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    Entre militares venezuelanos e o governo, há fissuras mas não fratura

    CLÓVIS ROSSI
    COLUNISTA DA FOLHA

    22/07/2017 02h00

    Se se pudesse reduzir a uma frase a avaliação mais realista sobre o apoio dos militares ao governo de Nicolás Maduro, seria esta: há fissuras, mas não há uma fratura.

    As informações a respeito dos militares são escassas, mas há pelo menos dois fatos que indicam fissuras, a saber:

    1 - A prisão de 123 militares, desde o início, há 100 dias, dos protestos praticamente diários que a oposição promove. Até onde se sabe, a grande maioria das prisões se deu por desobediência às ordens superiores, embora algumas delas fossem por roubos/furtos.

    Carlos Becerra-10.jul.2017/AFP
    Members of the National Guard arrest an opposition activist during a protest against Venezuelan President Nicolas Maduro in Caracas on July 10, 2017. Venezuela hit its 100th day of anti-government protests Sunday, amid uncertainty over whether the release from prison a day earlier of prominent political prisoner Leopoldo Lopez might open the way to negotiations to defuse the profound crisis gripping the country. / AFP PHOTO / CARLOS BECERRA ORG XMIT: 246
    Membros da Guarda Nacional prendem ativista da oposição em Caracas

    Mesmo neste último caso, aparecem razões óbvias para fissuras: se a oficialidade superior goza de privilégios que permitem a ela escapar dos piores efeitos da crise (desabastecimento, retrocesso econômico, violência, inflação obscena), para os postos de menor hierarquia não há defesa.

    Que se revoltem (ou roubem) é quase uma consequência natural.

    2 - A decisão do general Vladimir Padrino López, ministro da Defesa, de mandar para casa todos os oficiais que não tenham sido promovidos nos últimos dois anos.

    Afastá-los dos quartéis é a melhor maneira de evitar que caiam na tentação de conspirar contra um governo que não lhes permite ascender na carreira.

    Há ainda um terceiro eventual elemento, ainda mal explicado: há exatamente um mês Maduro ratificou Padrino como ministro da Defesa, mas tirou-lhe o poderoso Comando Estratégico da Força Armada Nacional Bolivariana.

    Para seu lugar, o presidente nomeou o almirante Regimio Ceballlos, aparentemente mais duro.

    Fora esses tênues indícios, a solidez do apoio ao governo é facilmente explicável. Está em artigo desta sexta-feira (21) para "El País", da Espanha, de Joaquín Villalobos, um ex-guerrilheiro salvadorenho que se tornou especialista em resolução de conflitos. Em ambas as situações, Villalobos ganhou condições de analisar de perto os militares.

    Sua análise sobre os venezuelanos é assim: "Os militares venezuelanos têm mais generais que os Estados Unidos, ocupam milhares de postos de governo, armaram paramilitares, envolveram-se com o narcotráfico, intervieram e expropriaram empresas, se beneficiam da corrupção, controlam o mercado negro, reprimem, prendem, torturam, julgam e encarceram opositores".

    Fecho da história: "Na história das ditaduras latino-americanas, não existiu uma elite militar que tenha conseguido enriquecer-se tanto como a venezuelana".

    Se é assim, não há o mais leve incentivo para que os militares abandonem um governo que lhes dá tanto poder e recursos. A menos que lhes seja oferecida uma saída em caso de mudança de governo.

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