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    Crise diplomática com Israel é página virada, diz novo embaixador brasileiro

    DANIELA KRESCH
    COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, EM TEL AVIV

    23/06/2017 02h00

    Daniela Kresch/Folhapress
    O embaixador do Brasil em Tel Aviv, Paulo César Meira de Vasconcellos
    O embaixador do Brasil em Tel Aviv, Paulo César Meira de Vasconcellos

    O diplomata Paulo César Meira de Vasconcellos, 63, chegou há apenas três semanas a Israel, mas sabe que terá muito trabalho pela frente.

    Começa no cargo de embaixador do Brasil em Tel Aviv com o desafio de remendar o relacionamento entre os dois países, desgastado pelo episódio da rejeição, em 2015, do governo Dilma Rousseff ao nome de Dani Dayan para embaixador de Israel porque ele havia sido líder dos colonos israelenses.

    Israel demorou mais de um ano para indicar um novo nome. O empresário Yossi Sheli recebeu o agrément brasileiro apenas em janeiro e assumiu o cargo em março –pouco antes de Vasconcellos (que já foi embaixador em Bancoc e em Abu Dhabi) ser aprovado pelo Congresso para a representação do Brasil em Tel Aviv, que também ficou sem titular por mais de seis meses.

    Mas, apesar da intenção de focar apenas numa "agenda positiva", o começo já foi áspero. Ao entregar suas credenciais ao presidente de Israel, Reuven Rivlin, no dia 15, Vasconcellos ouviu dele críticas ao voto do Brasil a favor de uma resolução da Unesco que declarou que Israel não é soberano em Jerusalém.

    *

    Folha – O presidente Rivlin criticou o Brasil ao receber as suas credenciais. Já é um começo complicado?
    Paulo César Meira de Vasconcellos – O presidente não fez críticas específicas ao Brasil. Ele falou a mesma coisa para os quatro embaixadores que entregaram credenciais (Brasil, Honduras, Nepal e Tanzânia). Mas o voto na Unesco não ignora a ligação de Israel com Jerusalém. Reconhece os laços da cidade com as três religiões monoteístas: islamismo, judaísmo e cristianismo.

    A resolução não indica que Israel não tem a soberania de Jerusalém?
    Não, não entra nesse mérito. A resolução demonstra preocupação com a forma com que os israelenses estão tratando os sítios religiosos. Há essa acusação de que estão fazendo escavações subterrâneas que podem impactar o patrimônio histórico e que estariam dificultando a entrada de muçulmanos em sítios do islamismo. Não estou defendendo lado nenhum, mas há essas críticas.

    Houve desgaste no relacionamento entre os países por causa da rejeição de Dani Dayan?
    Com a indicação do nome do embaixador israelense, que foi quase que simultânea à minha, viramos a página. Houve uma turbulência. Passou. Agora já estamos num céu de brigadeiro. Quero justamente trabalhar uma agenda positiva, em cooperação em vários setores.

    Existe algum interesse do Brasil, como na época do ex-presidente Lula, de mediar o conflito com os palestinos?
    O interesse teria que vir deles, de israelenses e palestinos. Não vamos nos oferecer, porque aí entramos numa zona cinza perigosa de nos intrometer nos assuntos internos dos outros.

    Thomas Coex - 17.jan.2017/AFP
    Palestinian women and girls sit in front of Israel's controversial separation barrier between the West Bank city of Bethlehem and Jerusalem on January 17, 2017.
    Palestinas conversam ao lado do muro construído por Israel na Cisjordânia, entre Belém e Jerusalém

    O senhor veio direto de Abu Dhabi. Como isso ajudará em sua função em Israel?
    A verdade é que foi muito difícil vir para cá direto. De Abu Dhabi não se consegue nem fazer uma ligação telefônica para Israel. Minha mudança teve de ser enviada ao Chipre e, só depois, a Israel. Mas eu acho que os Emirados Árabes e Israel têm algo em comum. Os dois povos, os beduínos do deserto e judeus de todo o mundo, vieram para um região inóspita e construíram países modernos.

    Como o senhor analisa o bloqueio diplomático de países árabes ao Qatar?
    Na região, o Qatar sempre teve uma política externa diferente, mais independente. Também deram refúgio a vários membros da Irmandade Muçulmana, que, para esses países do Golfo, é o que existe de pior, e têm uma política menos crítica em relação ao Irã. A partir do momento em que países da região se sentiram empoderados pela visita do Trump à Arábia Saudita, quiseram enquadrar o Qatar.

    Como o Brasil vê esse conflito?
    O Brasil é sempre a favor de uma solução pacífica. Mas queremos que isso se resolva não só do ponto de vista político, mas também pelos nossos interesses comerciais. Já há menos fluxo de transporte aéreo e marítimo. Com um conflito, só saímos perdendo.

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