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    ANÁLISE

    Rui o sonho de um enlace islã/democracia

    CLÓVIS ROSSI
    COLUNISTA DA FOLHA

    16/04/2017 18h18

    Ozan Kose/AFP
    TOPSHOT - Turkish President Recep Tayyip Erdogan (R) casts his vote accompanied by his wife Emine Erdogan (3rd R) and their grandchildren during the referendum on expanding the powers of the president at a polling station in the Uskudar district of Istanbul, on April 16, 2017. Erdogan said the tightly-contested referendum on expanding the powers of the head of state was a vote for the future of Turkey. The first polling stations opened in the tightly contested referendum on expanding the powers of the president, seen as a crossroads in the modern history of the country. / AFP PHOTO / OZAN KOSE
    O presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, vota acompanhado da mulher, Emine, e o neto

    Ruiu com o plebiscito deste domingo (16) o sonho de que a Turquia de Recep Tayyp Erdogan, no poder desde 2003, pudesse promover o casamento entre islamismo e democracia.

    Um partido islamista (o AKP, sigla turca para Partido Justiça e Desenvolvimento) continua no poder, mas a reforma constitucional aprovada pelo voto passa longe de estabelecer uma democracia plena.

    A melhor análise do que resultará do modelo de presidência executiva referendado pelo eleitorado é a ironia de Asli Aydıntasbas, do Conselho Europeu de Relações Exteriores: "O modelo de governo passa de um sistema parlamentar para uma presidência executiva no estilo dos Estados Unidos –menos a Suprema Corte e o Congresso".

    De fato, o novo sistema elimina os pesos e contrapesos que são a característica essencial da democracia.

    Há algum exagero nessa análise, mas não muita. O Parlamento continua existindo e nele continuam representados partidos oposicionistas, para não mencionar o fato de que a estreita margem da vitória do "sim" indica uma forte resistência social ao autoritarismo.

    De qualquer forma, o poder do Parlamento é consideravelmente recortado e passa a ser concentrado na Presidência.

    O caso do Judiciário é ainda mais eloquente: hoje, o presidente aponta apenas 4 dos 22 membros do mais importante corpo judicial, o Alto Conselho de Juízes e Procuradores.

    A emenda agora aprovada reduz o número de membros e permite que Erdogan e seus aliados no Parlamento apontem todos eles.

    Acrescente-se a esses dados o fato de que Erdogan praticamente eliminou a mídia independente –e tem-se de fato o cenário do que a revista "The Economist", na capa do número que está nas bancas, define como "democracia iliberal".

    Na prática, esse modelo pouco democrático já estava em vigor antes do plebiscito. Desde que assumiu, em 2014, Erdogan atuou como presidente executivo –e não como o presidente mais cerimonial que é desenhado pela Constituição vigente.

    Tornou-se ainda mais "iliberal" depois do fracassado golpe de 2016, promovendo um formidável expurgo de opositores e/ou independentes, nos órgãos de governo, nas Forças Armadas, na academia e no jornalismo (160 órgãos de imprensa foram fechados desde então e 120 jornalistas estão na cadeia).

    A legalização, via plebiscito, de uma "democracia iliberal" torna praticamente impossível que a Turquia possa ser aceita pela União Europeia, com a qual negocia a adesão desde 1999.

    "É o fim da história europeia da Turquia", decreta, por exemplo, Fabrizio Tassinari, do Instituto Dinamarquês para Estudos Internacionais.

    Não parece ser um problema para Erdogan, a julgar pelos ataques verbais que dirigiu a países europeus, durante a campanha para o plebiscito.

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