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    Sylvia Lorena: Terceirização e o fim da insegurança jurídica

    01/09/2014 02h00

    A terceirização é uma realidade mundial. Está presente nas cadeias produtivas globalizadas, dentre as quais está inserido o parque industrial brasileiro, em maior ou menor medida. Essa forma de organização produtiva, caracterizada pela distribuição de etapas da produção numa rede de empresas especializadas, se tornou elo estratégico para a sua competitividade.

    Com a terceirização, unem-se os esforços de várias empresas para produzir, com sensíveis ganhos de eficiência e tecnologia, um bem a preço que o permita concorrer, nas prateleiras do Brasil ou do exterior.

    No Brasil, entretanto, a terceirização se tornou assunto recorrente nos tribunais da Justiça do Trabalho. A ausência de um marco legal que regulamente o tema, em sintonia com a evolução da organização produtiva moderna, está no cerne da litigiosidade trabalhista endêmica existente no país.

    Uma pesquisa recente da indústria dá a dimensão do grau de insegurança jurídica que permeia as relações de trabalho no setor. De acordo com o relatório "Sondagem Especial: Terceirização 2014", sete em cada dez empresas industriais utilizam serviços terceirizados e seis em cada dez apontam o risco jurídico e possíveis passíveis trabalhistas como principal problema relacionado à terceirização.

    Pode-se concluir, sem riscos de exagero, que o atual marco legal que rege a terceirização não traz a desejada segurança na relação entre empregador e empregado. Pelo contrário, a judicializa.

    Parte da explicação está na legislação trabalhista, datada de 1943, ano da criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), feita à luz de uma realidade produtiva e de um ambiente fabril que não mais existe. Parte está na Súmula 331 de 1993, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que autorizou a terceirização apenas nas "atividades meio" das empresas, conceito propício a múltiplas interpretações.

    Na prática, essa regra limita a terceirização às atividades de segurança, limpeza e conservação e serviços auxiliares, quando se faz necessário criar um regulamento que abrange o amplo espectro de atividades empregados no processo produtivo moderno. Fato é que a indústria usufrui hoje de serviços altamente especializados, contratados de empresas para cumprir funções específicas no processo de desenvolvimento, montagem e distribuição de bens manufaturados.

    O relatório constata a impossível dissociação da indústria do século 21 da terceirização. Na indústria, 70% das empresas contratam serviços terceirizados. A pesquisa mostra ainda que o leque de atividades exercidas por prestadores de serviço e fornecedores são bem mais amplo do que o escopo previsto na Súmula 331.

    A terceirização se dá em atividades que integram ativamente a cadeia produtiva, como logística, montagem e manutenção de equipamentos, além de pesquisa e desenvolvimento. Caso fossem sejam impedidas de contratar esses serviços, 57% da indústria brasileira sofreriam perda de competitividade ou teriam de encerrar uma ou mais linhas de produção.

    Apenas com uma regulamentação pautada pelo equilíbrio entre o papel econômico e social da terceirização pode-se pacificar o conflito jurídico existente e que levou mais de 45 mil processos à Justiça do Trabalho (15% do total de casos no Tribunal).

    Espera-se, portanto, que a importância da terceirização em atividades estratégicas para a competitividade seja reconhecida pelo STF. Do contrário, um cenário preocupante se vislumbra, com a manutenção da rota de perda de competitividade da indústria brasileira perante as potências econômicos, com todos os efeitos negativos para a renda e emprego dela decorrentes.

    SYLVIA LORENA, 43, é gerente-executiva de Relações do Trabalho da CNI (Confederação Nacional da Indústria)

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