• Mundo

    Saturday, 04-May-2024 08:36:27 -03

    Presidente do Zimbábue se diverte em Cancún enquanto seu país agoniza

    ROBBIE GRAMER
    DA "FOREIGN POLICY"

    29/05/2017 07h46

    A economia do Zimbábue está em situação de caos, com uma falta aguda de dinheiro vivo. Naturalmente, então, o momento é perfeito para o idoso líder do país passar uma semana em um resort turístico de luxo em Cancún.

    Mas não se preocupe: ele viajou para cuidar de negócios oficiais.

    Philimon Bulawayo/Reuters
    Presidente Mugabe chega de viagem no aeroporto em Harare, no Zimbábue
    Presidente Mugabe chega de viagem no aeroporto em Harare, no Zimbábue

    Acompanhado por uma comitiva de três dúzias de pessoas, Robert Mugabe, o presidente zimbabuano de 93 anos, passou a última semana em um resort em Cancún, assistindo a uma conferência da Plataforma Global para a Redução de Risco de Desastres. (Regra número um para a redução de risco de desastres: não ter Robert Mugabe como presidente).

    Como é amplamente sabido, a maior paixão na vida de Mugabe –tirando adormecer em reuniões– é discutir plataformas de redução de risco de desastres, especialmente quando as discussões por acaso acontecem em Cancún.

    Contudo, sendo o líder fiscalmente consciente que é, Mugabe passou apenas sete dias em Cancún para acompanhar os três dias da conferência.

    Apesar de sua idade e saúde debilitada, Mugabe tem o hábito de percorrer o mundo acompanhado de comitivas enormes. No ano passado ele fez pelo menos 20 viagens ao exterior, que, segundo o Ministério das Finanças, custaram cerca de US$36 milhões ao país. Vale notar que, de acordo com a Reuters, o Parlamento zimbabuano tem apenas US$30 milhões por ano com os quais pagar por seus 300 membros.

    Tudo isso tem um custo alto para os contribuintes zimbabuanos, presos em algo descrito como uma "espiral da morte" econômica, à medida que as reservas de dinheiro do país se esgotam.

    O porta-voz de Mugabe, George Charamba, defende as viagens extravagantes, dizendo que elas comprovam que o ditador nonagenário, adoentado, sonolento e resmungão ainda é capaz de fazer mais que seus colegas mais jovens. "Isso cala qualquer alegação de que o presidente estaria muito doente. Na verdade, ele está tão bem que supera mesmo os políticos mais jovens", disse o porta-voz ao jornal oficial zimbabuano "The Herald" em março.

    Além disso, segundo Charamba, Mugabe nunca adormece em reuniões, apenas "descansa a vista".

    O "Herald" passou por cima dos pequenos deslizes éticos potenciais cometidos pelo presidente na viagem a Cancún e outras, do encarceramento e tortura de dissidentes políticos e da corrupção governamental descontrolada.

    Mas essa omissão com certeza não guarda relação alguma com o fato de que profissionais do jornal e outros funcionários do governo receberam ajuda de custos diária de US$ 1.000 a US$ 1.500 durante a viagem. A título de comparação, o salário médio dos funcionários públicos zimbabuanos é de US$ 500 ao ano.

    Também a título de comparação, devido à escassez aguda de dinheiro vivo, os bancos do Zimbábue raramente permitem saques de mais de US$ 50 por dia. Mas talvez o país precise economizar todo o dinheiro vivo possível para pagar pelas multimilionárias festas de aniversário do presidente.

    O fato é que, como Charamba explicou ao "Herald", "a diplomacia não custa pouco".

    Mas o argumento do alto custo não convence oposicionistas zimbabuanos. "Temos uma burocracia que recebe diárias absurdas em suas viagens. É uma mentalidade parasítica", disse à Reuters o oposicionista e ex-ministro das Finanças Tendai Biti. "Essa viagem mais recente revela um presidente que faz viagens não estratégicas a países não estratégicos."

    Mugabe, que foi responsável por um desastre econômico maciço há uma década quando impeliu seu país para uma inflação de 79,6 bilhões por cento, não foi autorizado a se pronunciar na conferência de Cancún sobre redução de risco de desastres. Ele teria deixado a conferência "de mau humor".

    Tradução de CLARA ALLAIN

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024