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    dias melhores

    Garota aprende a escrever português em 1,5 ano e banca aluguel da família

    ANA ESTELA DE SOUSA PINTO
    DE SÃO PAULO

    25/06/2017 02h00

    Adriano Vizoni/Folhapress
    SAO PAULO- SP - BRASIL, 23-06-2017, 11h00: FILHOS DE DECASSEGUIS. Retrato de Aline Tieko Ito, que foi com os pais para o Japao com 7 anos e retornou ao Brasil com 17. La ela sofreu pra se adaptar com a escola japonesa e, quando voltou, sofreu de novo para se adaptar a brasileira. Aline foi uma das participantes do projeto Kaeru. (Foto: Adriano Vizoni/Folhapress, MERCADO) ***EXCLUSIVO FSP***
    Aline Tieko Ito na Faculdade Paulista de Artes, onde estuda design; ela foi com os pais para o Japao com 7 anos e retornou ao Brasil com 17

    O primeiro choque que Aline Tieko Ito Serra levou ao entrar numa escola brasileira pela primeira vez, aos 17 anos, foi ver alunos confrontando os professores.

    "O professor não conseguia dar aula, o material era precário, o português escrito era muito diferente do falado, tudo era difícil."

    No auge da crise de 2008 no Japão, seus pais tinham sido dos primeiros a ser demitidos nas indústrias em que trabalhavam, e aproveitaram a ajuda que o governo japonês dava aos que quisessem voltar ao Brasil. "Voltamos para a estaca zero, para a casa da minha avó, de onde minha família tinha saído também sem emprego."

    Na escola estadual de Guarulhos em que foi matriculada, Aline foi apresentada pela diretora ao projeto Kaeru, que ajuda filhos de decasséguis que voltaram ao Brasil a se adaptar à escola..

    "Foi na melhor época, porque eu não me conformava de ter voltado ao Brasil. Achava que fosse burra, jamais aprenderia, chegava em casa chorando todos os dias."

    Ela diz que os professores não acreditavam quando dizia que não sabia ler nem escrever em português. "Como não tinha sotaque, achavam que fosse mentira. Mas eu mal conhecia o alfabeto."

    PERSISTÊNCIA

    Toda vez que pensava em jogar tudo para o alto, afirma ela, "o projeto Kaeru ajudava a recuperar o equilíbrio emocional". Aline continuou a frequentar as sessões mesmo após se formar no ensino médio, durante oito meses.

    "Alguns têm preconceito, acham que psicólogo é só para quem é anormal. Mas todo mundo deveria ter um acompanhamento."

    SEM MEDO DA ESCOLA
    Filhos de decasséguis que voltaram ao Brasil em atividade do projeto Kaeru

    Durante todo esse tempo, seus pais continuavam sem emprego no Brasil. Os dez anos em que viveu no Japão a ajudaram a conseguir um emprego no hospital Nipo-brasileiro, e Aline passou a bancar o aluguel da família.

    Do país asiático ficaram lembranças do frio, da neve e do espanto dos colegas quando ela levava na marmita arroz, feijão e bife. "Todos queriam olhar, e eu morria de vergonha, porque meu almoço não era todo arrumadinho como o dos japoneses."

    Quando chegou ao Japão, sem saber nada do idioma, foi colocada em classes separadas nas escolas japonesas em que estudou, porque não conseguia acompanhar as turmas.

    "As aulas práticas, fazia junto, mas nas teóricas precisava de ajuda extra."

    Embora essa dificuldade acabe fazendo com que muitos filhos de decasséguis abandonem a escola, Aline conseguiu ir em frente.

    Ela diz que começou a falar bem o japonês depois de dois anos e, na quinta série, conseguiu acompanhar as turmas regulares da escola japonesa.

    Estudante de design, ela trabalha num escritório de arquitetura e diz que não pensa em voltar ao Japão.

    "Só para passear. Se voltasse agora, teria que trabalhar como peão."

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