toda a União Europeia", disse Daithi O'Ceallaigh, antigo embaixador irlandês em Londres.

    OFENSIVA

    O governo irlandês tinha quatro objetivos em sua ofensiva diplomática. Queria minimizar o impacto do "brexit" sobre o comércio entre a Irlanda e o Reino Unido, que movimenta 1,2 bilhão de euros por semana; preservar a Área Comum de Viagem, um acordo bilateral quase secular que na prática confere aos cidadãos irlandeses moradores do Reino Unido os mesmos direitos dos cidadãos britânicos; evitar uma "fronteira rígida"; e preservar os ganhos conquistados com o processo de paz na Irlanda do Norte.

    "Creio que a União Europeia compreende a posição especial da Irlanda e que exista alguma simpatia por ela", disse um diplomata estrangeiro que serve em Dublin.

    Mas o sucesso do governo em obter reconhecimento quanto às preocupações específicas da Irlanda sobre o "brexit" foi tratado com algum ceticismo em Dublin.

    A referência de May ao "relacionamento único" entre Reino Unido e Irlanda provocou uma resposta do jornal "Irish Times" na forma de um editorial intitulado "nossa, obrigado".

    O Sinn Féin, o partido nacionalista de oposição, se queixou de que as promessas de Tusk são indefinidas demais para que valham grande coisa, e que são menos firmes do que a resolução do Parlamento Europeu.

    "O governo irlandês claramente não passou em seu primeiro grande teste quanto ao 'brexit'", disse Matt Carthy, parlamentar do Sinn Féin.

    Mesmo assim, o exercício diplomático pode empolgar os diplomatas e políticos da Irlanda. Kenny disse ao Parlamento irlandês no começo da semana que o lobby "também nos permitiu adquirir conhecimento útil sobre os objetivos dos demais parceiros, e que considerássemos de mais perto potenciais alianças, para as negociações e possivelmente para o futuro".

    As autoridades de Dublin acautelaram, porém, que a invocação do Artigo 50 era só o começo do processo do "brexit".

    "O fato de que tudo isso tenha sido reconhecido pelo presidente do Conselho Europeu, pelo Parlamento Europeu e pelo negociador-chefe, bem como pelo Reino Unido, não significa que uma solução que satisfará a nós e a todo mundo mais será encontrada, ou encontrada rapidamente", disse O'Ceallaigh.

    Tradução de PAULO MIGLIACCI

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