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    Kim usou motor contrabandeado para lançar novos mísseis, afirma estudo

    IGOR GIELOW
    DE SÃO PAULO

    14/08/2017 13h17

    Damir Sagolj /Reuters
    Pessoas celebram enquanto míssil é apresentado em parada militar que marca o chamado "Dia do Sol", na Coreia do Norte
    Míssil da família Hwasong, de longo alcance, é apresentado em desfile na Coreia do Norte neste ano

    A Coreia do Norte conseguiu lançar dois mísseis intercontinentais após uma série de fracassos em seu programa de armas porque obteve potentes motores de foguete no exterior, provavelmente de fontes na Ucrânia.

    Essa é a conclusão de uma análise feita por Michael Elleman, especialista em mísseis do prestigioso Instituto Internacional para Estudos Estratégicos, de Londres.

    Elleman estava intrigado. Até meados da década, Pyongyang concentrava seus esforços no Musudan, um derivado do míssil da era soviética R-27, provavelmente adquirido no mercado negro nos anos 1990, assim como os modelos de curto alcance que opera com sucesso hoje.

    Como 7 de 9 testes falharam devido provavelmente ao programa de sabotagem cibernética promovido pelo governo de Barack Obama, o Musudan foi abandonado em 2016. Um ano depois, a ditadura comunista lançou com sucesso dois mísseis ainda mais poderosos, com alcance para atingir os Estados Unidos, disparando a atual guerra de nervos entre Donald Trump e Kim Jong-un.

    "Nenhum país passou de uma capacidade de médio alcance para um míssil intercontinental em tão pouco tempo. O que explica isso? A Coreia do Norte adquiriu um motor de propelente líquido de alta performance de uma fonte estrangeira", escreveu Elleman.

    Todas as evidências coletadas pelo analista apontam para a família de motores RD-250, usada em mísseis gigantescos que a União Soviética apontava para os EUA, armados com até dez ogivas nucleares. Os norte-coreanos dizem ter miniaturizado armamento atômico para colocar nos modelos lançados, o Hwasong-12 e o Hwasong-14, mas isso é incerto até aqui.

    Análise de imagens mostra que os bocais dos mísseis lançados são consistentes com o esquema do RD-250, com um ponto de exaustão principal e quatro secundários, que servem para estabelecer a trajetória do foguete. Dados técnicos dos lançamentos também aproximam os modelos.

    A suspeita de Elleman é de que os motores tenham vindo por meio do mercado negro da Ucrânia, que os produzia nos tempos em que fazia parte da União Soviética. Após o fim do império comunista e a independência de Kiev, a fábrica de mísseis foi renomeada como Iujmash e seguiu fornecendo para a Rússia.

    Com o rompimento entre o Kremlin e o regime pró-Ocidente da Ucrânia em 2014, a relação acabou, e a Iujmash entrou em crise, sem pagamento de salários -o que leva, em tese, à tentação da corrupção por parte de seus engenheiros. A empresa também fornecia os foguetes para o fracassado programa conjunto Brasil-Ucrânia, que gerou um prejuízo de R$ 1 bilhão em mais de dez anos.

    Outra tese possível é a de que os motores tenham vindo por meio de contrabandistas russos ou pessoas ligadas à Energomash, a empresa russa que lidava com a tecnologia no pós-Guerra Fria, desafiando sanções das Nações Unidas contra Pyongyang.

    Isso porque há provavelmente dezenas de motores avulsos da família RD-250 estocados na Rússia, além de sobressalentes administrados pela Energomash.

    Em sua análise, à qual a Folha teve acesso, Elleman descarta como improvável a hipótese de que os motores tenham sido fornecidos juntamente com a tecnologia de mísseis de curto e médio alcance adquirida nos anos 1990. O complexo Iujmash/Energomash era rival daqueles outros fornecedores.

    O "The New York Times", que antecipou nesta segunda (14) os resultados da análise, ouviu o governo em Kiev, que descartou com veemência a colaboração entre ucranianos e norte-coreanos. Kremlin e Casa Branca não se pronunciaram.

    O analista acredita que os norte-coreanos fizeram negócios ilegais com ucranianos. "A grande questão é quantos motores eles têm e se os ucranianos os estão ajudando agora. Estou muito preocupado", disse ao jornal americano Elleman.

    Por fim, o analista avalia que o sucesso dos lançamentos ainda não implica risco para os EUA, já que os modelos não tiveram seu sistema de guiagem testado de forma efetiva: serão necessários mais lançamentos para poder dizer que Pyongyang tem Los Angeles ou outra cidade americana de fato em sua mira. Mas afirma que isso está a caminho.

    Editoria de Arte/Folhapress
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