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    ANÁLISE

    França pode importar 'terceira via' na política com 20 anos de atraso

    ROGÉRIO ORTEGA
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

    30/04/2017 02h01

    Bob Edme/Associated Press
    Apoiadora de Macron cola cartaz do centrista ao lado do de Marine Le Pen em Saint-Jean-de-Luz, sudoeste francês
    Apoiadora de Macron cola cartaz do centrista ao lado do de Marine Le Pen em Saint-Jean-de-Luz, sudoeste francês

    A maioria dos eleitores franceses –caso se confirmem pesquisas que dão larga vantagem ao candidato centrista Emmanuel Macron sobre Marine Le Pen (direita ultranacionalista) no segundo turno presidencial, dia 7– parece decidida a apostar na ideia de uma "terceira via".

    Ou a importá-la do Reino Unido com 20 anos de atraso, se formos maldosos.

    Grosso modo, "terceira via" é o nome dado ao misto de políticas econômicas "de direita" com políticas sociais "de esquerda" que Tony Blair, premiê britânico de 1997 a 2007, propôs implementar.

    Mas Blair fez isso dentro de um dos mais tradicionais partidos do Reino Unido, o Trabalhista, que buscava então renovar seu discurso após seguidas derrotas para os conservadores de Margaret Thatcher e John Major (hoje, os fracassos eleitorais recentes levaram Jeremy Corbyn à liderança, e o pêndulo da legenda migrou de volta para a esquerda).

    Já Macron, que teve suas políticas liberais contestadas quando era ministro da Economia de François Hollande, precisou sair do Partido Socialista e fundar sigla própria para oferecer seu programa "nem direita nem esquerda".

    Suas propostas vão desde o corte de 120 mil cargos no funcionalismo público à manutenção da França na União Europeia, em contraposição à campanha da adversária para deixar o bloco.

    Surfou na onda europeia de descontentamento com as legendas tradicionais, embora ele mesmo seja um ex-banqueiro que estava no PS até anteontem –ou seja, um homem do establishment–, e agora é favorito para se tornar, aos 39, o mais jovem ocupante do Palácio do Eliseu.

    A dúvida é como Macron, se eleito, fará para lidar com a tradicional polarização do país sem desagradar a eleitores dos dois lados e sem parecer "suave demais" com o terrorismo e a imigração, crítica a Hollande que é também um dos pontos mais martelados por Marine Le Pen.

    Incógnita ainda maior é a base parlamentar de que seu novíssimo partido, o Em Frente!, disporá para dar sustentação a um eventual governo seu depois da eleição legislativa de junho.

    Os grandes derrotados do primeiro turno, o PS e os Republicanos, apoiam Macron no segundo não só para evitar o risco de Le Pen chegar ao Eliseu, mas também de olho na maioria parlamentar de que o ex-banqueiro precisará e nos cargos que ele poderá oferecer em troca.

    AVANÇO DA FN

    Quanto à candidata da Frente Nacional, diferentemente do que sugere a histeria das redes sociais ("ah, a mídia também achava que o Trump não ganharia e olhem só o que aconteceu!"), na eleição francesa não é possível ter 3 milhões de votos a menos e chegar à Presidência, como o sistema do colégio eleitoral americano permitiu a Donald Trump em 2016.

    Ou seja, Le Pen tem de virar, em menos de duas semanas, uma desvantagem em torno de 25 pontos percentuais –o que é no mínimo uma missão digna daquela trilha sonora de Lalo Schifrin.

    Mas é inegável que a FN ganhou eleitores, o que a votação legislativa poderá deixar ainda mais claro.

    Com base nos dados do primeiro turno, o "Le Monde" estima que a sigla possa fazer até 100 das 566 cadeiras em jogo na Assembleia Nacional, um salto gigantesco: hoje são apenas duas, uma delas ocupada por
    Marion Maréchal-Le Pen, sobrinha de Marine.

    Folhapress
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