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    Guilherme Rodrigues: E os municípios nas eleições presidenciais?

    28/05/2014 02h00

    A efervescência eleitoral já ocupa o noticiário, em movimento que permitirá distinguir as propostas de cada candidatura para levar o Brasil ao grupo de nações desenvolvidas. Mas e quanto aos temas que estão além do debate partidário? Questões cruciais que unificam os diferentes grupos em disputa deveriam ser tratadas como um projeto suprapartidário de país, capaz de delinear uma agenda comum. É o caso das questões que impactam o cotidiano dos municípios: como se comportam e como vão se comportar os agentes políticos em embate eleitoral?

    Em vias de votação na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, já aprovada por maioria esmagadora dos deputados, a PEC (proposta de emenda constitucional) nº 17/2012 é, sem dúvidas, um desses temas.

    Em linhas gerais, a proposta cria condições para que os municípios estruturem suas defesas jurídicas em outros patamares. Hoje, é decisão do governante da vez contar com uma procuradoria municipal concursada. Em muitos casos, essa lacuna abre espaço para conluios entre candidatos a prefeito e bancas de advocacia, ou mesmo para indicações de pessoas cuja atuação será em defesa do governo ou do prefeito –e não da sociedade.

    A PEC 17 indica o caminho do concurso público para contratação de procuradores municipais, reduzindo o espaço para fraudes e corrupção. Mas a proposta pode ser atingida em seu cerne se uma emenda da senadora Ana Amélia (PP-RS) for aprovada. A senadora encampou um texto que limita os impactos da PEC 17 aos municípios com mais de 100 mil habitantes.

    A ANPM (Associação Nacional dos Procuradores Municipais) fez as contas: dos 5.564 municípios brasileiros, só 5,37% têm mais de 100 mil habitantes. Ou seja, a emenda de Ana Amélia não muda a realidade em 94% das cidades. Pior: entre as cidades com mais de 100 mil habitantes, apenas 1,72% não têm procuradoria municipal estruturada.

    A emenda traz grave vício jurídico: propõe a ruptura do Estado constitucional para a criação de dois "Brasis". O Brasil constitucional, das cidades com mais de 100 mil habitantes, que terão garantidos os direitos fundamentais, de cidadania e que estão submetidos aos mecanismos de controle; e o Brasil marginal, o das cidades com menos de 100 mil habitantes, que não serão alcançadas pelo sistema instituído pela Constituição, perdendo um importante controle interno da administração pública que é o procurador municipal concursado.

    O temor do impacto nos cofres públicos com a criação de uma nova carreira é falacioso, pois os municípios já gastam (sem o devido controle público) com suas defesas jurídicas. Logo, a PEC 17 enseja uma melhor destinação a esses recursos.

    Rachado o país em dois, a parte marginal permanecerá encravada no subdesenvolvimento, muito mais suscetível à corrupção e com direitos diminuídos. A PEC 17 garante o acesso por concurso público ao cargo de procurador, fortalece o princípio da impessoalidade, assegura atuação autônoma dentro do princípio da moralidade e confere maior legalidade aos atos da administração.

    O interesse público e o compromisso com o desenvolvimento exigem que a PEC 17 seja aprovada no Senado sem a equivocada emenda da senadora Ana Amélia. Afinal, para além do jogo eleitoral em curso, há um tão ou mais importante a ser vencido: o de garantia da moralidade e do uso correto do dinheiro público. Com a palavra, os senadores.

    GUILHERME RODRIGUES, 47, é procurador municipal em Fortaleza (CE) e presidente da ANPM (Associação Nacional dos Procuradores Municipais)

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