• Opinião

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    Editorial: Tentações judiciais

    22/10/2014 02h00

    "Os debates são próprios de uma nação democrática. Não se pode pôr um torniquete no debate político", afirmou José Antonio Dias Toffoli ao assumir o cargo de presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ainda em maio deste ano.

    O ministro tratava então da campanha antecipada, que, na sua opinião, só deveria ser punida se houvesse pedido explícito de voto.

    Essa saudável concepção minimalista Toffoli reiterou em junho, quando, em entrevista ao site Consultor Jurídico, sustentou que a Justiça não poderia "cair na tentação de se assumir como tutora de todo e qualquer processo eleitoral".

    Nessa tentação, no entanto, o TSE caiu. Na quinta-feira passada (16), o tribunal modificou seu entendimento a respeito da propaganda obrigatória no rádio e na televisão. Deixou de lado uma tradição "permissiva", segundo o presidente da corte, para decretar que as peças eleitorais têm de "ser programáticas, propositivas".

    A maioria dos ministros, liderada pelo próprio Toffoli, considerou que a propaganda política vinha sendo desvirtuada pela preponderância de ofensas pessoais entre a presidente Dilma Rousseff (PT) e o senador Aécio Neves (PSDB).

    Houve, de fato, ataques acerbos de parte a parte. Pressionados pelo equilíbrio da disputa, os candidatos abandonaram o mínimo de decoro e civilidade que se espera de quem está, ou pretende estar, no posto mais alto da República.

    Tal comportamento, contudo, deve ser julgado pela sociedade, e não tutelado pelo TSE, como se postulantes e eleitores fossem hipossuficientes. Não há, além disso, como aumentar o controle sobre o conteúdo das inserções e propagandas sem sacrificar uma grande parcela da liberdade de expressão.

    Se o tribunal pretende ser pedagógico em suas decisões, como agirá quando precisar julgar promessas evidentemente absurdas? Elas também serão proibidas pelo órgão? Ou, nesse caso, a corte autorizará a promessa, ainda que absurda, mas vetará o ataque, ainda que legítimo e verdadeiro?

    Por efeito da nova compreensão, o TSE, a contar do dia 16, já chegava ontem (21) a duas dezenas de decisões com as quais de alguma forma impedia a veiculação de peças produzidas pelas campanhas de Dilma Rousseff e Aécio Neves no segundo turno.

    Mudar as regras do jogo no decorrer da partida tem esta outra consequência lamentável: petistas e tucanos entraram na última semana da disputa mais apertada desde 1989 sem conhecer os parâmetros aceitos pela Justiça.

    O próprio equilíbrio desta eleição atesta o quanto a democracia brasileira vem amadurecendo. Existem abusos por parte dos candidatos ou de alguns militantes, sem dúvida, mas nenhum deles é mais grave do que a interferência excessiva dos Poderes de Estado.

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