• Opinião

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    Editorial: Jogo indefinido

    20/09/2014 02h00

    Os números da última pesquisa do Datafolha parecem dar consistência à tese de que haveria um componente emocional na súbita ascensão das preferências por Marina Silva (PSB) após o acidente que vitimou seu companheiro de chapa, Eduardo Campos.

    A solidariedade diante da tragédia ou a repentina descoberta, por parte do eleitorado, de que a disputa presidencial não se resumia à alternativa entre PT e PSDB estariam, assim, por trás dos altos índices atingidos pela candidata.

    Dos 21% que obtinha no levantamento realizado em 14 e 15 de agosto, imediatamente após a morte de Campos, Marina Silva passaria a 34% duas semanas depois, empatando com a primeira colocada, a presidente Dilma Rousseff (PT).

    Se o fator emocional fosse o mais determinante, contudo, o declínio da ex-ministra do Meio Ambiente seria mais acentuado. Mas sua trajetória cadente nas últimas semanas se mostra bastante gradual –e acompanhada de discreta recuperação nos índices tanto de Dilma como de Aécio Neves (PSDB).

    Ainda que muitas causas possam ser atribuídas a essa oscilação sutil, é plausível que, antes de um fenômeno puramente emocional, esteja em curso uma corrosão política da postulação marinista.

    Não foram poucos os ataques que recebeu. Houve a tentativa de lhe atribuir uma imagem de subserviência ao mercado financeiro –como se o PT, em desespero de causa, estivesse de volta aos tempos estreitos de 1989–, assim como uma incipiente campanha do medo em torno da inconvincente ideia de que sua vitória poderia acarretar o fim do Bolsa Família.

    A tática poderá ter surtido efeito nos setores de menor renda do eleitorado; nos municípios com menos de 200 mil habitantes, foi especialmente intenso o crescimento dos índices de rejeição à pessebista.

    Também se vê a queda, porém, em outras parcelas da sociedade. Desse ponto de vista, a ofensiva dos adversários de Marina pode ser entendida como a tradução publicitária das fragilidades e inconsistências de sua própria candidatura.

    Desmentidos sucessivos e ajustes emergenciais de discurso –na questão do casamento homoafetivo, na política energética, nas relações com o agronegócio, nas diferenças de imagem entre ela e seu vice– talvez sejam sinal do quanto uma postulação de "terceira via" ainda carece de maturação ideológica para blindar-se contra as investidas dos oponentes.

    Quanto a estes, beneficiam-se de uma divisão ideológica real, a que entretanto se esquivam numa mesma inexplicitude programática. A velha política –da qual Marina Silva, aliás, não se afasta tanto quanto quer aparentar– continua, silenciosamente, a dar suas cartas num jogo ainda indefinido.

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