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    Análise

    Trump e os 'resmungos do rei'

    CLÓVIS ROSSI
    COLUNISTA DA FOLHA

    08/06/2017 18h46

    O diretor demitido do FBI, James Comey, não trouxe, em seu depoimento ao Congresso, nenhum "batom na cueca" que pudesse de fato dinamitar a presidência Trump.

    Mas pôs na roda um episódio histórico, com o qual a analogia que tende a ser comprometedora para o presidente dos Estados Unidos.

    Comey evitou, o tempo todo, dizer que havia sido pressionado por Trump para abandonar a investigação sobre os laços com a Rússia de Michael Flynn, o efêmero assessor da Casa Branca para segurança nacional, demitido pelo presidente nos primeiros dias de gestão.

    O ex-diretor do FBI preferiu dizer que Trump lhe dera "directions" a respeito dessa investigação, uma palavra, que, no caso, pode ser traduzida como "sugestão" ou "orientação".

    Jonathan Ernst/Reuters
    James Comey, ex-diretor do FBI, faz juramento em comissão de inteligência do Senado
    James Comey, ex-diretor do FBI, faz juramento em comissão de inteligência do Senado

    Nesse caso, como os republicanos apressaram-se a dizer, não haveria propriamente obstrução da Justiça, motivo para impeachment.

    Mas Comey lembrou que esse tipo de "orientação" lhe lembrava os "resmungos do rei", no caso Henrique 2.o.

    Vale então recuperar a história dos resmungos: o rei queria retirar poderes da Igreja Católica, o que levou a um atrito com o arcebispo de Cantuária, Tomás Becket.

    Reza a lenda que, cansado dos atritos, o rei resmungou: "Não há ninguém que me livre desse padre turbulento?".

    Becket foi assassinado por quatro nobres, meses depois desse desabafo real.

    Nos Estados Unidos, o presidente, seja qual for, é o que há de mais próximo de um rei. Logo, sua "direction" deveria ser seguida, o que caracterizaria obstrução da Justiça.

    Mas o próprio Comey negou-se a dizer se assumia essa interpretação. Delegou a avaliação ao conselheiro especial Roberto Mueller, que está assumindo a investigação sobre os laços da campanha Trump com a Rússia.

    Significa dizer que, mesmo sem o "batom na cueca" no depoimento desta quinta-feira (8), Trump está muito longe de ter se livrado "dessa coisa da Rússia", como ele próprio se referiu ao problema, em conversa com Comey.

    Impeachment EUA

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