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    São Paulo deve adotar o rodízio ampliado? Não

    26/07/2014 02h00

    LUIZ CÉLIO BOTTURA: RESTRIÇÃO SEM ALTERNATIVAS É INEFICAZ

    A falta de alternativas de transporte coletivo que atendam os deslocamentos pela cidade impõe o uso do transporte individual a todas as classes sociais. Hoje, com um índice de motorização de 66,2 veículos por 100 habitantes, a ampliação do rodízio atingirá a pobres e ricos. A diferença é que os ricos contornarão a restrição usando outro carro.

    O vetor primordial da aglomeração urbana é a economia, sendo o trabalho o mais significativo fator de exigência de grande volume de locomoção. O trânsito, entretanto, não é o maior problema da área metropolitana de São Paulo e de outras cidades brasileiras; os mais graves são o desenho urbano e o saneamento.

    A circulação urbana no Brasil é insegura e morosa demais, consequência de quase um século de altos recursos mal investidos. Medidas restritivas na circulação dos veículos nunca faltaram, em contradição com outras políticas públicas equivocadas, que estimularam o aumento da frota para poder salvar o setor automotivo.

    Em 1997, quando da efetivação do rodízio no horário de pico no centro expandido de São Paulo, o índice de motorização era de 46,2 veículos por 100 habitantes. Desesperada, por não ter investido corretamente nas necessárias intervenções de trânsito e de transporte no passado, a prefeitura apelou para um rodízio diário para 20% da frota.

    Houve alívio transitório, mas, como os equívocos continuaram, chegamos ao ponto em que neste ano, durante a Copa, para não passarmos vergonha perante o mundo, implantou-se de improviso o rodízio ampliado para o dia todo.

    A Prefeitura de São Paulo agora propaga que pode instituir o rodízio estendido. Ou seja, quer tomar mais uma atitude na base do "acho que vai dar certo".

    O Executivo municipal sempre quer controlar com restrições os problemas que não é competente para resolver. Até hoje, não foi apresentado qualquer estudo sério sobre o desempenho do tráfego nessas condições. Mesmo que algum efeito óbvio possa ser constatado, pois a redução do número de veículos em circulação traz um alívio imediato, a medida tem prazo limitado e poderá piorar a situação da cidade.

    Melhorias a médio ou longo prazo somente serão atingidas com mudanças estruturais sobre o transportes público –coisa que esse paliativo operacional e provisório não traz. A aplicação da extensão do rodízio para o dia todo, isolada de uma eficaz alternativa para os usuários dos transportes individuais, vai resultar no incremento da aquisição de segundo carro e, consequentemente, no aumento da frota de automóveis com reflexos negativos nos congestionamentos.

    A única alternativa oferecida pela prefeitura para quem se desloca foi a implantação de 300 km de faixas de ônibus exclusivas à direita, medida que teve resultados pífios. O número de passageiros na rede de ônibus beneficiada por essas faixas resultou em um aumento de apenas 2%, aproximadamente, comparando-se o primeiro trimestre deste ano com o mesmo período do ano passado. A melhoria da velocidade dos ônibus não foi acompanhada pela melhoria da rede de serviço e não trouxe novas opções de viagem aos usuários.

    Uma medida que pode ajudar a resolver o problema do trânsito em São Paulo é a implementação de rodízios nos postos de trabalho. Nesse caso, se trabalha menos dias por semana, mas por um número maior de horas, usando melhor a infraestrutura e os postos de trabalho.

    Serão menos horas perdidas por ano e mais horas trabalhadas por dia. Para efetivar esse rodízio, no entanto, é necessário mudar a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) e flexibilizar as legislações ultrapassadas que vão contra os interesses da população.

    LUIZ CÉLIO BOTTURA, 74, consultor em engenharia urbana, foi presidente do Dersa –Desenvolvimento Rodoviário S/A– (governo Montoro)

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