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    André Augusto Salvador Bezerra: Democratizar a nomeação para o STF em tempos de mobilização

    11/07/2014 02h00

    O anúncio realizado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa, no final de maio passado, no sentido de que iria antecipar sua aposentadoria foi, prontamente, seguido por reportagens acerca dos supostos candidatos à sucessão da vaga na corte. Trata-se de candidaturas direcionadas à presidenta da República, Dilma Rousseff, a quem, segundo o parágrafo 1º do artigo 101 da Constituição Federal, cabe nomear os(as) ministros(as) do STF, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal.

    O problema é que, mais uma vez, ao longo do processo democrático do Brasil, as candidaturas à corte suprema não são públicas. Há apenas boatos relativos a alguns nomes, noticiados pela imprensa e discutidos somente nos interiores dos gabinetes de ministérios e da própria Presidência da República.

    É de se notar, porém, que sob a vigência de uma Constituição como a promulgada em 1988, cujo artigo 3º estipula ambiciosos objetivos emancipatórios ao Estado brasileiro e cujo artigo 37 caput impõe a publicidade como princípio norteador da administração pública, não se pode considerar suficiente um processo de seleção como o para ministro(a) do STF.

    Daí que de há muito que a Associação Juízes para a Democracia (AJD) tem criticado tal procedimento. Em agosto de 2011, a entidade dirigiu um ofício à presidenta da República requerendo a edição de decreto que estabelecesse procedimento apto a permitir e a estimular a participação popular no processo de escolha dos integrantes do STF. Explicou-se, na ocasião, que o modelo pretendido seria aquele adotado pelo decreto nº 222, expedido pela Presidência da República Argentina no ano de 2003.

    Em tais termos, o ato normativo disporia que a nomeação de ministro para o STF se daria mediante procedimento que: a) permitisse a máxima divulgação do histórico dos(as) juristas a serem considerados(as) para integrar a mais alta corte do país; b) estipulasse prazo razoável para o debate e a manifestação formal dos cidadãos, associações e entidades de classe acerca dos(as) candidatos(as) indicados(as); c) encerradas tais fases, a Presidência da República indicaria o nome do(a) candidato(a), que, por sua vez, seria submetido à sabatina e à eventual aprovação pelo Senado. Deixou-se claro que o decreto proposto não eliminaria a prerrogativa constitucional da chefia do Poder Executivo e do Senado na indicação e aprovação do(a) ministro(a) do STF; a novidade consistia no estímulo ao amplo debate público, com a devida participação da sociedade civil. O requerimento em questão não foi acolhido.

    Transcorridos cerca de três anos da formulação da proposta pela AJD, o cenário político e social brasileiro fortalece a necessidade de estimular o debate da nomeação para o STF.

    De fato, a intensa mobilização popular que tem sucedido no Brasil desde junho de 2013 revela que a sociedade demanda maior influência nos rumos a serem tomados pelo Estado brasileiro.

    Certamente influenciada por esse clamor, a presidenta da República recentemente expediu o decreto presidencial nº 8.243, criando a Política Nacional de Participação Social. Sem qualquer pretensão de fazer juízo de valor de cada um dos dispositivos do ato, é possível perceber que, de modo geral, o decreto pode estimular a participação de conselhos, de movimentos sociais e da população nas ações governamentais, ampliando, ao menos em tese, a influência popular nas decisões que envolvem a coisa pública.

    Diante de tal quadro, a AJD reiterou, em junho passado, a proposta de ampliação democrática no processo de nomeação dos ministros do STF. Mais uma vez, a entidade propôs a prévia divulgação do histórico dos candidatos, o debate público e a manifestação de cidadãos e movimentos populares –para entrar em vigor, inclusive na sucessão de Joaquim Barbosa.

    A expedição do ato normativo pretendido pela AJD revela-se uma ferramenta simples e célere, que não requer alteração constitucional, mas apenas a vontade política para estimular a participação da sociedade civil na indicação de uma pessoa para ocupar relevante função na cúpula do Poder Judiciário.

    ANDRÉ AUGUSTO SALVADOR BEZERRA, 42, é presidente do Conselho Executivo da Associação Juízes para a Democracia (AJD)

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