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    Brasil atrasa ratificação de tratado que regula comércio de armas

    GUILHERME MAGALHÃES
    DE SÃO PAULO

    11/09/2017 21h57

    Mohamed al-Sayaghi - 26.mar.2016/Reuters
    Militante ergue fuzil em comício para comemorar um ano de ataques sauditas na guerra civil do Iêmen

    Assinado pelo Brasil logo no primeiro dia, em 3 de junho de 2013, o Tratado sobre o Comércio de Armas (TCA) caminha em passos lentos para ser ratificado —e com isso, entrar de fato em vigor no país.

    A 3ª Conferência dos Estados-Parte —aqueles que já ratificaram o tratado— teve início nesta segunda-feira (11) em Genebra, na Suíça, e o Brasil novamente foi relegado ao posto de observador, sem poder para influenciar no processo de tomada de decisões.

    O tratado regulamenta o comércio internacional de armas, incluindo tanques, aviões e navios, e proíbe a transferência de armas e munições para países onde as peças serão usadas para facilitar crimes contra a humanidade.

    Relatório da ONU apontou que a fabricante brasileira Forjas Taurus enviou em 2015 8.000 armas a um iemenita filho de um dos maiores traficantes internacionais. O Iêmen vive uma guerra civil que já deixou 8.000 mortos.

    Até o momento, 92 países já ratificaram o TCA. O Brasil e outras 40 nações assinaram, mas ainda não ratificaram. Nesse grupo também estão os EUA —maior fabricante de armas do mundo e o maior comprador do Brasil.

    A ratificação do TCA pelos EUA, já vista como difícil no governo Barack Obama, ficou ainda mais distante com Donald Trump, que é próximo do lobby pró-armas.

    Sessenta países sequer assinaram o tratado. Entre eles destacam-se China e Rússia. Mesmo assim, o TCA entrou em vigor em dezembro de 2014, após a ratificação de ao menos 50 países.

    "Os principais exportadores, como Áustria, Itália e Alemanha, já participam", afirma à Folha Jefferson Nascimento, assessor de política externa da ONG Conectas Direitos Humanos.

    Depois de assinado, ainda no primeiro governo Dilma Rousseff, o tratado ficou com o Poder Executivo por 525 dias, passando pelas pastas de Relações Exteriores, Defesa e Justiça, e pela Casa Civil.

    Ao chegar no Legislativo, foram 399 dias na Comissão de Relações Exteriores da Câmara, 249 dias na de Constituição e Justiça —durante esse período, assumiu Michel Temer— e 627 dias na de Segurança Pública, comissão que aprovou no último dia 5 parecer pedindo a ratificação.

    A demora não encontra paralelo com o trâmite de outros tratados internacionais no Congresso nesse período.

    A ratificação do Acordo de Paris sobre as mudanças climáticas, por exemplo, passou por Câmara e Senado em menos de três meses.

    INDÚSTRIA

    Há quem aponte que faltou diálogo com a indústria. O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSC-SP) entrou com requerimento na Presidência da Câmara, na semana passada, pedindo que o tratado fosse analisado pela Comissão de Desenvolvimento Econômico.

    Uma das associações que representam o setor, porém, foi convidada para audiência pública realizada em agosto de 2015 na Comissão de Relações Exteriores da Câmara, mas ninguém compareceu.

    Bolsonaro vê como insuficiente o convite e afirma que o tratado pode prejudicar a produção brasileira. Relatório de 2013 da organização Small Arms Survey coloca o Brasil como 4º maior produtor mundial de armas leves, atrás de Estados Unidos, Itália e Alemanha.

    "Não acredito na efetividade de um tratado que Rússia, China e EUA não assinaram", diz à Folha o deputado.

    O requerimento de Bolsonaro, no entanto, foi indeferido nesta segunda-feira pela Mesa Diretora da Câmara, que avalia que o tratado "não se enquadra no campo temático" da Comissão de Desenvolvimento Econômico.

    "A narrativa que tentamos levar aos parlamentares é que o tratado dá um certificado de exportador responsável", afirma Nascimento, da ONG Conectas. "Achamos que num futuro muito próximo isso seja precificado de alguma maneira. Países vizinhos venderão mais caro, mas garantindo que o produto não vai cair nas mãos de um traficante."

    A ratificação agora aguarda votação pelo plenário da Câmara. Se aprovada, começará a tramitar no Senado.

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