• Opinião

    Saturday, 18-May-2024 22:48:59 -03

    Editorial: Cinzas do planejamento

    02/09/2014 01h30

    No final dos anos 1990, quando o governo apresentou o plano Avança Brasil, ambientalistas ficaram alarmados com seu potencial para induzir desmatamento na Amazônia. Milhares de quilômetros quadrados de floresta pereceriam com a pavimentação de corredores de exportação, como a BR-163 (Cuiabá-Santarém).

    No início do século 21, as taxas de desmatamento de fato subiram depressa, mas em 2003 o movimento socioambiental viu uma representante, Marina Silva, assumir o Ministério do Meio Ambiente (MMA). A questão da sustentabilidade chegava ao coração do governo federal, acreditou-se então.

    Tendo saltado de 18 mil km2 em 2001 para 27 mil km2 em 2004, a cifra da devastação passou a encolher nos anos seguintes até pouco abaixo de 5.000 km2 em 2012, o menor patamar registrado desde 1988 –ainda assim, o equivalente a três municípios de São Paulo.

    A rodovia Cuiabá-Santarém se tornou um exemplo tanto de ocupação predatória como da tentativa de discipliná-la. Várias organizações governamentais e não governamentais se engajaram na elaboração do "BR-163 Sustentável", plano lançado em 2006.

    Criaram-se unidades de conservação; dificultou-se o crédito a produtores rurais de municípios campeões em desmatamento; anunciaram-se ordenamento territorial e regularização fundiária. O asfaltamento do trecho paraense da estrada se tornaria realidade em breve, como todos queriam, sem incentivar mais destruição.

    Menos de uma década depois, as promessas ficaram pelo caminho. A parte mais importante delas –legalização das propriedades na região, das pequenas às grandes– virou fumaça. Novo Progresso (PA), município de madeireiros e pecuaristas visitado pela Folha no final de agosto, teve só 400 de 3.000 terras de produtores agrícolas regularizadas.

    É grande a insatisfação com o governo federal. Os conflitos entre posseiros e assentados, de um lado, e fazendeiros e garimpeiros de madeira, de outro, estão de volta, mas todos concordam que somente a solução da questão fundiária pelo Incra poderá desentravar o desenvolvimento da região de maneira legal e sustentável.

    Faltou planejamento, sobretudo quanto às temáticas ambientais –uma agenda que agora pode ganhar espaço na pauta eleitoral como consequência da ascensão de Marina Silva (PSB) nas pesquisas de intenção de voto.

    Não seria ruim. A BR-163, por exemplo, encurta em 1.000 km o caminho da soja e do milho para o exterior. Se o país não pode abrir mão desse tipo de estrutura, tampouco deveria abandonar preocupações com a sustentabilidade.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024