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    Michael Barone: Ferguson e o racismo histórico

    30/11/2014 02h00

    Nesta semana, a mídia tem transmitido imagens de Ferguson, no Missouri (EUA), onde manifestantes negros incendiaram uma loja de conveniência, um salão de beleza, uma lavanderia, uma barbearia, uma padaria e uma loja de autopeças.

    Isso teria sido feito em protesto contra a decisão de um júri do condado de St. Louis de não indiciar o policial branco Darren Wilson, que matou a tiros o jovem negro Michael Brown em 9 de agosto.

    A mídia apresenta a morte de Brown e os distúrbios violentos que a seguiram como evidências do ódio racial que fervilha nos EUA. Mas essas revoltas revelam mais sobre a história das relações raciais no país do que sobre a vida americana atual.

    Brown foi descrito a princípio como um adolescente desarmado baleado pelas costas enquanto tinha as mãos para o alto. Provas da perícia e testemunhas oculares, muitas delas negras, deram outra versão.

    Vídeos mostram Brown roubando uma loja de conveniência e agredindo um balconista muito menor que ele logo antes do confronto com a polícia. Testemunhas disseram que ele se aproximou da viatura. A perícia substanciou o relato do policial, de que Brown o teria atacado dentro da viatura, e mostram que o jovem não foi baleado pelas costas.

    A versão inicial se enquadrava na teoria de que brancos, especialmente policiais, frequentemente assassinaram negros inocentes nos EUA.

    Essa teoria tem muito fundamento na história da escravidão no país, da segregação racial e das relações raciais depois da grande migração de um terço dos negros americanos do Sul rural e agrícola para o Norte urbano e industrial entre 1940 e 1965.

    No Sul, em 1955, brancos assassinaram Emmett Till, de 14 anos, depois de ele ter lançado olhares de admiração a uma mulher branca. Seus assassinos foram levados a julgamento e rapidamente absolvidos por um júri exclusivamente branco.

    No Norte, nesses anos, os choques entre policiais, em sua maioria brancos, e jovens negros tornaram-se mais comuns. Houve revoltas negras em Los Angeles, em 1965, Newark e Detroit, em 1967, e Washington e outras cidades em 1968.

    Lamentavelmente, os índices de criminalidade foram muito altos nos anos 70 e 80 e início da década de 90, e metade de todos os crimes violentos foram cometidos por negros.

    Desde meados dos anos 90, felizmente, esses índices, tanto de negros como de brancos, caíram. Durante esses anos, as forças policiais se diversificaram racialmente e negros começaram a mudar-se para cidades antes habitadas inteiramente por brancos, como Ferguson.

    Mas há poucas evidências de grande tensão entre os novos moradores negros e policiais brancos. Mais de 90% das vítimas negras de homicídios são mortas por outros negros. A morte de Michael Brown parece ter sido exceção, não a regra.

    "Michael Brown, Emmett Till, quantos negros vocês vão matar?", gritavam manifestantes em Washington. Mas há 59 anos de distância entre as duas mortes. O assassinato de Till se enquadrou num sistema de opressão racial. A morte de Brown, como decidiu o grande júri, parece ter sido um resultado infeliz da resposta a um delito leve.

    Os manifestantes estão protestando contra um racismo que, felizmente, quase não existe mais –e, no processo, estão prejudicando comerciantes e vizinhos negros.

    MICHAEL BARONE é analista político sênior da revista "Washington Examiner" e coautor de "The Almanac of American Politics"

    Tradução de CLARA ALLAIN

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