o presidente eleito da França, Emmanuel Macron, expressou com muita clareza sua política de manter o país em posição central na União Europeia. Mas suas posições quanto a outras questões internacionais são menos conhecidas.
Nos postos anteriores de Macron, como executivo financeiro e ministro da Economia, entre 2014 e 2016, a política externa não estava entre suas áreas de especialização.
François Mori - 08.mai.2017/AFP | ||
O presidente eleito da França, Emmanuel Macron |
As incursões cuidadosas e calculadas que ele fez na área de relações internacionais, durante a campanha, sinalizam que o mais jovem presidente na história da França está ciente de suas limitações e vai estudar as questões antes de formular suas posições diplomáticas.
"Há políticos que sabem que não sabem, e querem aprender. E há políticos que não sabem que não sabem e saem falando sem pensar. Macron pertence claramente à primeira dessas categorias", diz François Heisbourg, conhecido especialista francês em questões internacionais, defesa e terrorismo, que trabalhou como assessor de Macron e sua equipe de campanha.
Macron ofereceu algumas ideias gerais sobre sua posição mas, em mais de uma ocasião, demonstrou hesitação.
Quanto ao Oriente Médio, Macron afirmou repetidamente que sua principal prioridade seria continuar a luta contra a organização terrorista Estado Islâmico, que inspirou organizou diversos ataques na França, desde 2015, deixando mais de 230 mortos.
Aviões da Força Aérea francesa realizaram centenas de ataques aéreos contra alvos da milícia no Iraque e Síria, como parte da coalizão internacional que combate os extremistas na região.
Macron também disse que deseja uma saída orquestrada do poder do ditador sírio, Bashar al-Assad. Ele definiu Assad como "criminoso", depois de um ataque com gás sarin que matou dezenas de pessoas na cidade síria de Khan Sheikhoun, em 4 de abril.
O presidente eleito da França disse que o uso do letal gás dos nervos poderia ser punido por meio de ataques militares autorizados pela ONU, se o envolvimento de Assad for provado.
Mas Macron também expressou preocupação com a possibilidade de que a Síria se torne ainda mais caótica, com um colapso do aparelho de Estado, se Assad for derrubado sem um plano cuidadoso de transição.
"É muito complicado", disse Macron no ano passado. "Precisamos ser sérios."
Quanto à Rússia, Macron se distanciou dos demais candidatos ao adotar uma posição mais dura quanto ao presidente Vladimir Putin.
Ele disse que deseja trabalhar com a Rússia, que apoia Assad, na luta contra o Estado Islâmico. Mas seus apelos por cooperação vieram acompanhados por advertências de que Moscou "não compartilha de nossos valores e preferências".
Prometendo não "acomodar" as demandas russas, ele declarou no mês passado que "necessitamos de um diálogo extremamente exigente".
Macron favorece a renovação das negociações de paz para estabilizar a situação no leste da Ucrânia, para com isso reduzir gradualmente as sanções contra a Rússia.
O tom dele endureceu, com o avanço da campanha. Houve especulações generalizadas –mas ainda não comprovadas– de que os russos possam estar envolvidos em um vazamento de documentos desfavoráveis à campanha de Macron, nas horas finais da disputa.
Heisbourg disse que a Rússia e os aliados da França estarão observando atentamente a maneira pela qual Macron lidará com a ação dos hackers, que está sendo investigada pela Anssi, a agência de segurança cibernética do governo francês.
"O momento do ataque cibernético foi calculado com muita precisão. Havia indicações de envolvimento russo em muitos aspectos da ação. Ela não foi simplesmente uma tentativa tardia de prejudicar a campanha, mas um desafio", disse Heisbourg, que é assessor da Fundação de Pesquisa Estratégica, uma organização de pesquisa parisiense.
"A expectativa será de que ele responda ao desafio, de alguma maneira", disse Heisbourg.
Quanto aos Estados Unidos, Macron disse que deseja manter o compartilhamento de informações e a cooperação nas Nações Unidas, e espera persuadir o presidente Donald Trump a não retirar seu país do acordo mundial de combate à mudança climática.
Macron, que é partidário firme do comércio aberto, e Trump, que fez campanha prometendo proteger os empregos norte-americanos contra a concorrência estrangeira, parecem ocupar posições diametralmente opostas. Também são parte de gerações diferentes –Macron tem 39 anos, e Trump, 70.
A primeira reunião entre os dois provavelmente acontecerá em 25 de maio, em uma conferência de cúpula da Otan (aliança militar ocidental) em Bruxelas, e eles podem surpreender os observadores ao demonstrar que têm mais em comum do que parece.
O inglês fluente de Macron pode facilitar a química pessoal. Os dois desafiaram as projeções e superaram as expectativas ao conquistar vitórias eleitorais inesperadas. Os dois se posicionaram como candidatos desvinculados dos sistemas políticos de seus países, que eles prometeram mudar. Trump foi um dos primeiros líderes estrangeiros a parabenizar Macron por sua "grande vitória", em uma mensagem nas redes sociais na noite de domingo.
"Os dois contrariam todas as regras estabelecidas do jogo. Eram inelegíveis e ambos se elegeram", disse Heisbourg. "Provavelmente se interessarão um pelo outro."
Ainda que Macron tenha sido em geral circunspecto quanto à política externa, uma exceção aconteceu em um debate televisivo entre os candidatos à Presidência, em março, quando ele ofereceu uma explicação longa e confusa sobre o que definiu como "seu mapa de percurso" diplomático.
"Foi horrível", disse Heisbourg. "É exatamente o que um candidato não deve fazer: sair falando quando tem uma base precária de conhecimento não formulou uma doutrina razoável e estruturada, e mesmo assim não para de tagarelar."
"Isso foi visto como erro. Macron se esforçou por não repeti-lo", acrescentou Heisbourg.
Tradução de PAULO MIGLIACCI