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    É correta a maneira como são feitas as pesquisas eleitorais no Brasil? Não

    18/10/2014 02h00 Erramos: o texto foi alterado

    JOSÉ FERREIRA DE CARVALHO: O ERRO DA MARGEM DE ERRO

    As margens de erro declaradas na pesquisas eleitorais feitas por amostragem por cotas estão erradas. As margens não podem ser matematicamente calculadas e há evidência empírica de que excedem os valores declarados.

    As estimativas das proporções das intenções de votos –o resultado de uma eleição– são feitas por levantamentos por amostragem. Uma amostragem quase sempre é baseada em técnicas estatísticas, que permitem o cálculo dos resultados das eleições, juntamente de uma "margem de erro".

    O método estatístico, por sua vez, é baseado na seleção aleatória dos eleitores. Trata-se de probabilidades conhecidas de seleção para cada um e todos do universo de eleitores.

    A crítica aos levantamentos feitos pelos maiores institutos do país baseia-se no uso de um esquema de amostragem por cotas, que não é aleatório. Esse esquema é muito mais barato e rápido do que seria uma correspondente amostragem estatística, baseada na seleção aleatória dos eleitores.

    Por que uma amostragem aleatória resulta relativamente cara? O pesquisador, por meio de processos engenhosos, seleciona eleitores. O eleitor selecionado, e exatamente os selecionados, tem de ser encontrado. Em geral, isso exige mais deslocamento do entrevistador.

    Um esquema probabilístico de seleção é dado como simples exemplo. Selecionam-se municípios, por sorteio; a seguir, com um mapa de ruas, selecionam-se ruas; nas ruas, mapeiam-se e selecionam-se domicílios. Os domicílios selecionados têm de ser visitados e escolhe-se um eleitor dentre os moradores. Usando-se dados do Censo e da PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) é possível fazer tal amostragem.

    Já uma amostragem por cotas pode proceder, nos primeiros estágios de seleção, do mesmo modo. Segue um exemplo simplificadíssimo. Sorteiam-se municípios. Nos municípios selecionados, sabe-se a distribuição das pessoas por fatores ditos como importantes quanto ao voto, que são: sexo, idade, escolaridade, "classe social" (na verdade, uma classe de renda) e região.

    Os entrevistadores podem ir a locais de concentração e entrevistar eleitores nas exatas proporções dessa classificação. Os pontos de concentração podem ser shoppings, esquinas de ruas movimentadas, ou seja, lugares onde é fácil preencher as cotas. Esse esquema não permite atribuir probabilidades de seleção aos eleitores, os membros do universo de eleitores do município.

    E qual a consequência? Na amostragem por cotas não há como calcular a margem de erro. As margens de erro declaradas para amostragem por cotas não têm fundamento. As margens declaradas usam fórmulas para a margem de erro, tiradas dos livros de amostragem, como se a amostra fosse aleatória.

    Na década de 1950, na Inglaterra, ante problemas causados por levantamentos por cotas, realizou-se um teste, em que o mesmo levantamento foi realizado simultaneamente várias vezes, por cotas e por amostragem aleatória. Resultou que os desvios da amostragem por cota excediam em muito os desvios da amostragem aleatória.

    Pode-se buscar esse experimento no artigo "An Experimental Study of Quota Sampling" (um estudo experimental da amostragem por cota, em tradução livre do inglês), de C. A. Moser e A. Stuart, publicado em 1953. Segue mais uma conclusão. Institutos alegam que há evidência empírica de que o método "funciona". Está provado experimentalmente que não funciona.

    Não causa espanto que os desvios dos resultados de pesquisas e os de eleições, realizados em um curto intervalo de tempo, sejam tão discrepantes. É que as margens de erro não são aquelas declaradas. Em tese apresentada na Unicamp, levantaram-se os resultados de muitas pesquisas. Os desvios estão fora da margem de erro em grande número de casos, número bem maior do que os "esperados" 5%.

    JOSÉ FERREIRA DE CARVALHO, 69, estatístico da Statistika Consultoria, é doutor pela Universidade do Estado de Iowa (EUA) e professor aposentado da Unicamp

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