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    O que acontece agora? 4 pontos-chave para entender a polêmica Constituinte na Venezuela

    DA BBC BRASIL

    31/07/2017 10h36

    A Venezuela entra nesta segunda-feira em uma nova fase política. A população que compareceu aos locais de votação no domingo elegeu uma Assembleia Constituinte com poderes ilimitados, duração desconhecida e com a missão de redigir uma nova Constituição e reformar o Estado.

    No domingo, foram eleitos 545 membros da Constituinte, que darão início a uma nova era no país após 18 anos da aprovação da atual Carta Magna venezuelana, promulgada em 1999, no primeiro ano de governo do então presidente Hugo Chávez.

    Desta vez, o governo enfrenta uma grave crise econômica e um conflito político que se traduziu em quatro meses de protestos, com quase 120 mortos e um enfrentamento direto com a oposição.

    A oposição, aliás, diz que 88% dos eleitores se abstiveram de ir às urnas no domingo, enquanto dados oficiais dizem que 41,5% compareceram à votação.

    A oposição, que vê a Constituinte como uma estratégia do governo para aumentar o poder e abafar vozes críticas, boicotou a eleição; para o governo, o processo é a chave para o diálogo e a paz.

    A nação petroleira entra um período de incertezas e a BBC Mundo, serviço em espanhol da BBC, aponta quatro incógnitas sobre o momento político.

    QUANDO E ONDE SERÁ INSTALADA?

    Espera-se que a Assembleia Constituinte seja inaugurada em até três dias após a eleição, baseado em seu regulamento e em declarações do presidente Nicolás Maduro.

    Ela será instalada no Salão Oval do Palácio Legislativo, no mesmo edifício e em frente ao plenário da Assembleia Nacional (o Parlamento do país), composta em maioria por deputados da oposição.

    "Será uma disputa visual forte", comentou o analista americano especialista em Venezuela David Smilde, sobre um possível antagonismo entre as duas casas.

    Nos últimos dez meses, simpatizantes do governo invadiram por duas vezes o Palácio Legislativo em protestos contra a bancada opositora da Assembleia.

    "Será um sinal de dois governos", disse a BBC Mundo o deputado da oposição Richard Blanco sobre a duplicidade de instituições.

    Em março, o Tribunal Supremo de Justiça do país assumiu os poderes legislativos da Assembleia Nacional, o que foi considerado um golpe pela oposição. A atual Constituinte pode dissolver o Parlamento, mas também coabitar com ele.

    O Salão Oval tem um grande valor simbólico e artístico. Alguns o chamam de Capela Sistina da Venezuela. A cúpula de 26 metros de largura tem uma representação da Batalha de Carabobo, do pintor Martín Tovar y Tovar.

    A própria Ata da Independência está ali, guardada em um cofre que é aberto apenas uma vez por ano.

    QUANTO TEMPO IRÁ DURAR?

    Ainda não se sabe a duração da Constituinte, uma vez que ela própria irá definir seu prazo.

    O precedente mais próximo é a Constituinte de 1999. Na época, os 131 membros concluíram a nova Constituição em três meses e meio. Ela foi aprovada em seguida por um referendo.

    "Pelo que se tem dito, há a tese de que dure um ano", disse em uma entrevista recente à BBC Mundo Hermann Escarrá, um dos idealizadores do processo convocado pelo governo.

    "São hipóteses. Mas na realidade, isto será decidido pela Assembleia Constituinte", disse Escarrá, que lembrou que a Constituinte redigirá não apenas uma nova Carta Magna, mas "leis constitucionais", de cumprimento obrigatório.

    O QUE ELA FARÁ?

    A Constituinte tem poderes ilimitados e está acima de qualquer outra instituição estatal, incluindo o próprio presidente.

    Por isso, é importante saber quem a presidirá: seja a esposa de Maduro, Cilia Flores, ou Diosdado Cabello, que embora governista, possa querer impor sua visão à do chefe de Estado.

    O artigo 349 da atual Constituição estabelece que os poderes constituídos "não poderão de forma alguma impedir as decisões da Assembleia Nacional Constituinte" e que o presidente não poderá fazer objeção à nova Constituição.

    Maduro não considerou necessária uma consulta popular prévia para avaliar se os venezuelanos queriam uma Constituinte, como ocorreu em 1999. Mas propõe um referendo para aprovar a nova Carta Magna, o que, mais uma vez, está nas mãos da Constituinte.

    As funções já declaradas da Constituinte são reformar a justiça –para combater com mais força o "terrorismo", termo que o governo usa para classificar ações da oposição– e o sistema econômico, hoje completamente dependente do petróleo, uma fonte de receitas que já não gera as divisas de antes.

    Maduro e outros líderes governistas que estarão na Constituinte já anunciaram uma possível dissolução do Parlamento, controlado pela oposição, e a reforma do Ministério Público.

    O QUE FARÁ A OPOSIÇÃO?

    "Rua, rua e mais rua", disse à BBC Mundo neste domingo o deputado da oposição Richard Blanco.

    Os opositores continuarão exigindo a convocação de eleições diretas antecipadas e o fim do atual governo; eles acreditam que Maduro é responsável pela grave crise econômica e por transformar o sistema político do país em uma ditadura.

    A oposição não reconhece a Constituinte, nem participou da eleição no domingo. Mas agora precisa apaziguar suas próprias diferenças: a Mesa da Unidade Democrática (MUD), a coalizão de partidos da oposição, é composta de grupos com visões diferentes sofre como enfrentar o governo e a atual crise política.

    Na próxima semana, entre 7 e 9 de agosto, será aberto o prazo de inscrição para candidatos às eleições regionais, previstas para o dia 10 de dezembro.

    Haverá uma resposta uníssona ou fragmentada? Tentarão influenciar o processo de formulação ou mesmo o referendo da nova Constituição de alguma forma ou seguirão em desobediência civil e não reconhecendo os atuais poderes da Constituinte?

    Além da oposição, vários países, entre eles Brasil, Estados Unidos, México, Colômbia, Peru, Argentina, Chile e Panamá, disseram não reconhecer a Constituinte.

    Com isso, a oposição poderia proclamar suas próprias instituições, como ocorreu ao nomear magistrados do Tribunal Supremo de Justiça na última semana. Isto levaria a Venezuela a ter um Estado paralelo, o que aprofundaria ainda mais a divisão do país.

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