• Opinião

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    Paulo Schiller e Ilana Katz: Nem toda agitação ou desatenção é doença

    09/07/2014 02h00

    A Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo publicou em 12 de junho de 2014 a portaria nº 986/2014, que regulamenta o uso de metilfenidato (ritalina e concerta) na rede pública de saúde do município. O protocolo clínico instituído representa um passo essencial no reconhecimento de uma verdadeira epidemia em que se configurou nos últimos anos o diagnóstico de transtorno de deficit de atenção/hiperatividade (TDAH).

    Com a ampliação recente da faixa etária dos que podem ser incluídos no diagnóstico de TDAH, números dos Estados Unidos, que certamente reverberam o que acontece no Brasil, dão conta de um aumento excessivo e injustificado do diagnóstico na infância e na adolescência na última década. Estima-se que cerca de 6 milhões de crianças e 10% dos adolescentes tomem algum derivado das anfetaminas, grupo a que a ritalina e o concerta pertencem.

    Embora sem nenhuma evidência etiológica comprovada nos manuais de psiquiatria, o TDAH é tido como um distúrbio de natureza bioquímica, sem levar em conta as relações familiares, o ambiente escolar ou a subjetividade da criança.

    Como aponta o novo protocolo e diretriz terapêutica, "sob o aspecto clínico, torna-se complexa a distinção de casos de TDAH de parte dos problemas de escolaridade decorrentes de modelos pedagógicos inadequados ao contexto social das crianças, de questões familiares cada vez mais complexas e do contexto sociocultural em que há competição, produção de estigmas e exclusão".

    O protocolo constitui um avanço significativo no Brasil, não somente pelas medidas que restringem a prescrição medicamentosa –transferida unicamente, no município de São Paulo, para os Centros de Atenção Psicossocial Infantil (CAPSi). Além disso, caminha no sentido de situar o TDAH não mais como uma categoria diagnóstica, mas como um sintoma, presente em diferentes situações clínicas, não generalizável, em que
    a bioquímica pode sofrer os efeitos da história de cada um.

    Aos que acusavam a falta de políticas públicas na atenção ao TDAH, a medida é uma ação responsável articulada à proposta de uma abordagem integrada no âmbito da saúde e da educação.

    PAULO SCHILLER é psicanalista e tradutor
    ILANA KATZ, doutora em psicologia e educação pela USP, é psicanalista

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