• Opinião

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    Williams Gonçalves: Resposta a Demétrio Magnoli

    17/01/2015 02h00

    Quem se dispõe, como o faço, a analisar política internacional em cadeia nacional de televisão, não pode se perturbar com críticas. Desde o instante em que formulo meus juízos sobre os acontecimentos em tela, fica ao arbítrio do telespectador considerá-los pertinentes ou não.

    Fosse eu me abalar com as reprovações de quem me dá atenção, já há muito teria declinado dos convites de emissoras de rádio e de televisão. Creio igualmente que se essas análises fossem por demais infundadas, também não haveria mais convites a atender.

    Introduzo assim meu artigo, para que fique bem explicado que o senhor Demétrio Magnoli tem pleno direito de discordar de minhas ideias, como o fez na coluna dele publicada no dia 10 de janeiro de 2015. Ideias essas que, diga-se de passagem, ele parece conhecer em profundidade, pois, como afirma em seu artigo intitulado "Raqqa, aqui", as acompanha desde o dia 11 de setembro de 2001.

    Embora considere minhas "sentenças asquerosas", ele confessa que me tem acompanhado todo esse tempo. Aliás, ele revela publicamente uma fidelidade que, francamente, me assusta. Jamais podia imaginar tamanha dedicação.

    Mas vamos ao que interessa. Esse senhor acusa-me de: "celebrar o terror no Brasil", ser "mensageiro da morte", ser "acadêmico consagrado à delinquência intelectual", ser "candidato a porta-voz oficial do Estado Islâmico", e, finalmente, ser um "black bloc iletrado, mas fanaticamente antiamericano e antissemita".

    Para justificar a utilização de sua metralhadora maledicente, o colunista distorce e descontextualiza as ideias que expus em minha participação no noticiário da GloboNews. E que ideias são essas? Simples. Era de se prever que algo parecido a esse atentado do dia 8 de janeiro viesse a ocorrer. Por quê? Pelo fato de existir um ambiente de intensa radicalização política que envolve os Estados Unidos e a Europa de um lado e partes do mundo árabe-muçulmano, de outro.

    Ambiente esse que também toma conta da sociedade francesa, uma vez que há numeroso contingente de árabes-muçulmanos na França. Há alta tensão na França porque o governo socialista de François Hollande apoia integralmente a iniciativa dos Estados Unidos de suprimir o Estado Islâmico, bem como também promoveu intervenções militares no Mali e na República Centro Africana.

    Tal alta tensão é, além disso, causada pela crise econômica que atinge toda a zona do euro, e que, na França, tem maior incidência sobre a parcela da população formada por imigrantes e trabalhadores de baixa qualificação, dentre os quais se destacam grande número de árabes-muçulmanos.

    Ora, em um ambiente desses é que os cartunistas da "Charlie Hebdo" publicavam charges debochando dos muçulmanos e de sua fé em Maomé. Corriam, e eles sabiam muito bem disso, um grande risco. Tanto sabiam que organizavam a publicação da revista em local secreto e eram protegidos por guarda-costas.

    Dizer isso é sair da "toca para apoiar o terror"? Não pode ser. A não ser por malícia, somente muita ingenuidade para afirmar uma coisa dessas. E ingênuo o colunista da Folha de São Paulo não é.

    Como nunca privei de sua intimidade, ignoro a razão de sua extremada violência verbal. Soa, inclusive, muito estranho que alguém que se diz defensor da liberdade de expressão, use essa liberdade para, num órgão de imprensa tão importante e prestigioso, atacar gratuitamente a honra e a dignidade de quem discorda, em vez que usar tão valioso espaço para apresentar ideias.

    WILLIAMS GONÇALVES é doutor em sociologia pela USP e chefe do departamento de relações internacionais da UERJ

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