O som da primeira rajada de balas me congela por uns segundos. O barulho das automáticas vem de supetão ao abrir a porta do campo de tiros indoor. As pernas vacilam, o coração dispara.

Estou na Battlefield Vegas, uma das mais de dez casas de tiro de Las Vegas, com 350 armas de vários estilos, como modelos históricos, contemporâneos e até personalizados com a Hello Kitty.

	Fernanda Ezabella/Folhapress
	Entrada do Battlefield Vegas, casa de tiro em Las Vegas

A atividade é bastante popular entre turistas e um símbolo da cultura pró-armas no Estado de Nevada, onde é possível comprar metralhadoras automáticas, algo ilegal em outras regiões do país. Foram armas do tipo, que disparam inúmeras balas de uma só vez, que um assassino de 64 anos usou para matar 58 pessoas no domingo (1º).

Na Battlefield Vegas, um gerente avisa que ninguém dará entrevistas. Meu instrutor, que pediu para não ter seu nome divulgado, comenta que a frequência está um pouco abaixo do normal desde do massacre. Ele está sempre armado e diz ser extra cuidadoso para nunca deixar seus alunos apontarem para além do alvo a sua frente.

Também comenta que crianças a partir de 10 anos são vistas atirando quase que diariamente. "Os pais querem que seus filhos tenham esta experiência, não seja algo do outro mundo", diz o instrutor, acrescentando que há muitos estrangeiros, como australianos e brasileiros. Em 2014, num campo de tiro no Arizona, a uma hora de Las Vegas, uma menina de 9 anos matou seu instrutor com uma Uzi.

O local funciona também como uma grande loja de souvenires, com camisetas pró-armas, rifles de brinquedo, adesivos e manequins de zumbis de alvos. Há inúmeros pacotes disponíveis, alguns inspirados em videogames, como Counter Strike, ou filmes, como "Platoon" (1986). Também dá para escolher por modelo, e um destaque é a M-134, que pode disparar 4.000 tiros por minutos. Para cem tiros, o preço é US$ 199 (R$ 627).

Escolho o pacote "Selvagens Cães de Guerra", inspirado no filme de 1978, o qual nunca vi, mas é o mais barato, a US$ 99 (R$ 312). São três tipos de rifles antigos automáticos (CZ-26, Uzi e Sterling) e um total de 75 balas. O instrutor dá uma breve explicação e me passa um 'brinquedo' de cada vez.

Ao final, o barulho não assusta mais, nem o cheiro esquisito, nem as cápsulas vazias que voam na cara. Enquanto miro no alvo, ele pede meu celular para tirar vídeos e fotos.

Assim como outras atividades e shows na cidade, duas casas de tiros fecharam suas portas na segunda-feira. A Machine Guns Vegas só reabriria na quarta-feira (4) e divulgou um comunicado condenando o atentado e pedindo mais controle de armas.

"Muitos fatores contribuíram para este evento trágico, mas não há dúvida que a habilidade do atirador em atingir tanta gente foi fortemente devido aos tipos de armas que ele teve acesso", diz o comunicado. "Concordamos que a NRA [Associação Nacional do Rifle, principal lobby pró-armas], o governo federal e os Estados têm a responsabilidade de continuar a maximizar os esforços de manter estas armas fora do alcance das pessoas erradas."