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    Museu da Bíblia em Washington aborda Inquisição e dúvidas

    ESTELITA HASS CARAZZAI
    DE WASHINGTON

    20/11/2017 02h00

    A família americana Green tem um patrimônio estimado em US$ 6,2 bilhões.

    Dona de uma rede de lojas de decoração e bricolagem, a Hobby Lobby, começou a construir seu império com David, o único dos seis filhos de um pastor que não se sentia vocacionado para a vida religiosa. Quando conseguiu um emprego numa rede varejista, ouviu da mãe: "É? E o que você faz pelo Senhor?"

    Neste sábado (18), os Green abriram ao público em Washington um empreendimento no qual investiram meio bilhão: o Museu da Bíblia.

    "Não é um sonho apenas meu ou da minha família; é um sonho de milhares de pessoas que amam este livro e o usam como guia para suas vidas", declarou Steve Green, filho de David e atual presidente da Hobby Lobby.
    Não é a primeira vez que a família se envolve na defesa de ideais bíblicos. Em 2014, os Green foram à Suprema Corte para obter o direito de não pagar por anticoncepcionais de seus funcionários, como pedia a nova regulação da saúde, em prol da liberdade religiosa. Conseguiram.

    Na época, lideravam uma campanha para levar o estudo da Bíblia em escolas de Oklahoma, seu Estado natal.

    Instituíram como missão de sua empresa "honrar o Senhor em tudo o que fazem, atuando de forma coerente com os princípios bíblicos".

    As lojas fecham aos domingos para que os funcionários frequentem igrejas, oferecem assistência médica a empregados e têm aumentado a remuneração mínima por hora em US$ 1 (o salário mínimo federal é de US$ 10,20 a hora, ou R$ 5.900 mensais).

    COLEÇÃO

    Foi há sete anos que a família começou a investir em artefatos do Oriente Médio, boa parte relacionada aos primórdios da história do Cristianismo. Hoje, têm milhares deles -alguns de alto valor histórico, como livros da biblioteca de Alexandria e os manuscritos do Mar Morto, achados numa caverna em Israel no início do século 20.

    Foram aquisições polêmicas: neste ano, o Departamento da Justiça apontou suspeitas de que parte da coleção tenha sido adquirida no mercado negro e entrado ilegalmente nos EUA, com etiquetas de "amostras" ou "azulejos de cerâmica".

    A família selou um acordo para devolver 400 itens suspeitos e pagar US$ 3 milhões de multa pelas peças -que, diz, não são as da exibição.

    Os fundadores afirmam que o museu, sem fins lucrativos, busca manter uma exposição "profissional e imparcial" sobre o livro, com foco em sua história, suas narrativas e seu impacto social.

    "Nossa meta não é evangelizar nem fazer proselitismo", diz à Folha Jeremy Burton, diretor de comunicação do museu. Busca-se a objetividade. Ao lado de fragmentos dos manuscritos do Mar Morto, cuja autenticidade é dúbia, avisa-se: "Isso é autêntico? Pesquisa em curso".

    As exibições incluem controvérsias como a Inquisição, a perseguição a indígenas e judeus e a Guerra Civil dos EUA, quando a Bíblia foi usada para justificar a escravidão. "Cristãos foram responsáveis por algumas das piores tragédias", diz a placa.

    "É menos sobre os cristãos e mais sobre a história da Bíblia", disse à Folha o empresário Loren Balman, 62, convidado para a inauguração.

    Mas o esforço às vezes falha. Na cerimônia de abertura, Tony Zeiss, diretor-executivo do museu, afirmou: "Só queremos apresentar a palavra de Deus, e a palavra de Deus vai falar por si". Minutos depois, Steve Green convocou a plateia: "Você já leu a Bíblia hoje?", e estimulou a plateia a baixá-la no celular.

    "Sabíamos que haveria críticas dos dois lados", disse o diretor de comunicação à Folha. "Ouvi gente dizer que 'não há Jesus suficiente'."

    Para ele, o importante é conhecer o local e formar sua própria opinião. O convite surtiu efeito: só há ingressos disponíveis para daqui a dez dias. O museu é gratuito, mas é preciso reservar a entrada em museumofthebible.org.

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