• Opinião

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    Editorial: Criatividade ao extremo

    24/11/2014 02h00

    É comum que democracias se vejam em dificuldades para enfrentar um clássico paradoxo: como ser tolerante diante das forças políticas que visam a destruir o sistema democrático e não admitem o pensamento divergente?

    Em casos extremos, o problema se resolve sem maiores hesitações. Todo regime constitucional legítimo dispõe, em tese, de meios para punir atos de violência concreta, como tentativas de golpe ou atentados contra minorias.

    A questão se torna mais delicada quando estão em jogo manifestações, conclamações ou atos de propaganda. O direito à livre expressão não pode ser questionado, mas é importante reagir quando um mínimo consenso democrático se vê sob ameaça.

    Em nenhum país ocidental casos desse tipo aparecem com maior nitidez do que na Alemanha, às voltas com movimentos –isolados, mas ainda assim inquietantes– de nostalgia pelo passado nazista.

    Foi assim que, em 2011, autoridades alemãs procederam à exumação dos restos mortais do nazista Rudolf Hess, destruindo seu túmulo; pretendia-se inibir as peregrinações anuais ao local.

    A iniciativa, contudo, não coibiu as homenagens ao ícone hitlerista. No último dia 15, um pequeno grupo de fanáticos realizou, como sempre, sua marcha na cidade de Wunsiedel, a despeito de protestos de moradores da pequena cidade.

    Imaginaram-se, porém, formas criativas de desarmar o que houvesse de mais odioso no espetáculo. A campanha consistiu em recolher fundos da população e destinar, a cada metro percorrido pelos neonazistas, € 10 (R$ 32) a uma entidade de combate ao extremismo.

    Assim, quanto mais extensa e tenaz a marcha laudatória do líder hitlerista, mais recursos reverteria aos interessados em contrapor-se a seus princípios. A alternativa usual –empreender uma "contrapasseata", bloqueando a movimentação dos fanáticos– teria certamente aspectos mais conflituosos, repressivos e talvez violentos.

    Acrescida de algumas tiradas de humor, a campanha dos antinazistas teve o poder de diminuir o que a reunião de extremistas traz de ameaçador e até de infamante.

    Naturalmente, só pacientes ações de educação, imbuídas de alto grau de acuidade psicológica, poderão dissipar os renitentes fantasmas do hitlerista. É de todo modo boa notícia que se tenha podido introduzir novas formas de combate político num cenário em geral marcado pela crispação e pela animosidade.

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