• Opinião

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    Editorial: Interferência exagerada

    05/08/2014 02h00

    Pouco depois de assumir a presidência do Tribunal Superior Eleitoral, em maio deste ano, o ministro José Antonio Dias Toffoli manifestou seu incômodo com a ideia de um Judiciário interferindo de forma exagerada no processo político.

    Em sua vertente eleitoral, sustentou o ministro, a Justiça deveria agir apenas quando houvesse um "gol de mão", uma jogada "absolutamente ilegal", segundo a feliz comparação utilizada durante entrevista ao site Consultor Jurídico.

    Tais parâmetros são pertinentes porque asseguram a liberdade de expressão e de informação, essenciais para o cidadão votar da maneira mais esclarecida possível.

    É por isso mesmo preocupante o precedente aberto pela Justiça Eleitoral ao conceder direito de resposta ao candidato do PSB ao governo de Pernambuco, Paulo Câmara. Não pelo instituto em si, que deve existir e precisa ser respeitado, mas pelo conteúdo da reportagem questionada judicialmente.

    Publicado por esta Folha no dia 23/7, o texto "Deputado relata propina por apoio a candidato de [Eduardo] Campos" registrava um relato do congressista pernambucano José Augusto Maia. Ele dizia ter recebido –e recusado– oferta de propina para que seu partido, o Pros, apoiasse a coligação liderada pelo PSB no Estado.

    As pessoas citadas foram ouvidas pelo jornal, e suas negativas tiveram o devido espaço ao longo dos dias. Diante da notícia, o Ministério Público Eleitoral resolveu apurar os fatos, e Marina Silva, candidata a vice-presidente de Campos, defendeu a investigação.

    Para além da observância de princípios do bom jornalismo, chama a atenção que a Paulo Câmara nem era atribuída responsabilidade pela suposta tentativa de suborno. Como não poderia deixar de ser, a reação indignada do candidato ainda assim foi contemplada.

    Nada, nesse roteiro, sugere a necessidade de haver interferência da Justiça. Eventuais dúvidas quanto a isso terminaram dirimidas pelo próprio direito de resposta publicado no sábado, dia 2. Os principais argumentos ali utilizados por Câmara já haviam aparecido nas páginas desta Folha –em alguns trechos, com as mesmas palavras.

    Para que, então, a ingerência judicial? Para que a intervenção em favor de um candidato que não era acusado de nada e que jamais teve cerceadas suas manifestações?

    Tudo o que a metáfora de Dias Toffoli tinha de feliz essa decisão tem de triste. A mesma Justiça que deve proteger os cidadãos de eventuais danos provocados por meios jornalísticos precisa assegurar que no país viceje o pleno acesso à informação. Esse equilíbrio, infelizmente, não foi observado.

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