• Opinião

    Friday, 17-May-2024 06:23:17 -03

    Juana Kweitel e Caio Borges: Um BNDES mais transparente

    18/12/2014 02h00

    A reeleição da presidenta Dilma tem gerado expectativas sobre mudanças nas principais instituições que definem e executam a política econômica do país. Uma delas é o BNDES.

    Há um sentimento generalizado de que o BNDES é pouco transparente quanto aos critérios que norteiam a escolha das empresas beneficiadas pelos seus empréstimos, cujas taxas são no geral mais favoráveis que as do mercado.

    Mas há muitos outros tipos de informação que o BNDES ainda se recusa a divulgar e que são essenciais para que a sociedade avalie se o banco está cumprindo com sua missão de desenvolver o país nas dimensões econômica, social e humana.

    Apesar de recentes avanços, como a disponibilização de dados sobre operações de pré-embarque e operações indiretas não-automáticas, ainda há uma opacidade principalmente sobre os aspectos socioambientais dos projetos financiados. O BNDES não torna públicos os relatórios de avaliação prévia e de monitoramento da observância, pelos tomadores de empréstimos, das condicionantes sociais e ambientais estabelecidas pelos órgãos ambientais e pelo próprio banco, por meio de cláusulas contratuais. A maneira pela qual o BNDES assegura que os projetos no exterior respeitam os direitos humanos também é uma incógnita.

    Quando questionado sobre as medidas para evitar que empresas causem ou contribuam para a ocorrência de danos ao meio ambiente e violações de direitos humanos, o Banco nega sistematicamente o fornecimento da informação, alegando usualmente sigilo bancário. Quando não é assim, apresenta explicações genéricas.

    O BNDES possui ferramentas de gestão de riscos ambientais e de direitos humanos. Há uma Política de Responsabilidade Socioambiental, metodologias para a avaliação das empresas e dos empreendimentos sob o aspecto socioambiental e um corpo técnico com expertise para realizar esse tipo de tarefa.

    No entanto, segundo os padrões mais altos de proteção de direitos humanos por empresas (inclusive estatais, como é o BNDES), não basta dizer que tem, é preciso provar que, na prática, os mecanismos de gestão de impactos funcionam. É aqui onde reside o conflito.

    Na ausência de maiores esforços do BNDES para aprimorar sua transparência ativa, as diferentes visões cada vez mais têm sido debatidas no âmbito de litígios administrativos e judiciais.

    Recentemente a sociedade soube da determinação da Controladoria-Geral da União (CGU) de que o BNDES tornasse públicos os relatórios de auditoria independente sobre o cumprimento das condicionantes socioambientais na hidrelétrica de Belo Monte. O jornal Folha de São Paulo é parte em uma ação judicial que pede a divulgação dos relatórios de análise elaborados pelo corpo técnico do banco para apoiar a decisão de investimento. Segundo decisão do Ministro Ricardo Lewandowski, o BNDES deve divulgar tais relatórios, tarjando as informações sob sigilo bancário. A Justiça Federal também decidiu que o BNDES deve divulgar informações sobre suas atividades e programas, em ação proposta pelo Ministério Público do Distrito Federal.

    Até mesmo o TCU e a CGU têm denunciado publicamente as barreiras que o BNDES põe à obtenção de informações cruciais para a realização de auditorias sobre o uso dos recursos públicos em obras como Belo Monte e na construção dos estádios da Copa.

    O sigilo em torno dos financiamentos do BNDES é uma querela que pode ser resolvida de uma maneira positiva à sociedade se as instituições políticas operarem apropriadamente. Esperamos que a presidenta reeleita trate o tema com a relevância que ele merece.

    JUANA KWEITEL, 42, diretora da Conectas Direitos Humanos, é mestre em Direito Internacional dos Direitos Humanos pela Essex (Reino Unido) e em Ciência Política na Universidade de São Paulo
    CAIO BORGES, 28, advogado do projeto Empresas e Direitos Humanos da Conectas, é Mestre em Direito e Desenvolvimento pela Fundação Getúlio Vargas - SP

    *

    PARTICIPAÇÃO

    Para colaborar, basta enviar e-mail para debates@uol.com.br.

    Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

    Fale com a Redação - leitor@grupofolha.com.br

    Problemas no aplicativo? - novasplataformas@grupofolha.com.br

    Publicidade

    Folha de S.Paulo 2024