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    Marine Le Pen soube modernizar o partido que herdou do pai

    RODRIGO VIZEU
    ENVIADO ESPECIAL A PARIS

    07/05/2017 02h00

    Eric Gaillard - 27.abr.2017/Reuters
    Marine Le Pen, French National Front (FN) political party leader and candidate for French 2017 presidential election, attends a campaign rally in Nice, France, April 27, 2017. REUTERS/Eric Gaillard ORG XMIT: JES165
    Líder do partido Frente Nacional, Marine Le Pen, em evento de campanha em Nice, na França

    A Frente Nacional cuja presidência Marine Le Pen assumiu em janeiro de 2011 exibia fissuras. À época, o desempenho mais recente do partido ultranacionalista em uma eleição presidencial francesa, em 2007, fora sofrível: seu pai, Jean-Marie Le Pen, obteve apenas 10% dos votos.

    À frente da FN, Le Pen pai acumulava declarações polêmicas contra judeus e homossexuais, e processos na Justiça. A sigla reclamava do que chamava de ostracismo no noticiário.

    A própria Marine atraía atenção negativa: menos de um mês antes de assumir a presidência do partido, comparou as orações muçulmanas em ruas da França à ocupação nazista durante a 2ª Guerra Mundial.

    Com o partido nas mãos e cercada de aliados de sua geração, a deputada do Parlamento Europeu de então 42 anos iniciou o chamado processo de "desdiabolização" da FN.

    O partido, que em sua origem nos anos 1970 teve fundadores egressos da SS nazista e do grupo terrorista Organização do Exército Secreto (contrário à independência da Argélia), amenizou o discurso e promoveu expulsões de de seus membros mais radicais.

    A FN prometeu processar veículos de comunicação que a categorizassem como extrema direita.

    A ênfase na soberania francesa contra os perigos da imigração e da globalização se manteve como norte.

    As bandeiras tricolores, a Marselhesa e o discurso recheado de "povo", "patriotismo" e "nós contra eles" fazem dos eventos de campanha quase um manual de instruções do populismo.

    Além disso, a candidata tem investido em uma abordagem que acena ao feminismo para expandir seu eleitorado, ressaltando o risco que o crescimento da cultura islâmica representaria à igualdade das mulheres na França.

    Em discurso nesta semana, ela manifestou preocupação com "a jovem que se pergunta como vai se vestir pela manhã porque corre o risco de ser insultada se estiver de short ou saia".

    Dentro da mesma lógica de risco de perseguição, ela tem atraído homossexuais à FN.

    FAMÍLIA

    O processo de modernização da FN foi coroado em 2015, quando o próprio Jean-Marie Le Pen foi expulso do partido.

    Hoje, pai e filha estão rompidos. Como se a relação não fosse suficientemente novelesca, a eurodeputada decidiu abandonar em 2014 o palacete da família, nos arredores de Paris, após um doberman de Jean-Marie, amante dos cães, assassinar um dos felinos de Marine, amante de gatos.

    Aos 88 anos, o ainda presidente honorário da FN faz críticas quase diárias à campanha presidencial da herdeira.

    Do lado materno, o clã também causou barulho. A mãe de Marine, Pierrette, posou nua para a "Playboy" nos anos 1980 após um rumoroso divórcio com Jean-Marie. Nas fotos, aparece vestida de doméstica.

    PROGRESSÃO DE VOTOS

    Com tal retrospecto pessoal e partidário, a advogada de formação chega a este domingo (7) com a possibilidade de ter o voto de 4 em cada 10 franceses, a se confiar nas pesquisas (que acertaram no primeiro turno).

    Confirmada porcentagem, Marine Le Pen acumulará seu segundo fracasso de chegar ao Palácio do Eliseu, mas garantirá um desempenho histórico para a Frente Nacional. Em 2012, em sua primeira tentativa, obteve 17,9% dos votos e ficou de fora do segundo turno.

    Em 2002, seu pai já chegara à segunda disputa, mas foi esmagado pelo conservador moderado Jacques Chirac por 82,2% a 17,8%.

    À época, as demais forças políticas –e seus eleitores– uniram-se em torno do então presidente para barrar a direita radical. Formava a chamada "Frente Republicana".

    Desta vez, as sondagens indicam que Marine Le Pen atrairá votos da centro-direita e até de parte da ultraesquerda, que compartilha com a ultradireita a crítica ao establishment e à globalização.

    Com a ausência de um bloco amplamente majoritário contra a FN, mais a multiplicação pelo país de sindicalistas, prefeitos e legisladores locais filiados ao partido, avança a "normalização" empreendida por Le Pen.

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